O mercado de trabalho e o sucesso profissional são um grande desafio, especialmente ao analisar as oportunidades a partir de um recorte racial da sociedade. Considerada um prodígio e referência quando se fala de empreendedorismo, Monique Evelle revelou, em entrevista para o Preta Bahia, do iBahia, como o sentimento de não pertencimento e o racismo a levaram ao limite da saúde mental.
Apostando na comunicação como uma habilidade necessária em todas as áreas da vida, Monique contou que usou essa ferramenta desde cedo para se posicionar em diferentes ambientes. Ela começou a empreender aos 16 anos e por muito tempo se sentiu “fora do lugar” no meio corporativo.
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“Por muito tempo eu fiquei, ainda continuo, em um 'não lugar'. Eu sou de movimentos sociais, das ruas, eu tenho consciência social, não tenho amnésia história, sei que ascensão social não embranquece ninguém, várias coisas. Ao mesmo tempo que também tem o quê, muita gente começou a falar: 'Ah, você não pode falar de dinheiro, você não pode ter empresa, tem que ser ONG'. E do outro teve gente [que disse]: 'não, isso é bom porque você está quebrando isso”, revelou ela, pontuando que, aos 16 anos, esse embate de opiniões a sufocava.
Na busca de encontrar em meio às pressões, Monique destacou a presença de duas figuras soteropolitanas que a ajudaram a escolher um caminho. Ambas eram membros do movimento negro em Salvador, mas ocupavam lugares distintos: uma passava por dificuldades financeiras, apesar da relevância local, e a outra morava em um dos metros quadrados mais caros da capital.
“Eu [me] perguntei: 'como essa pessoa, negra, vinda de movimento social, mora tão bem assim?'. Ele me chamou para conversar e falou: 'olha, você vai tomar decisões difíceis, você vai sofrer, nem todo mundo vai entender, mas você vai tomar decisões. A [escolha] é sua, você vai decidir se vai continuar assim, faça isso, se você achar que não, não faça”, relatou.
A partir desse conselho, Monique conseguiu se colocar para além das expectativas de uma sociedade racista que, por muitas vezes, a fez duvidar do seu lugar enquanto empreendedora. “Eu fui entendendo que está tudo bem ganhar dinheiro, tá tudo bem, mudar o mundo, tudo isso ao mesmo tempo. Mas também já estava sentindo que seria muitas vezes solitário, porque é adoecedor também”, enfatizou ela.
Monique Evelle enfatiza a solidão e o racismo no Shark Tank
Essa solidão acompanha a pessoa negra em ascensão social em muitos momentos. Entre o fato de ser sempre o “primeiro” ou o “único” representante em lugares elitizados, a pressão pela excelência e o distanciamento de seu ambiente familiar, o adoecimento mental de pessoas negras é algo comum.
“É cansativo. É olhar para o lado e não ver ninguém que se parece com você e parece que você está falando outra língua. E, ao mesmo tempo, você fica na indecisão: se eu sair daqui? Será que é o momento de ir embora? Será que aguento mais um pouquinho? Até onde eu aguento? Porque tem muito racismo envolvido, eu faço programa de TV relacionado a investimento e as pessoas perguntam se o dinheiro é meu”, falou Monique sobre a solidão em usa trajetória.
No caso de Monique, um momento de grande fragilidade foi necessário para apender a equilibrar essas pressões. Doente devido ao esgotamento profissional, Monique passou o aniversário de 25 anos no hospital e percebeu que as pessoas só a procuravam para exigências. Diante disso, percebeu que precisava revisar como estava vivendo.
“Eu entendo a minha importância, mas também sei os meus limites. Ou seja, não queri adoecer em nome de uma coletividade que às vezes não aparece quando eu preciso também. Então fiz um acordo comigo mesmo: 'Monique Evelle, sua subjetividade tem que existir para a coletividade existir também'”, pontuou ela.
Monique enfatizou que decidiu equilibrar o que não abriria mão com a realidade de lidar com barreiras como o racismo e a xenofobia. Aos 30 anos, Monique pontua que conseguiu entender que pode ganhar dinheiro e manter uma luta antirracista.
Além da Inventivos, plataforma onde oferece formação e consultoria para empreendedores, Monique segue como uma das investidoras do Shark Tank Brasil.
"É muito racismo mesmo. Não leio os comentários. Mas eu vi a importância de estar ali [no Shark Tank] porque vi nesta segunda temporada muito mais negócios do Brasil inteiro, liderados por pessoas que se parecem comigo e que dá para mudar o mundo e ganhar dinheiro ao mesmo tempo, que é o que eu acredito", pontua Monique sobre a participação no reality.
Monique Evelle elogia letramento racial de Lore Improta
Conhecida por promover debates sobre questões raciais nas redes sociais, Monique Evelle e Lore Improta protagonizaram um momento importante na web ao falar sobre letramento racial. Mãe de Liz, fruto do relacionamento com Leo Santana, Lore Improta destaca que a preocupação com o racismo começou com a maternidade de uma menina preta e Monique discutiu o tema com a dançarina em uma live.
Para a empreendedora, o lugar de escuta de Lore Improta foi essencial e é uma postura rara entre as pessoas brancas. "Lore é uma pessoa, a gente faz coisas juntas hoje independente disso, que tem uma escuta ativa que eu nunca esperei, considerando o estereótipo que as pessoas colocam sobre ela", elogiou Monique.
"De verdade, a gente se tornou próxima, se tornou amiga pela trajetória. Eu queria que todas as pessoas não negras tivessem a escuta que ela tem e a curiosidade, porque não é só ler um livro, é preciso fazer perguntas e as pessoas não sabem fazer", pontua.
Monique afirmou ainda que considera Lore humilde por saber escutar os apontamentos de uma pessoa pretas. "Me senti super confortável porque a gente já trocava antes, para ir para uma live publicamente existe uma jornada. Quando eu entendi que Lore é uma das poucas pessoas que eu conheço da branquitude que tem escuta ativa e, mais do que isso, consegue aplicar no dia seguinte, eu falei: 'por favor, replique para sua galera, porque a gente precisa de pessoas assim'", revelou.
Iamany Santos
Iamany Santos
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