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BaianaSystem defende Carnaval de rua e entidades negras em vídeo

Documentário “Manifestação – Carnaval do Invisível”, produzido pelo grupo, pensa as relações entre história, cidade e negritude que constituem a festa de rua em Salvador

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Redação iBahia

02/03/2022 às 18:00 • Atualizada em 26/08/2022 às 21:14 - há XX semanas
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Leno Sacramento interpreta o personagem “Invisível” no documentário (Foto: Cartaxo / Divulgação)

Em 2017, o BaianaSystem chegou para o Carnaval com a canção “Invisível”. O videoclipe da música trazia a imagem de um homem negro com a cabeça dentro de um emaranhado de cordas, uma referência direta aos cordeiros que trabalham arduamente durante os dias de festa. A letra da canção traduz essa invisibilidade: “você já passou por mim e nem olhou para mim”.

O personagem representa todos os trabalhadores que exercem suas funções em condições insalubres no Carnaval. São vendedores ambulantes, catadores de recicláveis, além dos próprios cordeiros, entre outras funções necessárias para a realização da festa, mas que não têm reconhecimento nem valorização.

Com o segundo ano consecutivo sem ir para as ruas com o trio elétrico Navio Pirata, a banda lançou no último dia 21 o documentário “Manifestação – Carnaval do Invisível”. O curta-metragem aciona vários gatilhos com imagens de Carnavais passados e consegue pinçar pontos chaves para a reflexão sobre a festa em Salvador e a cultura da cidade.

Entre os assuntos que são levantados estão a importância dos ritmos afro-baianos, como o samba-reggae e o ijexá; a invisibilidade e o lugar secundário que as entidades negras têm na festa; e a potência política do Carnaval. Os depoimentos da antropóloga Goli Guerreiro e dos músicos Mestre Jackson e Ubiratan Marques ajudam a apresentar as relações entre história, cidade e negritude que constituem a festa de rua em Salvador.

Mais do que um filme sobre a ausência do Carnaval em 2022, a produção audiovisual do BaianaSystem - em parceria com a Amazon Music e a Janela do Mundo - é um manifesto em defesa da festa de rua e da importância das criações negras para a cultura da cidade. Como Goli Guerreiro afirma logo nos primeiros minutos do filme: Salvador é uma cidade criada por mentalidades negras e o Carnaval é o ponto alto dessa criação.

O documentário não esmiúça as questões que levanta, nem passa a ser uma referência no assunto. Seu objetivo também não parece ser esse. A colaboração que ele traz é contribuir para a desestabilização de um discurso que busca colocar o Carnaval de rua num lugar secundário, atribuindo-lhe adjetivos como inseguro, violento, desorganizado e outras formas de desvalorização.

O filme do BaianaSystem também instiga a curiosidade e dá caminhos para o aprofundamento da questão, que é bastante relevante no contexto em que estamos. À medida em que a iniciativa privada perde espaço nas ruas e busca atacar o Carnaval público para vender suas soluções, precisamos de ações que incentivem mais pessoas a olharem criticamente para o modelo das festas privadas e dos camarotes.

Como falei aqui semana passada, o Carnaval de 2022 representou um retrocesso de séculos e nos remeteu a um modelo do século 19. Sem os trios elétricos ocupando os circuitos, apenas festas privadas aconteceram, assim como eram os clubes fechados quase 150 anos atrás. A rua, por outro lado, mesmo sendo o espaço por excelência do Carnaval, contou com uma presença ostensiva das forças de segurança para coibir as aglomerações.

O prolongamento da pandemia teve sua influência, mas a principal razão para a falta de uma festa mais inclusiva foi a omissão do poder público em liderar a discussão sobre quais eram os formatos possíveis para o Carnaval de 2022. As grandes produtoras de evento sempre vão buscar inovações que a favoreçam, ou seja, novas formas de fechar um espaço e cobrar pela entrada.

Foi esse o processo de busca por inovações para os negócios no Carnaval que nos levou à segregação do espaço público com cordas nos blocos. Ele também nos deu os charmosos e atrativos camarotes all inclusive, que conseguem segregar ainda mais.

Dentro deste contexto é possível ver que é resultado desse processo o Carnaval deste ano, que se reduziu a eventos fechados, seguindo (ao menos na fachada) todos os protocolos estabelecidos pelas autoridades responsáveis.

Todas essas são formas de tornar a festa mais lucrativa e menos igualitária e o fortalecimento desse processo exige uma resposta do poder público, que tem o dever de pensar ações que possibilitem a continuidade do Carnaval de Rua de forma acessível. É para esta posição de equidade na festa que o BaianaSystem se volta quando estimula com seu documentário que foliões frustrados com mais um ano sem o Navio Pirata reflitam sobre que Carnaval e que cidade se quer.

Marcelo Argôlo*
Jornalista e pesquisador musical que acompanha o cenário musical baiano desde 2012. Mestre em Comunicação pela UFRB, ele é autor do livro Pop Negro SSA e mantém ainda o Instagram @popnegroba sobre a música pop negra da Bahia.



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