A supervalorização de artistas brancos e o consequente apagamento de colegas negros é um problema que incomoda Rachel Reis na cena artística baiana. Em entrevista ao Preta Bahia desta semana, a cantora, que tem ganhado local de destaque e é considerada umas das principais referências do novo cenário musical no estado, falou sobre a situação.
"É um processo muito longo até chegar aqui. Eu tenho visto abertura maior de outros artistas da minha geração. É uma abertura que não é só aqui. É para fora também. A gente tem conseguido fazer com que outras pessoas notem a gente".
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Para exemplificar, Rachel citou o passado não tão distante da música na Bahia, quando artistas negros não tinham espaço nacional, principalmente quando o assunto eram os títulos de rei e rainha de algum seguimento. Como contrapartida, a cantora exaltou essa crescente representatividade como mecanismo de combate ao obstáculo.
"Eu acho muito bonito de ser uma referência preta na música baiana. Eu venho de uma mãe que era cantora de seresta nos anos 80 para 90, preta, e a gente sabe que até pouco tempo atrás as pessoas que saíam como referência na música baiana, e chegavam a ter espaço em Salvador e até fora, eram pessoas brancas. Pessoas que se tornavam reis ou rainhas de algo. Então, ver que o cenário tem se aberto mais para outras pessoas, para pessoas pretas principalmente... isso é muito interessante de ver e principalmente estar fazendo parte disso", comemorou.
Por coincidência, na mesma semana em que a artista falou com a editoria, viralizou uma polêmica sobre uma acusação de plágio envolvendo ela e a banda Jammil E Uma Noites, que é comandada por Rafael Barreto, um cantor branco. Nas redes sociais, fãs associaram a música "Coladinho", lançada no final da primeira quinzena de fevereiro pelo grupo, com "Maresia", sucesso de 2022 de Rachel.
No entanto, após a repercussão, tanto o compositor da canção nova, Manno Góes, como também a equipe da artista se posicionaram negando que ela tenha sido plagiada. Ambos citam que o que houve foi a inspiração da música na cantora. Inclusive, na nota divulgada, Rachel agradeceu por ter sido lembrada.
A artista iniciou a carreira em 2019, depois que um amigo de trabalho com quem dividia os planos e sonhos acabou morrendo tragicamente. Naquele momento, Rachel refletiu e chegou à conclusão de que precisava investir na carreira, que, até então, se resumia em apresentações em bares da cidade de Feira de Santana, onde nasceu e foi criada.
Decidida a gravar, a baiana deixou o trabalho que tinha na época como recepcionista em um posto de saúde do município, a cerca de 100 km de Salvador, para viajar para Pernambuco, onde teve o apoio do cantor Barro, e deu o pontapé para o sucesso atual.
"Acho que esse foi um insight muito forte, a morte dele. O fato da gente conversar muito sobre nossos sonhos, sobre o que a gente queria fazer no futuro. Isso mexeu muito comigo, até que eu tomei a decisão cinco dias depois sair sem dar tchau a ninguém, e que eu iria para Pernambuco trabalhar nas minhas músicas".
Desde então, a carreira de Rachel segue em ascensão, e nem a pandemia de Covid-19, que causou prejuízos ao setor do entretenimento, impediu o progresso. Nas redes e plataformas, a artista já tinha público fiel e isso só aumentou. Ela conta que tinha uma base de números observados pelo meio virtual, mas depois acabou tendo contato com os fãs pessoalmente, e ainda não se acostumou com isso.
"Eu acho estranho quando eu lembro de pouco tempo atrás, de como eram as coisas e de como as coisas foram caminhando até o que está virando agora. Óbvio que a gente quer que isso chegue em mais pessoas, mas, ao mesmo tempo, acho que a gente não está preparado para quando as coisas começam a fluir", disse.
Para além do carinho do público, as constantes indicações a prêmios, como na categoria de artista revelação da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA), que foi faturado por ela em fevereiro deste ano, também colocaram a cantora próxima de outros famosos.
Recentemente, por exemplo, Rachel chegou a participar do Prêmio Multishow, que é sempre repleto de nomes nacionais importantes, e também cantou ao lado de Léo Santana na casa de Regina Casé, na capital baiana.
"Eu não estou acostumada com isso. Eu olho de fora e parece que não é comigo. Aí eu vejo alguma foto minha no meio de gente conhecida e sempre tenho a sensação de que eu não pertenço, de que eu estou ali tietando".
Referências
Além de nomes como Milton Nascimento, Jorge Ben Jor, Gal Costa, Céu e BaianaSystem, a artista tem como referência a mãe, Maura Reys, que também é cantora e inspirou ainda a irmã mais velha de Rachel a seguir na profissão.
"Ela é minha rainha, de onde minha voz veio. Ela fica muito feliz com isso, depois de tudo o que ela passou sendo uma mulher preta no mercado. Ela passou poucas e boas, até ela ter saído do universo da música 'do mundo', como eles dizem, e hoje ela ser uma cantora evangélica. Mas ela passou por muita coisa, então eu sinto que eu sou motivo de orgulho para ela".
Não é à toa, que a mãe coruja está sempre exaltando a filha, como revelou Rachel. E, entre uma tietagem e outra, ainda sobra tempo para ancestralidade, com conselhos e dicas. Tudo fruto de alguém que já vive há bastante tempo no caminho que a cantora tem seguido.
"Acho que ela já me passou muito conhecimento de como enxergar tudo isso. São conselhos importantes. Ela passou por muita coisa", revelou.
Planos para 2023
Em 2023, a cantora pretende seguir divulgando o álbum "Meu Esquema", lançado no final do ano passado. Mas sem deixar de trazer novidades. Entre elas, as gravações do próximo trabalho da carreira. Para a editoria, Rachel revelou que o objetivo é lançar um álbum novo a cada um ano e meio.
"Ele está me rendendo umas listas. Eu estou gostando do movimento que ele está dando. Minha ideia é rodar muito com ele ainda. E nesse período eu quero já começar as produções de novos lançamentos de um próximo álbum".
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