Só a solidariedade cura. Essa frase nunca foi tão verdadeira quanto atualmente para pacientes de doenças crônicas e que dependem de medicamentos controlados e caros distribuídos gratuitamente pelo governo do estado do Rio de Janeiro. Diante do abastecimento irregular da Rio Farmes, a farmácia do estado, muitas dessas pessoas recorrem às dezenas de grupos de troca e doação de remédios que existem na internet e, só assim, conseguem dar continuidade ao tratamento.
Normalmente, o medicamento oferecido — e muitas vezes enviado pelo correio de lugares distantes — é sobra de algum parente que morreu ou de pessoas que concluíram a terapia e usam as redes sociais para passá-lo adiante, sem custos, apenas com a intenção ajudar o próximo.
Não fosse dessa forma, Luma Doné Miranda, de 27 anos, não teria como tratar a retocolite ulcerativa, doença do intestino, diagnosticada em 2011. Ela conta que a última vez que encontrou o seu remédio, o Mesalazina 400mg, na farmácia do estado foi em março de 2016 (hoje, a Rio Farmes tem o de 500mg, o que não soluciona seu problema). Desde então, a salvação tem sido grupos de troca e doação. Como ela toma quatro comprimidos por dia, uma caixa que custa de R$ 140 a R$ 200 só dura uma semana.
— Acabamos criando mecanismos para lidar com a falta de remédios. A gente nem sabe se é certo, mas faz porque é uma questão de saúde — argumenta a moradora do Itanhangá que participa de cinco grupos no Facebook e dois no WhatsApp.
Já a moradora de Nilópolis Laura Lee, de 35 anos, criou um grupo no Facebook (Doação de Medicamentos-RJ) após ter sido diagnosticada como portadora do vírus HTLV, que é transmitido sexualmente. Começou doando medicamentos que sobravam, hoje tem seis prateleiras cheias para doação e busca espaço maior para ampliar a ajuda aos que precisam.
A prática, no entanto, não tem aprovação do Ministério da Saúde, que recomenda a devolução das sobras ao órgão, para análise e possível redistribuição a outros pacientes.
— As doações me mantêm por um tempo, mas não garantem que vou ter o medicamento todos os meses. No entanto, diante da falta no estado, é a principal saída. Os grupos de troca e doação de remédios são de extrema importância. Eu não estaria aqui conversando não fosse isso. Fora que ganhei o que chamo de irmãos intestinais, que também formam uma rede de apoio, por reunir pessoas que enfrentam o mesmo mal. Além de serem importantes para facilitar a obtenção do medicamento, esses grupos são suporte para enfrentar a doença — diz Luma.
A dificuldade de obter remédios no Rio leva pacientes a buscarem doações em outros estados. É o que fez Hanna Araujo, de 27 anos, moradora de Vista Alegre, na Zona Norte.
— Tive de recorrer a pessoas de São Paulo e Belo Horizonte. O médico vai trocando o medicamento de acordo com o tratamento e também pela dificuldade das pessoas de encontrar — afirmou a jovem, portadora da doença de Crohn, inflação crônica do aparelho digestivo.
Hanna, que também utilizava o Mesalazina, vai passar a usar o Adalimumabe este mês. Cada dose, que é injetável, custa R$ 5 mil, e ela precisa tomar quatro por mês. Para sua surpresa e alívio, ela encontrou o remédio disponível na Rio Farmes.
Também com retocolite ulcerativa, Thayane Claudino Alves, de 32 anos, moradora do Estácio, faz uso do Azatioprina. Ela teve notícia de que o abastecimento foi regularizado na Rio Farmes, mas desde o fim de 2016 não conseguia retirá-lo. Com isso, recorria a doações vindas de locais distantes como São Paulo e Santa Catarina. Hoje, ela integra a Associação de Pessoas com Doenças Inflamatórias Intestinais criada, entre outras coisas, para ajudar a facilitar o acesso dos pacientes aos medicamentos. O custo é apenas o do frete.
Nelson Nahon, presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj), defende que a prescrição de medimentos é atribuição dos médicos e que a distribuição cabe ao SUS. Para ele, o recurso utilizado por esses pacientes mostra a dificuldade do estado em cumprir sua parte. Nahon alerta para os riscos, como o uso de medicamento vencido.
Cuidados necessários
Validade —Quem vai doar ou receber medicamentos precisa ficar atento à data de validade do mesmo, para evitar prejuízo à saúde.
Refrigeração — O Ministério da Saúde adverte ainda que alguns remédios, para terem eficácia, necessitam estar sob determinada temperatura e também precisam de acondicionamento especial. Por isso, não recomenda a doação ou troca.
Prioridade — Como os medicamentos podem vir de diferentes fontes e com validades distintas, os pacientes costumam utilizar primeiro os com data mais próxima do vencimento, para evitar o desperdício.
Onde buscar —O grupo Doações de Medicamentos-RJ aceita tanto pedidos quanto oferta de doações pelos telefones (21) 98132-0960/ 98166-1322/ 99389-6659. As entregas, sem frete, são feitas apenas na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro e em cidades vizinhas. A Associação de Pessoas com Doenças Inflamatórias Intestinais (ADII) aceita pedido de doação e oferta de remédios pelo e-mail [email protected]
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Redação iBahia
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