O ex-técnico da seleção brasileira de ginástica Fernando de Carvalho Lopes teria registrado, em foto e vídeo, parte dos abusos que cometeu contra os atletas que treinava. As revelações foram feitas à repórter Joanna de Assis e exibidas no domingo pelo “Fantástico”, da “TV Globo”. As vítimas narram episódios nos quais perceberam que estavam sendo fotografadas ou filmadas pelo treinador.
Um ex-atleta, que já prestou depoimento à polícia, conta que flagrou uma tentativa de Fernando de fotografá-lo enquanto dormia. Também revelou que o técnico posicionava uma câmera para registrar o banho dos meninos.
— Ele colocava a câmera dele para carregar no vestiário, num banco que tinha lá, bem de frente para os chuveiros. Na casa dele também. Ele sempre deixava a câmera carregando em cima da pia, virada para o box. Até que, uma vez, eu saí do banho e fui ver. Ela estava gravando e carregando — contou a vítima, que não chegou a apagar o registro.
Outro ginasta, que já defendeu a seleção brasileira e não quis gravar entrevista, narrou um episódio semelhante em depoimento à polícia, na quarta-feira. O atleta, hoje maior de idade, foi treinado por Fernando dos sete aos 17 anos. Aos investigadores, contou que foi até a casa de seu então treinador após uma atividade. E que a mesma câmera usada para gravar os treinos fora deixada no banheiro sob a justificativa de que estava sendo recarregada. Mas o equipamento seguia ligado e filmando o atleta. Diferentemente da outra vítima, esta conseguiu apagar a gravação em que aparecia. Mas não verificou se havia outros registros no aparelho.
ACERVO EM CASA
Uma terceira vítima narrou um episódio ainda mais delicado, que teria acontecido quando ainda tinha 11 anos e fazia uma viagem com a equipe: — Eu me machuquei na barra, fazendo um exercício. Falei para ele (Fernando): “Eu bati meu pênis na barra, está doendo”. Ele falou: “Vou ver se tem uma pomada para passar. Vamos para o hotel que lá a gente vê o que faz”.
Já no banheiro do hotel, Fernando teria usado o chuveirinho para lavar as partes íntimas da vítima, antes de tocá-las sob a justificativa de que precisava verificar o problema: — Depois, ele voltou com uma pomada e começou a manipular, passar a pomada. Não gostei porque ele, em momento nenhum, sugeriu me levar para um médico de fato ou a uma enfermeira.
Desde 2016, quando foi feita a primeira denúncia contra Fernando, 22 pessoas já prestaram depoimento a policiais e promotores. Quatro delas relataram que o técnico fotografava e filmava crianças nuas. Um deles contou que, no quarto do treinador, havia um armário com imenso acervo de vídeo, DVDs e CDs. Segundo a vítima, “eram muitos, uns 200”, devidamente etiquetados. Na sexta-feira, após autorização da Justiça, policiais apreenderam, na casa de Fernando, CDs, DVDs, pendrives, uma fita cassete e um HD externo. Todo esse material passará por perícia.
— Se a pessoa pratica filmagem, fotografia, depois lança a público, ou mesmo que ela tenha armazenado em casa, já estará cometendo crime — afirmou a advogada criminal Luiza Nagib Eluf ao “Fantástico”. A pena é de quatro a oito anos de reclusão para cada criança feita como vítima.
Na semana passada, Fernando Carvalho Lopes negou as acusações de assédio. Desta vez, não quis gravar entrevista para o “Fantástico” a fim de comentar as novas denúncias. Seu advogado limitou-se a esclarecer que ainda não havia definido a linha de defesa e que seu cliente continuava a se declarar inocente.
Depois das revelações, Fernando foi afastado do clube Mesc, onde trabalhava, em São Bernardo. Da seleção brasileira de ginástica ele havia sido dispensado antes dos Jogos Olímpicos de 2016. Já o Conselho Regional de Educação Física solicitou o acesso às investigações e pode cassar o registro profissional do ex-técnico da seleção.
Enquanto a Justiça dá início às apurações que podem responsabilizar Fernando pelos episódios de assédio, as vítimas começam a entender que foram exatamente isso: vítimas. — Hoje, consigo ter a maturidade de ver que não fiz nada de errado, quem fez foi ele. Isso vai ficar na nossa mente, e a gente quer que seja reparado com Justiça. Que ele seja punido pelo que fez, que é um crime gravíssimo — desabafou um de seus ex-atletas.
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Redação iBahia
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