Na era da internet, pode parecer que todas as informações estão a um clique, mas não é bem assim. Quando o mistério aperta, em diversas esferas da vida, a figura do detetive particular ainda é muito requisitada. Segundo Luiz Gomes, presidente da Associação Nacional dos Detetives e Investigadores Privados do Brasil (Anadip), um profissional iniciante no ramo recebe, em média, remuneração mensal de R$ 3 mil. Quem tem mais de dois anos de exercício pode cobrar, pela sua diária, de R$ 500 a R$ 1.500.
— Perdemos clientes com a internet, mas também a usamos em nosso favor, para investigar. Cerca de 70% das demandas são por suspeita de traição, mas o campo é maior. O detetive particular pode atuar na esfera criminal, civil, empresarial — diz Luiz Gomes, explicando como se compõe o ganho do profissional: — Cada caso é um caso. Para a maioria deles, o detetive acorda um prazo e um orçamento. Recebe 50% para começar e arcar com custos e 50% ao fim, na entrega de seu relatório para o cliente, independentemente do resultado obtido. Apenas em casos de desaparecimento, eu, particularmente, condiciono o pagamento da segunda parcela à conclusão.
A atividade de investigação na esfera privada é reconhecida pela lei brasileira. Por vezes, os alvos dos detetives podem ser muito semelhantes aos de policiais, mas Luiz ressalta que é importante deixar claras as diferenças entre os dois profissionais:
— Não pode se apresentar como policial ou fazer promessas desta esfera. Nós não podemos grampear telefones, colocar câmera, entrar em conta bancária — explica Luiz, que dá pistas sobre o segredo do sucesso dos verdadeiros Sherlock Holmes, um dos mais famosos detetives da ficção: — Determinação e experiência contam muito. É preciso também ter um olhar fora do senso comum e crítico. O detetive não pode se deixar levar pela emoção do cliente, acreditar na versão dele.
Experientes orientam os novatos na carreira
Apesar de a lei não exigir formação específica, buscar qualificação é a recomendação de Luiz Gomes para quem quer ser detetive particular. Segundo ele, os bons cursos colocam, inclusive, o profissional iniciante em contato com um tutor, que vai orientar seus primeiros passos.
— Se o detetive errar, pode criar um problema para o cliente e para ele, responder até a um processo criminal. Então é importante ter alguém orientando sua caminhada — diz.
Mas é preciso conhecer a escola e a história dos professores antes de se matricular, pois muitos cursos são oferecidas por gente inexperiente. Damásia Chaves se formou em 2015 na Academia de Inteligência Privada, fundada por Luiz no Rio. Ela pretendia apenas ajudar o marido a achar a família biológica dele, que é filho adotivo, e acabou se apaixonando pela profissão.
— Eu procurei o curso porque meu marido, filho adotivo, estava com 57 anos e não conhecia o pai. Ele se sentia muito só, sem saber as origens. Um detetive me cobrou R$ 8 mil, então achei melhor eu mesma investigar. Disse que não ia trabalhar nessa área, porque meu marido é aposentado e deficiente visual, precisava de mim. Infelizmente, o pai dele havia falecido em 2009, mas encontramos a última família com quem ele conviveu: a viúva e um casal de filhos adultos. Fiquei tão maravilhada com a experiência de aproximar famílias, de descobrir a origem da pessoa, que não resisti e decidi trabalhar como detetive. Já localizei várias famílias, dando, assim, a felicidade a essas pessoas — comemora ela.
‘O detetive não inventa’, diz presidente de associação da categoria
Com 32 anos de profissão, Luiz Gomes tem como principal pauta, à frente da Associação Nacional dos Detetives e Investigadores Privados do Brasil (Anadip), a aprovação do projeto de lei 9.323/17, que cria a necessidade de registro dos detetives na Polícia Federal. Ele conversou com o EXTRA sobre essa demanda e outras curiosidades sobre o trabalho de investigação privada.
Como está o mercado hoje para o detetive particular?
Luiz: A aprovação da lei 13.432, em 2017, trouxe uma segurança jurídica ao detetive particular. Antes, havia uma lei que regulamentava agências de investigação privada, mas não falava qual profissional fazia isto. A nova lei reconhece os detetives, porém, não regulamenta ainda a profissão, dizendo qual formação precisa ter, como deve se identificar. Está em discussão agora um projeto de lei que tornaria necessário o detetive se registrar na Polícia Federal para atuar. É um primeiro passo para o estado saber quem é este profissional.
Há muitos mitos sobre a profissão? Vocês usam disfarces e enfrentam perigos?
Luiz: Sim, há muitos mitos a respeito da profissão, como o de que o detetive particular faz grampos em telefones, o que não é verdade. Quanto ao disfarce, existem situações em que o detetive precisa se disfarçar, principalmente quando a investigação é feita em locais de risco ou para fazer campana por um longo período. É comum se disfarçar de panfletista, camelô, guardador de carro.
Ainda sobre a vida real: há limites éticos para a atuação?
Luiz: O detetive faz investigação, não inventa. Há situações, por exemplo, em que clientes pedem para forjar provas ou criar situações para constranger a outra parte. O detetive deve estar atento, respeitar as garantias fundamentais do cidadão, principalmente em relação à invasão de privacidade.
Muitas investigações são por suspeitas de traição. Você já concluiu que o cônjuge é fiel?
Luiz: Nem sempre a suspeita de traição é confirmada. A suspeita começa com a observação da mudança de comportamento do parceiro. Em outros casos, há supostos indícios que apontam para algo, mas, após a investigação, fica comprovado que são fruto da imaginação do cliente.
Em geral, as pessoas aceitam a verdade, positiva ou negativa?
Luiz: Boa parte dos clientes se sente frustrada com o resultado, porque cada um acredita na sua própria verdade. Por isso, é importante o profissional não alimentar pensamentos e expectativas. Ele deve ter um olhar fora do senso comum para evitar contaminação na sua opinião quando for apresentar o relatório da investigação. A verdade deve sempre prevalecer, doa a quem doer.
A figura do detetive ainda atrai jovens como clientes?
Luiz: Acredite: há jovens que contratam o detetive para investigar namorado e há casos em que quer saber os locais frequentados pelo outro para provocar encontros casuais e frequentes. A tal coincidência ajuda na paquera, né?
Você já deixou de concluir um caso? Por qual motivo?
Luiz: Sim, há casos que, infelizmente, ficam inconclusos e até sem respostas. Investigação é como um quebra-cabeça, onde cada peça é uma informação, e há casos em que não se acha mais uma dessas pecinhas.
Há riscos em contratar um detetive desqualificado?
Luiz: Sim, infelizmente há pessoas anunciando serviço de detetive, mas na verdade aplicam golpes. Um muito comum hoje é quando o golpista diz que consegue monitorar um telefone à distância apenas com o número. Convence o cliente a fazer um depósito e, além de não executar o prometido, passa a ameaçar e extorquir dinheiro do cliente. É importante que o cliente procure sempre pelo profissional que está estabelecido comercialmente, vá ao escritório dele e exija o contrato de serviços.
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Redação iBahia
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