Foi um “annus horribilis” para a Seleção Brasileira. O termo proveniente do latim e que em sua tradução corriqueira significa "ano horrível" e "um ano de eventos extremamente ruins", segundo definição do Dicionário de Cambridge, resume bem o que foi 2023 para o selecionado verde e amarelo.
Se a imensa maioria de torcedores ainda acreditava que a derrota para Camarões, a primeira para um time africano numa Copa do Mundo, e a eliminação frente à Croácia foram desastrosas no Qatar é porque não tinham a menor ideia de como terminaríamos este ano.
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Em retrospectiva, o que se viu neste ano foi uma sucessão de desastres em série, tanto no modelo de gestão quanto nos resultados obtidos:
- Numa série de amistosos no primeiro semestre, sob o comando do interino Ramon Menezes, o Brasil perdeu para o Marrocos (2 a 1), venceu a fraca Guiné (4 a 1), e sofreu uma goleada do Senegal (4 a 2).
- Com a negativa de Carlo Ancelotti para comandar a Seleção Brasileira ainda neste ano, a CBF apostou na “solução” Fernando Diniz para iniciar a disputa das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2026.
- A primeira Data FIFA, com uma vitória imponente sobre a Bolívia (5 a 1) e um triunfo nos acréscimos contra o Peru (1 a 0) na altitude andina, serviu para iludir torcedores turbinados pela imprensa.
- O encanto com o estilo de futebol mostrado por Fernando Diniz começou a se quebrar na segunda Data FIFA, após o empate inédito em casa contra a Venezuela (1 a 1) e a derrota frente ao Uruguai (2 a 0) no Estádio Centenário, numa das piores apresentações da história.
- A desconfiança pelos tropeços nas rodadas anteriores ganhou contornos de tragédia na terceira Data FIFA quando o Brasil perdeu para a Colômbia (2 a 1) em Barranquilla e também para a Argentina, atual campeã do mundo, em pleno Maracanã (1 a 0).
- No atual momento, o Brasil está no sexto lugar, último posto para a classificação direta, uma posição abaixo do Equador (que começou a competição com três pontos negativos) e muito próximo do sétimo colocado, que disputará a repescagem.
Mais que os péssimos resultados obtidos nos jogos amistosos e oficiais, a Seleção Brasileira conseguiu bater inúmeros recordes negativos neste ano:
- Pela primeira vez em 60 anos, o Brasil fechou o ano com mais derrotas que vitórias, lembrando que, em 1963, a Seleção disputava seus jogos praticamente com uma equipe reserva, enquanto seus principais craques excursionavam pelo mundo.
- Primeira derrota em casa nas Eliminatórias (para a Argentina)
- Fim da invencibilidade de oito anos nas Eliminatórias (Chile 2 x 0 Brasil, em 2015)
- Primeira derrota para o Uruguai em mais de 20 anos (Uruguai 1 x 0, pelas Eliminatórias 2002)
- Primeira derrota para a Colômbia nas Eliminatórias em todos os tempos
- Primeira derrota para a Argentina em casa nas Eliminatórias
- Primeira vez que sofre duas derrotas seguidas (Uruguai e Colômbia)
- Primeira vez que sofre três derrotas seguidas (Uruguai, Colômbia e Argentina)
Se desde a conquista do Pentacampeonato, em 2002, o Brasil veio se tornando o saco de pancada para as seleções europeias de grande e médio porte (França, Holanda, Alemanha, Bélgica e Croácia desde então), em 2022 perdemos também a invencibilidade num Mundial para uma fraca seleção africana (Camarões).
E não termina: neste ano somamos mais duas derrotas frente a equipes do mesmo continente e agora já começamos a sofrer perante seleções ainda consideradas menores da América do Sul, como Peru e Venezuela.
A já conhecida desorganização da CBF, a indefinição sobre o nome do treinador, a geração limitada de jogadores brilhantes, a ausência de um craque e de uma liderança em campo, e a total desconexão afetiva entre atletas e torcedores estão colaborando para que o caos se estabeleça.
A situação pode se complicar ainda mais caso o Brasil seja punido com perda de pontos e até pela proibição de jogos com torcida, em decorrência da vergonhosa pancadaria generalizada entre torcedores rivais nos momentos que antecederam a partida contra a Argentina, no Maracanã.
Talvez a gente precise se acostumar com a ideia de que não somos a Seleção mais poderosa do mundo há muito tempo, que nossa camisa amarela não assusta mais ninguém, e que toda equipe enfrenta o Brasil sem medo porque aos olhos do mundo nós nos tornamos os novos bobos do futebol.
Ao findar das luzes de 2023, as perspectivas não são nada animadoras. Mas é importante lembrar que nas Eliminatórias que culminaram tanto na conquista do Tetra como do Penta, o Brasil passou também por uma grande crise. Para se classificar ao Mundial dos Estados Unidos (1994), a Seleção empatou com o Equador na estreia e experimentou sua primeira derrota em todos os tempos numa Eliminatória frente à Bolívia.
Já a campanha que levou o Brasil à Copa do Mundo do Japão e Coreia do Sul (2002) teve nove vitórias, três empates e inacreditáveis seis derrotas. Talvez estas coincidências nos estimulem a sonharmos com um “annus mirabilis” em 2026.
Silvio Tudela
Silvio Tudela
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