Nascido e criado no Morro do Adeus, o boxeador Alan Luiz Duarte, de 29 anos, nunca perdeu um parente por causas naturais. Dez pessoas de sua família foram mortas a tiros e pelo menos 90 amigos e conhecidos já foram baleados na guerra do tráfico. Calejado pelas tragédias e decidido a se tornar um agente de transformação social, ele criou o projeto Abraço Campeão, que oferece aulas de boxe e cidadania a jovens do Complexo do Alemão. A história virou filme e ganhou o mundo: o documentário “The good fight” (“A vida é uma luta” em português), premiado em cinco festivais internacionais este ano.
A guinada na vida de Alan Luiz veio após a perda do irmão mais velho, Jackson Duarte, que ele considerava como pai. O rapaz tinha três passagens na polícia por roubo, apologia ao tráfico e lesão corporal. Em 2012, Jackson foi morto com um tiro na cabeça.
— Depois daquele dia comecei a fazer as contas e percebi que nenhum homem da minha família ficou velho. Todos foram assassinados. Vi no Mapa da Violência que jovens entre 15 e 29 anos eram os que mais morriam. Eu estava naquela faixa etária e todo dia passava por tiroteios. A diferença é que na maior parte do tempo eu estava treinando, o que me afastava da zona de risco — conta.
Boxeador desde 2005, quando começou a treinar na ONG Luta Pela Paz, na Maré, passou a compartilhar sua experiência com outros jovens do Morro do Adeus e, em 2014, deu início ao projeto Abraço Campeão, que atende 60 crianças e adolescentes. Para participar do projeto, há uma contrapartida: uma vez por semana, é preciso assistir à aula de cidadania e desenvolvimento pessoal.
Em 2006, o boxeador viu mais um parente morrer baleado: A décima vítima da família foi um primo de apenas 12 anos:
— Ele chegou a vir no projeto duas vezes, mas foi morto pelo tráfico.
Alan participou de 54 lutas e perdeu 12. Como competidor do boxe olímpico, viajou pelo Brasil e conheceu países como África do Sul e Inglaterra. Hoje sonha com o dia em que seus alunos terão a chance de expandir seus horizontes.
Amigo inglês era a força que faltava para documentário nascer
Com a ânsia de profissionalizar o projeto, mas sem conseguir apoios ou patrocínios, Alan Luiz decidiu pedir ajuda. Entrou em contato com o inglês Benjamin Holman, diretor de filmes publicitários que morou 12 anos no Alemão. Ben, como é conhecido, teve o primeiro contato com ele nos ringues da Luta Pela Paz. O estrangeiro, que produzia vídeos para a ONG, também treinava boxe.
— Encontrei Ben e pedi que fizesse um videozinho de dois minutos para divulgar o projeto. Ele topou. Veio um dia, voltou no outro. Quando percebi, já estava filmando o projeto há quatro meses. Resolvi perguntar por que estava produzindo tanto material. Ele explicou a intenção de fazer um documentário, então caí dentro da ideia — lembra.
Em 2017, o filme rodou por dez festivais internacionais e saiu vencedor em cinco: melhor documentário curto no festival Tribeca, em Nova York, e no Festival de Cinema Brasileiro, em Los Angeles; melhor documentário estrangeiro no Atlanta Docufest e dois “Prêmios do Público” no SOUQ Film Festival em Milão e no Festival Cityfilm de Nevada.
Agora, ele sonha com a exibição no Brasil.
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Redação iBahia
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