Sincretismo e devoção marcam Festa de Iemanjá no Rio Vermelho

"(...) Quem ouve desde menino, aprende a acreditar que o vento sopra o destino pelos caminhos do mar". A letra da canção "Caminhos do Mar", de Dorival Caymmi, revela a fé e o mistério presentes na histórias de pescadores e devotos da Rainha da Mar.

A alvorada de fogos no Dique do Tororó na madrugada desta quinta-feira (2) já anunciava o ritmo do dia: eram as homenagens a Oxum, orixá feminino que reina sobre as águas doces. Era também o começo dos festejos a Iemanjá, mais tarde, no bairro do Rio Vermelho.

Pouco depois das 7h30, a fila de devotos em direção à Casa de Iemanjá, na Colônia de Pescadores Z1 já se aproximava do Largo de Santana. Eram centenas de pessoas, filhos e filhas de santo, curiosos e admiradores com suas oferendas para serem colocadas no balaio do presente principal, previsto para ser entregue no mar às 16h. A longa espera não desanimou mãe e filha que vieram agradecer as conquistas alcançadas. Jéssica e Ana Jabar encararam a fila desde às 7h e não quebram a tradição familiar. "Venho agradecer mesmo, mais do que pedir. E agora minha filha vem comigo", diz Ana.

A tradição da entrega de presentes pelos pescadores à Iemanjá começou há 94 anos, quase a mesma idade da aposentada Elza Khouri, de 90 anos, que participa da festa há mais de 30 anos. Reunida com familiares, a idosa tem o costume de entregar terços do Rosário de Nossa Senhora da Conceição Aparecida para as pessoas que passam no local da festa. De acordo com Larissa Khouri, neta de Dona Elza, a ideia é comemorar os 91 anos no festejo de Iemanjá em 2018 também.

Marcada pelo sincretismo religioso, a festa reúne adeptos do candomblé, umbanda e catolicismo. Nas areias da Praia do Rio Vermelho, a equipe do iBahia encontrou duas turistas de São Paulo. A publicitária paulista Gabriela Putin fez a estreia na festa soteropolitana à beira do mar. "Eu vim para conhecer, por ter afinidade com o orixá. Já fui umbandista e sempre quis vir. Estou achando a festa maravilhosa", revelou a turista que veio especialmente para a festa. A amiga, Tammy Aires, se emocionou."Estou maravilhada com a festa, emocionada e encantada com a essa pluralidade religiosa daqui", concluiu.

Para a ialorixá Tânia Pereira, que mora em Pituaçu, a celebração a Iemanjá é uma oportunidade singular para ela, que é filha da Rainha das Águas. "Essa é a primeira vez que eu venho para dar axé nas pessoas, vestida assim, e é diferente, né?", reflete. A baiana revela ainda que este ano paga uma promessa para São Lázaro e Iemanjá. "Fiz (a promessa) para Iemanjá e São Lázaro e estou aqui na areia desde 5h30 dando axé nas pessoas. Para mim é muito especial. Para dar axé na pessoa, você tem que estar bem, preparada. Já recebi gente de vários lugares do Brasil aqui, alguns que nem são da religião, mas que se identificam e se emocionam com a energia", diz. Questionada sobre a promessa, a ialorixá prefere manter o segredo e sorri. "É um presente de filha para mãe, né? É segredo!", brinca.

A festa é também uma oportunidade de garantir um dinheiro extra e o pescador Márcio Pereira, há mais de 20 anos na profissão, afirma que o dia está "para peixe" e sorri. "Eu sempre observei e gostei da festa. Estou aqui desde 4h levando as pessoas com os presentes. A maré ainda está cheia e é tá bom para levar os presentes", contou animado. Em média, levar duas pessoas nos barquinhos custa, em média, R$15.Nas areias da praia do Rio Vermelho, a parte profana da festa já ganhava espaço ao lado dos devotos que ainda saudavam a Rainha das Águas: um barracão, montado com um toldo e um pequeno tablado era o espaço para os amantes do samba de raíz. Alguns, ainda com a indumentária religiosa, já mostravam gingado na roda de samba. A saída do presente principal, sempre marcada com queima de fogos, está prevista para ocorrer às 16h.

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