Aos 57 anos, o aposentado Ednilson Leandro dos Anjos caminha à beira da linha férrea de Plataforma, no Subúrbio Ferroviário, esperançoso. “Eu ainda vou viver para aproveitar isso tudo aqui e muito, com fé em Deus!”, diz. Na última segunda-feira, ele foi à reunião que aprovou o projeto de revitalização da orla de Plataforma e Itacaranha e voltou com tudo na cabeça: os banquinhos, a ciclovia, as áreas de lazer, a fonte interativa e até uma piscina natural, que aparece quando a maré enche.
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Projeto vai aproveitar muro de contenção para criar piscina natural; quando a maré enche, a piscina aparece (Foto: Reprodução) |
O equipamento — assim como quadras poliesportivas e um parque infantil — vai ficar em frente à antiga fábrica de tecidos São Brás, desativada desde 1968. Ednilson, que viu a fábrica em funcionamento, comemora as intervenções. “Era um prédio lindo, mas foi acabando. Aqui vai ficar bonito, vai ter uns bancos para ver o pôr-do-sol. E a piscina vai ser algo ótimo, porque o batismo da nossa igreja é aqui. Vai ficar lindo fazer na piscina”, sonha o aposentado, hoje pastor evangélico. Ednilson mora na rua que fica atrás da antiga fábrica, em Plataforma. Onde hoje há um prédio em ruínas – tombado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac) –, rodeado de mato e à beira-mar, a Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF) pretende instalar uma fonte interativa, um parque infantil, além da piscina de maré, com uma praia artificial. Também no trecho estão previstas três quadras poliesportivas, uma pista de skate e ciclovia.
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Piscina natural, parque infantil e fonte interativa serão instalados onde há hoje ruínas de antiga fábrica (Foto: Marina Silva) |
O projeto foi elaborado pela prefeitura de Salvador – através da FMLF – e pela comunidade, em dez oficinas que contaram com a participação de cerca de 100 moradores de Plataforma e Itacaranha. “Eu fui na última reunião, e pelo que eu vi do projeto, vai ser muito bom. A população já sofre com tudo, ali não tem onde passar uma bicicleta, não tem nada, é uma coisa terrível”, diz Ednilson. Já o técnico em administração e também pastor Josemir da Anunciação, 42, diz que quer ver a obra executada e o local com segurança. “Já foram tantas promessas ao longo de tantos anos que hoje eu só acredito porque pelo menos o projeto eu vi. Agora eu quero ver ele sair do papel”, diz.
Execução De acordo com a presidente da FMLF, Tânia Scofield, a previsão é que as obras iniciem no final deste ano e que durem dez meses. O projeto executivo deverá ser concluído em julho e, em seguida, será aberta a licitação. Só então será definido o valor a ser investido no local. Toda a verba será da prefeitura. Para que a nova orla fique como planejado, a Fundação conta também com a substituição dos Trens do Subúrbio pelo sistema de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos). Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado (Sedur), o VLT será licitado até o início do segundo semestre e a previsão é que as obras levem de 24 a 30 meses.
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Rua Almeida Brandão, vizinha da linha do trem, não tem calçamento (Foto: Marina Silva) |
“O conceito é requalificar o espaço público e que tem uma barreira, que é a segregação do Trem do Subúrbio. Mas, a gente conseguiu uma autorização para aquela área, de forma a quebrar um pouco a barreira do trem e já com a perspectiva de substituição pelo VLT, que é leve e compartilha bem com o projeto”, diz Tânia. Com a conclusão das obras, o projeto vai beneficiar moradores de todo o Subúrbio Ferroviário, além dos visitantes. “A orla de Itacaranha e Plataforma abrange todo o Subúrbio. Na verdade, é para toda a cidade”, diz o secretário municipal de Urbanismo, Silvio Pinheiro. Os dois bairros reúnem mais de 50 mil habitantes, segundo censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Comunidade No decorrer das oficinas, os técnicos da FMLF percorreram o trecho de 9 km – entre a estação de trem Plataforma e a de Itacaranha – junto com os moradores, que foram mostrando os pontos importantes e fazendo sugestões. Foi da comunidade, por exemplo, a ideia de instalar uma pista de skate, que ficará no trecho de orla entre São João do Cabrito e Plataforma. Já a ideia da piscina de maré, embora não tenha partido dos moradores, foi aplaudida de pé. No local, há um muro de pedra para contenção de maré, com um buraco. Quando a maré enche, a água atravessa o muro. “Quando a gente era criança, a gente mergulhava no buraco que tem ali onde vai fazer a piscina e deixava a água passar”, lembra o agente de endemias Sandro Vaz, 35.
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Projeto prevê reurbanização, calçamento e conta com projeto de VLT (Foto: Reprodução) |
“Já existe lá uma contenção na borda, já é uma reserva de água e a gente vai aproveitar para fazer uma piscina natural. Urbanizamos toda a área do ancoradouro que liga a Ribeira a Plataforma. A gente vai possibilitar vários restaurantes que são famosos ali em Plataforma e Itacaranha”, diz Tânia Scofield, da FMLF. Além disso, estão previstos cinco recantos de convivência em locais já ocupados hoje pela comunidade para este mesmo fim, todos ao longo da Rua Almeida Brandão. A via, de chão batido, será calçada e reurbanizada, assim como a Rua Úrsula Catharino. As entradas para a praia terão acessibilidade. No trecho de Plataforma, também haverá uma estrutura de apoio às marisqueiras, um espaço de apoio às associações de bairro e a relocação da Barraca do Sal.
Em Itacaranha, nova estrutura gerou polêmica com moradores Em Itacaranha, será feita uma estrutura de apoio aos pescadores e fontes de água serão requalificadas. Lá, o projeto não foi bem aceito no início das reuniões. “O pessoal estava naquela desconfiança de que as casas iam ser desapropriadas e iam ter que sair de lá”, disse o manobrista Hélio Conceição, 52, da comissão de moradores que vai acompanhar a obra. Segundo ele, somente após a prefeitura mostrar que as casas não serão desapropriadas, a população aprovou o projeto. “Com as melhorias do projeto, todo mundo concorda. O problema é que eles vão ter que tirar dois ou três metros de algumas casas e não estão querendo indenizar o pessoal”, diz o pedreiro Delhi Jr, 26.
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Sandro, Ednilson e Josemir: moradores participaram de oficinas (Foto: Marina Silva) |
O secretário Silvio Pinheiro explica que alguns imóveis avançaram na área pública e construíram mais do que era permitido. “Nesse processo de construção do projeto, no diálogo, se levou à compreensão dos moradores sobre as melhorias que a intervenção traria”, disse. Segundo ele, a Procuradoria do município é quem avaliará pedidos de indenização. “A gente está avaliando o benefício da coletividade. Nada foi feito sem acordar com a comunidade”, diz.
Moradores de Plataforma e Itacaranha vão fiscalizar obras Da mesma forma que participaram da construção do projeto, os moradores também acompanharão as obras. “A gente criou uma comissão de moradores para acompanhar todo o processo onde eles moram”, diz a presidente da Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), Tânia Scofield. Assim que as obras começaram, seis moradores dos bairros de Plataforma e Itacaranha irão fiscalizar a execução e cuidar para que o resultado seja igual ao planejado. “Eles deram o mapa e nós fomos riscando e mostrando como é a orla que nós queremos. Nosso trabalho agora é fiscalizar a obra, ver se realmente vai sair como eles disseram”, explica o motorista operador Djanilson José de Oliveira, 42, que mora há 16 anos em Plataforma e integra a comissão. Em Itacaranha, também faz parte do trabalho fazer a comunicação com os moradores. “O nosso propósito é trabalhar em cima do projeto e desenvolver esse trabalho com a comunidade”, diz autônomo Reginaldo Barbosa Sampaio, 55, que também integra a comissão de moradores.