A qualquer hora do dia, o Pelourinho conta com um roteiro de atração que compreende as ladeiras que ligam o Centro Histórico à Baixa dos Sapateiros (Avenida J. J. Seabra). A rota, porém, não é turística, mas de fuga. “Um rapaz acabou de ser assaltado por um pivete. Ele arrancou a corrente e o turista saiu correndo atrás, gritando”, contou a cabeleireira Negra Jhô, enquanto trançava as madeixas de uma cliente na Ladeira de São Miguel, pouco antes da reportagem encontrá-la.
Mapa mostra as principais rotas de fuga usadas por ladrões no Pelourinho; veja (Foto: Mauro Akin Nassor/Arquivo Correio) |
Após o roubo, um policial apareceu e saiu à procura do rapaz, que já tinha sumido por uma das vias que desembocam na avenida. “As ladeiras que ligam a Baixa dos Sapateiros ficam em frente a outras, que vão dar na Saúde e em Nazaré. Por isso, quem desce por uma, sobe pela outra e fica difícil de achar”, conta o comerciante Elson Pastore.
São oito ladeiras do lado direito e nove do lado esquerdo, em direção à Barroquinha. Entre essas, comerciantes, moradores e a polícia relatam que a rota de fuga tradicional é o trajeto da Rua das Flores, que cai na J. J. Seabra. De lá, os batedores de carteira e outros objetos de valor sobem a Rua do Alvo, para sair na Saúde.
“A Rua das Flores tem um tráfico de drogas pesado. Também tem muitos assaltos. Às vezes, empurram as pessoas para roubar. Já vi uma moça tomar um murro no rosto de um ladrão”, conta uma comerciante, que prefere não se identificar.
Para inibir a violência nos locais apontados como caminhos de escape, três câmeras de monitoramento foram instaladas na Avenida J. J. Seabra: uma na Ramos de Queiroz, outra em frente à Ladeira do Alvo e a terceira na Rua das Flores. “Essa aí os sacizeiros quebraram”, apontou Ruy Barbosa, presidente da Associação de Lojistas da Baixa dos Sapateiros.
Entretanto, o diretor de Desenvolvimento Operacional da Superintendência de Gestão Tecnológica e Organizacional (SGTO), major Tarcísio Caxias, garante que todas as três estão em operação.
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Já o Pelourinho, segundo a Secretaria estadual da Segurança Pública (SSP), conta com 11 câmeras em funcionamento. Outras cinco estão em manutenção. As imagens capturadas são transmitidas para a unidade operacional da área, o 18º Batalhão da Polícia Militar (BPM/Centro Histórico), e para o Centro Integrado de Comando e Controle Regional (CICCr), no Parque Tecnológico, Avenida Paralela. A partir daí, tomam-se as providências, como o envio de equipes para atender às ocorrências.
Novas câmeras
De acordo com a SSP, 30 novos equipamentos de videomonitoramento serão instalados na área até a semana que vem. Segundo o subcomandante do 18º BPM, major Alexandre Souza, o policiamento do Pelourinho conta com 60 policiais a cada turno de 12 horas.
Desde 19 de junho, o efetivo também conta com 32 policiais militares do Batalhão Especializado em Policiamento Turístico (Beptur). As rondas na região são realizadas a pé, com motocicletas e viaturas.
Apesar da atuação ostensiva, o major confirma que os assaltos são frequentes. Moradores, por sua vez, buscam alertar turistas a não expor objetos valiosos. “Quando vemos algum gringo em apuros, a gente tenta ajudar, chega junto para evitar o roubo”, contou um morador, que não quis se identificar.
Câmera na Rua Gregório de Mattos não inibe ataques de assaltantes (Foto: Evandro Veiga/Arquivo Correio) |
De passagem por Salvador, a estudante paulista de História Mariana de Andrade, 27, conta que, apesar de não ter presenciado nenhum crime, recebeu instruções quando chegou ao Pelourinho. “Mandaram a gente tomar cuidado, andar somente pelas ruas da direita e as que estiverem movimentadas”, relatou.
De acordo com o major Souza, existem locais onde os roubos são recorrentes. “O risco é maior no Largo do Pelourinho, na Praça Municipal e na Praça da Sé”, relata o subcomandante. “Os assaltos são realizados por adolescentes que fogem pelas ladeiras. Eles usam duas camisas e duas bermudas, que vão tirando, largando pelo caminho. Isso dificulta o reconhecimento”, completa.
Capitães da Areia
Segundo uma mulher que trabalha na região, há grupos, inclusive com crianças, que atuam de forma organizada. “Aqui tem gangue com menino de 6 anos. Um deles usa até chupeta. E não sou eu que tô dizendo. Tá na cara de todo mundo. Até os PMs sabem”, destacou.
Uma comerciante da Baixa dos Sapateiros confirma a atuação dos pequenos. “Eles circulam como olheiros, passando informações para os maiores. É triste”, relata.
Dona de um café na Rua Gregório de Mattos, Rita Doroteia, 60, já foi assaltada três vezes este ano. “Durante o dia, acontecem pequenos furtos em todos os lugares. Se der bobeira e virar as costas é bem possível ser assaltado por algum menino. É um problema social”, analisa Doroteia. Algumas pessoas chegam a comparar os grupos aos personagens do romance Capitães da Areia (1937), de Jorge Amado, que conta a história de jovens abandonados que cometem pequenos crimes na capital.
Tráfico
Além dos assaltos, as ruas do Centro Histórico contam com alguns pontos de venda de drogas. O modo de operação acontece em pequenas quantidades, nas vielas e esquinas, segundo moradores e comerciantes, que preferiram não se estender sobre o tema.
A Rua das Flores e a região próxima ao Mercado São Miguel são apontadas pelas fontes anônimas como a de movimento mais intenso. O major Souza, porém, diz desconhecer esses pontos de vendas. “A gente sabe que existe tráfico, mas se soubesse de uma boca, eu já teria estourado”, diz.
Enquanto durante o dia prevalecem crimes de menor potencial ofensivo, à noite, a violência aumenta. “O Largo do Benin é um ponto de atrito. Agressão com facas e armas de fogo são comuns”, explica o major Souza.
No mesmo largo, por volta das 4h30 de 23 de junho, próximo à base móvel 24h da PM, houve uma tentativa de homicídio com troca de tiros entre traficantes rivais. Duas pessoas ficaram feridas. O autor dos disparos escolheu o trajeto tradicional de fuga do Pelô: a Ladeira do Alvo.
“Ele subiu para a Saúde, passamos um rádio e lá ele foi capturado pela 2ª CIPM”, conta Souza. A assessoria da SSP informou não ter acesso imediato a dados sobre as ocorrências registradas especificamente no Pelourinho.
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