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SALVADOR

Jornalista baiana fala sobre o trabalho no The New York Times

Fernanda contou um pouco mais sobre a sua carreira e o novo desafio de chefiar a redação de um dos maiores jornais do mundo

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04/07/2012 às 8:31 • Atualizada em 08/09/2022 às 5:39 - há XX semanas
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Promovida a chefe de redação do jornal The New York Times, em Phoenix, a jornalista Fernanda Santos, já se tornou referência no jornalismo internacional. Em entrevista ao iBahia, a baiana, que trabalha há sete anos no NYT, contou um pouco mais sobre a sua carreira e o novo desafio de chefiar a redação de um dos maiores jornais do mundo. iBahia - Como surgiu a decisão de fazer jornalismo fora do Brasil? Fernanda Santos - Eu sempre gostei de escrever e de conversar; o jornalismo pareceu ser, portanto, uma escolha lógica. Mas eu passei no vestibular muito jovem – tinha 16 anos – e quando entrei na universidade, fiquei muito amiga de uma galera que terminou por estudar publicidade, portanto acabei seguindo a onda deles. Logo descobri que havia sido um erro, e como na época o sindicato exigia diploma de jornalismo para exercer a profissão, não pude iniciar a minha vida profissional como repórter de jornal. Também não achava justo que tivesse que estudar por mais dois anos para ter diploma de jornalista – e hoje, mais do que nunca, sei que jornalismo não é algo que se aprende em faculdade. Acabei trabalhando para a Revista Odebrecht Informa e, enquanto estava lá, comecei a pesquisar sobre mestrados nos Estados Unidos. Achei que, assim, poderia combinar um desejo que sempre tive de morar fora com a vontade de aperfeiçoar o conhecimento que vinha aprendendo na prática, além de direcioná-lo especificamente para a aplicação no jornalismo diário. Apliquei para três universidades, fui aceita em duas e escolhi Boston University por ter um bom programa de jornalismo impresso e pelo fato de que eu nunca tinha ido a Boston. Meu plano era de passar um ano em Boston, me formar e tentar obter a equivalência no Brasil usando o mestrado que fiz no exterior. Mas, num congresso do qual participei, tudo mudou: conheci um cara que era editor de um jornal no oeste de Massachusetts que me ofereceu um estágio (eles estavam procurando uma repórter que falasse espanhol, e eu sou fluente) e um outro cara que era editor de um jornal no centro de Massachusetts com quem eventualmente me casei. Como boa baiana, acredito em destino e vontade divina, e acho que foi isso que me fez ficar por aqui. iB - Como foi lidar com outra língua, outra cultura tão diferente do Brasil? FS - Foi, a princípio, uma violação, um estupro espiritual e intelectual. Tive que aprender a andar de novo. Tropecei e caí mil vezes, mas sempre me levantei e sempre encarei os meus erros com o idioma e com a interpretação cultural do que vivenciava aqui como oportunidades de aprendizado. Um dos momentos mais felizes para mim foi, no entanto, quando descobri que não tinha que “virar americana” para morar nos Estados Unidos e trabalhar na mídia americana. Aliás, a minha baianidade é e sempre foi o que me faz diferente – e essa diferença é exatamente o que me ajudou a destacar-me entre os milhares de outros jornalistas americanos que aspiravam chegar onde cheguei.
"a minha baianidade é e sempre foi o que me faz diferente"
iB - Como a Bahia influencia no seu trabalho? FS - A Bahia sou eu, ou seja, a minha terra, as minhas raízes, são o que fazem ser quem eu sou. Passei a minha adolescência no Rio, onde a minha família morou por vários anos, mas minha essência é 100% baiana. Sou aberta para novas amizades e experiências. Sou humilde, mas sou confiante em quem sou e no que me faz especial. Sei que sou especial por vir de um lugar tão mágico. O baiano conhece pobreza, conhece desigualdade social, mas também sabe que a convivência entre seres diferentes, em todos os sentidos da palavra, é possível, mesmo que haja ainda muitas pessoas que não se deem conta disso. É uma pena, mas ainda existe muito preconceito na Bahia – do baiano contra o baiano, entre rico e pobre, entre bonito e feio, entre gente da cidade e do interior. Hoje, depois de tantos anos morando longe, aprendi que há beleza nessas diferenças e que há valor mesmo em quem achamos ser inferiores. E acho que isso é o que me permite ver o mundo de uma maneira que muitos dos meus colegas por aqui não conseguem ver. iB - Você já passou por vários jornais. Qual foi a experiência mais marcante na sua carreira? FS - Há muitas, e sempre têm haver com as pessoas que conheci, sobre as quais escrevi ou os lugares onde visitem enquanto apurava uma reportagem. Nos dias 13 e 14 de junho, estive no Novo México, em uma cidadezinha linda que provavelmente nunca teria visitado por conta própria. Era uma cidade no deserto, com um lago gigante no meio e montanhas à sua volta. Uma beleza única e inesquecível. Passei um ano seguindo um homem que havia passado 16 anos na prisão – metade da sua vida, pois tinha 32 anos na época – por um estupro e assassinato que ele não cometeu. Ele foi libertado depois de muita luta, quando finalmente um juíz autorizou um teste de DNA no semén encontrado na vítima, o que afirmou a sua inocência. A minha reportagem mostrou as dificuldades que um homem que cresceu na prisão tem em se readaptar a vida aqui fora, à liberdade, mesmo que esse homem sempre tenha sabido que não cometeu os crimes pelos quais foi condenado. Se tiver que escolher uma experiência marcante, acho que seria essa. A lição para mim foi de apreciar mais ainda o que tenho, quem sou, onde estou e, mais do que tudo, de apreciar a minha liberdade. iB - Como aconteceu a promoção? FS - Foi a oportunidade certa, na hora certa. Eu já vinha trabalhando em Nova York há 10 anos, sete destes no New York Times, e estava buscando um novo desafio. Comecei a sondar alguns editores mais amigos, simplesmente para discutir as possibilidades, e a minha vontade de mudar chegou aos ouvidos do editor nacional, que estava buscando alguém para chefiar a Redação em Phoenix. Achei que seria maravilhoso vir para cá. É uma parte do país que não conheço, e uma área ondes várias das problemáticas mais importantes nos Estados Unidos – imigração e economia – estão muito presentes. Meu marido, que é aventureiro e é realmente o meu maior porto seguro, topou a mudança e hoje estamos aqui, felizes, com a nossa filha de 3 anos, aproveitando por alguns anos a vida em outra parte do país. A previsão é de que fiquemos por aqui por cinco anos. E depois, quem sabe, vou para o Brasil? Seria meu sonho. iB - Quais serão os desafios que surgirão com sua nova função? FS - O principal desafio é o fato de eu ser, de certa forma, chefe de mim mesma, ou seja, de eu ter que avaliar, em dois estados, o que é que vale à pena mandar o repórter, o que devo priorizar, como devo apurar/escrever as reportagens. Cobrir o Arizona e o Nono México requere viajar e explorar o território, portanto é comum que eu passe uma ou duas noites por semana fora de casa. Outro desafio muito grande é a responsabilidade da posição: tenho que estar sempre informada sobre o que está ocorrendo e sempre buscar um ângulo diferente para cobrir assuntos talvez já cobertos por outros meios. Como sempre gostei de desafios, esses não me amedrontam. Acho que, na verdade, tê-los serve como um enorme incentivo para que eu possa buscar alcançar cada vez mais e para que eu esteja constantemente testando os meus limites. iB - Existe preconceito por você ter vindo do Brasil? FS - Não. O fato de eu ser brasileira faz com que a caminhada seja mais árdua, pois há sempre a sensação de que você tem que trabalhar mais duro do que os outros, provar que sabe e depois provar de novo, antes de ser reconhecida e recompensada. Tudo é mais difícil, mas isso não é reclamação, apenas fato. Eu tinha duas escolhas: deixar que isso me incomodasse muito e, por fim, me paralisasse, ou botar a armadura, arregaçar as mangas e seguir em frente. Como nunca gostei de reclamar da vida, parti para a luta.

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