Todos os dias, ao sair da loja de telefonia móvel em que trabalha, a analista Ana Luiza Campos, 47 anos, é acompanhada por um segurança. Para ela, que há três anos está no emprego a poucos metros do Instituto do Cacau, a ‘escolta’ é indispensável desde o dia 16 de julho, quando um incêndio atingiu o Instituto, no Comércio. “À noite, tudo aqui é deserto e o risco de ser assaltada é grande. Tenho medo”, diz. O segurança João Vitor Sueira, 30, explica que faz parte de suas funções acompanhar clientes e funcionários até o carro ou até o ponto de ônibus mais próximo. E o trabalho aumentou desde o incêndio. “Se antes teve até caso de estupro no estacionamento, imagine agora”, especula. De tudo que funcionava no Instituto do Cacau, apenas a agência do Bradesco voltou a funcionar. Assim, é como se 6.200 pessoas tivessem deixado de existir. Esse é o número médio de pessoas que passavam diariamente pelo prédio construído em 1932, que abrigava uma sede da Defensoria Pública do Estado, a Diretoria Regional de Educação e Cultura (Direc), uma filial da Cesta do Povo, um posto do SAC e o restaurante Prato Popular, mantido pelo governo estadual.
MedoAgora, mais de 40 dias após o incêndio, ruas do entorno seguem interditadas e o pouco movimento só aumenta a sensação de insegurança. “Preciso vir aqui sempre, mas venho só pela manhã. Tenho medo, porque a distância até o próximo ponto de ônibus é maior”, diz a pedagoga Ana Maria Campelo, 60, que faz de tudo para sair cedo da área. Ainda assim, ela prefere o trajeto da Avenida da França do que a Avenida Estados Unidos. “Como lá está tudo fechado, é ainda mais perigoso”. Trabalhando há oito anos em uma barraca de lanches na área, Flávia Oliveira, 23 anos, acredita que só não é assaltada porque todos na região a conhecem. “Eles se acostumaram comigo e não tentam nada. Sei quem são (os ladrões), mas não posso denunciar ninguém, ou eles saberiam que fui eu”, afirma. Já o militar da reserva Victor Souza, 49, acha que o problema está na falta de policiamento na região. “Passo por aqui quase todos os dias da semana e dificilmente vejo algum policial nestas ruas. Se tiver alguém é na área do Mercado Modelo”, reclama. Oficiais do setor de planejamento da 16ª CIPM dizem que o policiamento é constante na área do imóvel incendiado, contando inclusive com uma dupla de policiais posicionados na esquina do prédio do Instituto do Cacau, próximo à entrada da Cesta do Povo. De acordo com informações do batalhão, não há registros de ocorrências na região desde o incêndio. ComércioA baixa no movimento também atrapalha as vendas do comércio informal. Há mais de 30 anos com sua barraquinha de lanches na Avenida Estados Unidos, José Sebastião de Andrade diz que, para seu negócio, o que mais faz falta é a presença do SAC e da Cesta do Povo. “Agora, meus clientes são os aventureiros que passam por aqui”, conta. Apesar de já ter pensado em mudar de ponto, o comerciante ainda reluta, devido à burocracia de cadastro. “Na verdade, eu que sou um aventureiro”. “Eu estou pedindo misericórdia a Deus para vender alguma coisa”, admite Eliene de Souza, 47, dona de uma barraca de sanduíches na Avenida da França. Sua barraca, que ficava ao lado do ponto de ônibus em frente ao Instituto, teve que mudar de lugar. “Não sei por que fechar essas ruas. Só fez prejudicar a gente. Não aguento mais”, conclui. Obras não têm prazo para conclusãoQuem trabalha no entorno do Instituto do Cacau e reclama da sensação de insegurança ou das poucas vendas, precisa ter paciência. Não há previsão para a reabertura das ruas que tiveram o tráfego suspendo, nem para a volta do funcionamento pleno do prédio. O imóvel pertence à Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), mas quem responde pela reforma é a Superintendência de Construções Administrativas da Bahia (Sucab), órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Sedur). De acordo com a assessoria da Sedur, foi feita uma vistoria no Instituto do Cacau no dia 1º de agosto para avaliação dos danos causados pelo incêndio e verificação da necessidade de escoramento e demolição das paredes. Após a vistoria, foi liberado o uso do térreo, do primeiro e do segundo pavimentos, exceto a área do Restaurante Popular (no térreo). Não se sabe quando o terceiro e o quarto andares serão liberados. “Neste momento, estamos fazendo a limpeza e descarte dos resíduos, reescoramento da estrutura e demolição das paredes. Após isso, uma empresa especializada, que já foi contratada, entra para fazer ensaios de resistência na laje para que identifiquemos o comprometimento da estrutura. Saber o que terá que ser demolido ou não”, diz o diretor de obras da Sucab, César Requião, afirmando que os 50% do reescoramento da estrutura já foram feitos e que tudo deve ser concluído até o final da próxima semana. “Um prazo para a conclusão de toda a obra só podemos dizer após a conclusão dos ensaios. Um diagnóstico deve indicar o que teremos para fazer. E esses ensaios só podem começar após a finalização desta primeira etapa de reescoramento, que como eu disse será concluída em uma semana”, complementa Requião. Por se tratar de um prédio tombado, o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac) afirma que os responsáveis pelo edifício deverão entrar em contato quando derem início à reforma, porém isso ainda não foi feito. “São eles que determinam quando vão começar as obras. Quando isso acontecer, será necessário buscar o Ipac para fiscalizar”, comunicou a assessoria de imprensa do órgão. Interdição complica trânsito no ComércioA previsão da Sedur era de que, uma semana após o início das atividades de limpeza, o tráfego nas ruas adjacentes ao instituto voltasse gradativamente ao normal. Porém, a interdição continua na Avenida Estados Unidos, ruas da Polônia e da Espanha, além de parte da Avenida da França. Nesta terça (28), a Transalvador informou que existe a possibilidade de o tráfego ser liberado hoje na Avenida Estados Unidos. Para as outras vias, não há previsão. Assim, o trânsito no Comércio, conhecido pela lentidão habitual, piorou muito desde o incêndio. “Às vezes pego engarrafamento na Avenida Contorno. Tem dias que levo 40 minutos da Contorno até a Avenida Estados Unidos”, diz o advogado Arthur Couto. A lentidão no tráfego atinge principalmente a Avenida da França, onde parte dos ônibus tem precisado desviar de rota. Os veículos que passam pela Avenida Estados Unidos no sentido da Cidade Baixa têm que desviar pela praça Riachuelo e seguir para a avenida Jequitaia.
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