Hoje é dia de São Roque, bebê. Mas também é de Omulu, no sincretismo religioso. E se dentro da Igreja de São Lazáro e São Roque, na Federação, se cumpre o ritual cristão em homenagem ao santo padroeiro dos enfermos, fora dela, os babalorixás dão banho de pipoca para mandar embora as energias negativas dos fiéis que chegam ao templo.
Durante esta quarta-feira (16), católicos e adeptos das religiões afro-brasileiras vão até a Estrada de São Lazáro (Rua Professor Aristides Novis), para agredecer alguma graça alcançada ou, simplesmente, para beber nas dezenas de barracas armadas em volta da escadaria da igreja.
E se quem tem fé vai a pé, cumprindo o ditado popular, é preciso ter um pouco mais de força quando a idade é avançada. As dificuldades para chegar ao santuário, a fim de acender uma vela em sinal de agradecimento, foi bem maior para a aposentada Maria Glicéria Souza, 96 anos, que chegou amparada pelas duas filhas. A fiel veio do bairro do Barbalho de carro, mas, por conta do grande fluxo de veículos, teve que enfrentar quase 300 metros a pé, da entrada da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia (Ufba) até o templo, só para poder demostrar sua devoção. De lá, logo após o final da missa, que teve início às 9h, saiu com um único pedido que faz todos os anos.
Além de participar, todo ano, das homenagens ao padroeiro dos enfermos, a idade também não impede dona Maria de bater ponto no Rio Vermelho, todo 2 de fevereiro, para prestar homenagens a Iemanjá.
Na verdade, às vezes, não é preciso nem pedir para conquistar algo. Mesmo que essa conquista, para alguns, possa significar pouca coisa. A aposentada Cláudia Santos, 69, jura que o par de sandálias que ganhou de uma senhora na quarta (15), depois de uma missa na igreja de São Lázaro, foi presente do santo. "Ele me deu e eu vim calçada, hoje. Uma mulher chegou oferecendo e eu era a única que calçava 35", conta dona Cláudia.
Banho de pipoca
A artista plástica Daniela Catarina de Sá, 40, nasceu no mesmo dia em que o santo é celebrado. Se tornou devota e, sempre que dá, faz questão de ir até a igreja agradecer por mais um ano de vida, sem se esquecer de tomar o banho de pipoca que, segundo ela, ajuda a enfrentar o que está por vir. "É como se fosse uma passagem para um ciclo, um agradecimento por mais um ano de vida", explica.
E os babalorixás chegaram cedo. Os primeiros já estavam com os tabuleiros armados às 4h, à espera dos fiéis. E o ato de banhar-se com a pipoca significa, para as religiões de matriz africana, mandar para longe tudo que é ruim. Os banhos mais simples são feitos apenas com as pipocas. Já os mais elaborados vêm acompanhados de uma benção com arruda, água de cheiro e pó de pemba, que é passado nas duas mãos e no pescoço.
O valor do banho é simbólico e pode custar aquela moedinha esquecida no bolso. Todo o dinheiro arrecadado durante a celebração vai para o Olubajé, festa realizada nos terreiros de canbomblé no dia 26 de agosto, em homenagem a Omolu.
E o sincretismo religioso causou surpresa no padre Cristóvão Przychocki, que há 12 anos chegou ao Brasil e há seis está à frente da Igreja de São Lázaro. "Tudo isso tem uma ligação muito forte com a história da Bahia e do Brasil. Uma história longa, muito bonita, mas de muita dor. Precisamos enxergar que atrás do rito se esconde algo muito mais profundo nas pessoas e na construção do país", pontua Przychocki.
As missas começaram às 9h desta quarta. São sete no total. Quatro pela manhã e três à tarde. A última, inclusive, acaba com uma procissão que leva a imagem de São Roque até o Largo do Campo Santo, às 18h. Depois de uma volta, a imagem retorna nos ombros dos fiéis para o altar, onde permanece até o próximo ano.
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Redação iBahia
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