"Eu estou em paz! Com toda essa situação, estou em paz porque eu sei que meu filho não corre mais risco aqui na terra", disse a mãe Marcelo Daniel Ferreira, de 19 anos. Ele foi baleado na véspera de Natal e enterrado nesta quinta-feira (29) no Cemitério Campo Santo, localizado no bairro da Federação, em Salvador.
A cerimônia contou com a presença de amigos, parentes e vizinhos do jovem. Em entrevista a TV Bahia, Ivani Ferreira - mãe de Marcelo - desabafou sobre o comportamento do filho e sobre a atuação da polícia.
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"Marcelo é amor, coração, amigo, gente boa. O pessoal dizia: Marcelo é brother. Meu filho sempre foi digno. Eu não ia imaginar que próximo a casa dele…A arma dele que ele tava na mão era o celular. 'Ah, teve operação': não teve operação nenhuma e se tivesse operação não é dessa forma que faz", desabafou Ivani.
Sobre a perda, ela complementou: "Eu sai do anonimato de uma maneira brutal porque foi a vida do meu filho. Eu não caio, porque estou segura em Cristo e eu sei que meu filho vive", pontuou.
O crime aconteceu no dia 24 de dezembro. Marcelo estava internado no Hospital Geral do Estado (HGE) e não resistiu aos ferimentos no dia 28 de dezembro.Amigos realizaram um protesto silencioso com cartazes no sepultamento (veja abaixo). Frases pedindo justiça foram escritos a mão.
Ainda na manhã, desta quinta-feira (29), o policiamento no Complexo do Nordeste de Amaralina foi reforçado. A medida foi tomada pela Polícia Militar, depois que familiares da vítima protestaram. Unidades territoriais e especializadas Comando de Policiamento Regional da Capital (CPRC) Atlântico da Polícia Militar ampliaram as ações nas entradas, saídas e finais de linha. Abordagens a carros, motocicletas, ônibus e pedestres são realizadas para evitar qualquer ação ilícita.
Protesto
Na quarta-feira (28), moradores do Nordeste de Amaralina fecharam um trecho da Rua Visconde de Itaborahy e outro da Avenida Amaralina, no bairro de Amaralina, em Salvador. A manifestação seguiu para a Lucaia, na entrada do Vale das Pedrinhas e foi encerrada por volta das 21h. O ato foi motivado pela ação de policiais militares no bairro e pela morte de Marcelo.
Objetos foram queimados e dois ônibus foram atravessados na Avenida Amaralina. Em nota, a PM informou que agentes da 40ª Companhia Independente (CIPM) estiveram no local e, após conversarem com os manifestantes e os bombeiros militares conseguirem apagar as chamas, a passagem de veículos foi parcialmente liberada durante a tarde.
Caso
Marcelo Daniel Ferreira Santos, de 19 anos, morreu no Hospital Geral do Estado (HGE) na madrugada da quarta-feira, 4 dias após dar entrada na unidade de saúde. Ele e Adeilton, de 34 anos, foram baleados durante uma operação policial na localidade conhecida como Capim, no Nordeste de Amaralina.
A situação aconteceu na noite de sábado (24), véspera de Natal. Segundo familiares das duas vítimas, os policiais militares que participaram da ação chegaram atirando. Adeilton também foi levado para o HGE. Ele segue recebendo cuidados médicos, ainda sem previsão de alta.
O pai de Adeilton, que tem o mesmo nome que ele, contou na terça-feira (27) que o filho foi baleado na perna e no braço, e que já havia passado por cerca de quatro cirurgias, mas teve uma hemorragia no braço e foi necessário colocar um pino para estancar o sangue. Já Marcelo Daniel tinha sido atingido no abdômen e chegou a passar por cirurgia, mas não resistiu.
Em entrevista à TV Bahia, a mãe de Marcelo contou na terça-feira (27) que o filho teria levantado as mãos, em sinal de rendição, mas teria sido atingido mesmo assim.
Segundo familiares das duas vítimas, os policiais militares que participaram da ação chegaram na localidade conhecida como Capim atirando. Em entrevista à TV Bahia, a mãe de Marcelo contou na terça-feira (27) que o filho teria levantado as mãos, em sinal de rendição, mas teria sido atingido mesmo assim.
“Meu filho não tem o hábito de correr de polícia. Meu filho tem o hábito de pegar uma chuteira, um meião e ir para o treinamento dele, porque ele é esportista”, explicou.
O pai de Adeilton também fez críticas à ação e contou que espera o secretário de Segurança Pública da Bahia, Ricardo Mandarino, melhore o treinamento dos policiais para que as situações não voltem a se repetir no bairro.
“O comando já entra na comunidade em pânico, eles [PMs] estão dando tiro na própria sombra. Qualquer movimento que o pessoal der, eles já querem atirar. Agora mesmo, eles fizeram uma ação covarde, praticamente ficaram em tocaia”, desabafou Adeilton.
Os familiares das vítimas estiveram na terça-feira na Corregedoria da Polícia Militar para registrar o caso. Procurada pelo iBahia na terça-feira, a PM respondeu nesta quarta afirmando que a instituição já iniciou um processo de investigação para apurar as circunstâncias da ocorrência.
A situação também é apurada pela Polícia Civil, que registrou o caso. Segundo a polícia, a investigação foi iniciada no domingo (25) pelo Serviço de Investigação de Local de Crime, e, com a morte de Marcelo, passará a ser apurado pelo Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP).
Além disso, conforme a polícia, policiais militares que participaram da ação no local serão ouvidos.
Família abalada
Os familiares e amigos de Marcelo Daniel estão desolados e revoltados com a situação. Em entrevista à TV Bahia nesta quarta-feira, o influenciador digital Matheus Guiglierme, que é irmão da vítima, fez um desabafo e pediu justiça.
“Meu irmão tinha 19 anos, sonhador, jogador de futebol. Todo mundo aqui da rua está de prova. Meu irmão não era envolvido. Ele estava simplesmente passando na rua onde mora. Nós moramos na comunidade, nós somos pretos. Não é porque somos pretos que nós não temos educação, que nós não temos estudos. Nós temos estudos sim. Nós temos conhecimentos. Nós não vamos nos calar. Isso não vai ficar assim. Meu irmão morreu inocente. Marcelo Daniel vai ter justiça”.
Ainda durante a entrevista, Matheus fez críticas às ações policiais no bairro e disse que a falta de iluminação favorece abordagem violentas.
“A rua não tem luz. Eles se aproveitam para chegar aqui da forma que quiserem, fazendo as coisas que quiserem. Se não tivesse meu pai e minha mãe aqui, meu irmão seria levado como indigente. Para eles agora acharem que a gente tem que se calar. Nós não vamos. Não vai ficar assim”.
Após a confirmação da morte feita pela família, o padre e reitor da Básilica do Senhor do Bonfim, Edson Menezes, comentou a situação e fez um apelo pelo fim da violência. O depoimento foi dado também durante entrevista à TV Bahia.
“É preciso que parem de matar, sobretudo negros da periferia. É preciso parar de matar. É preciso um outro tipo de abordagem. É preciso ouvir cada pessoa. É preciso reconhecer que cada pessoa precisa ser respeitada. Isto é, a sua dignidade. Nós precisamos de paz e de justiça”.
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Redação iBahia
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