O primeiro dia do julgamento da médica Kátia Vargas Leal Pereira teve vários momentos de tensão, mas um dos principais alvoroços aconteceu durante o depoimento do perito Alberi Espindula, que tentou desqualificar o relatório feito por peritos do Departamento de Polícia Técnica (DPT), órgão subordinado à Polícia Civil baiana. A tensão aumentou ainda mais depois que ele afirmou que foi contratado pela defesa.
A declaração provocou um burburinho na plateia, e deixou o promotor Davi Gallo, e o advogado assistente de acusação, Daniel Keller, possessos. A promotoria argumentou que, como Alberi era perito, não poderia ser ouvido como testemunha, mas como técnico, e que o fato dele ter sido contratado significava que o depoimento dele não seria imparcial.
A juíza Gelzi Maria Almeida Souza argumentou que o fato do perito ter sido contratado pela defesa não poderia induzir à parcialidade porque em processo penal qualquer pessoa pode ser testemunha, inclusive parentes da vítima que são ouvidas sob compromisso. As exceções previstas no artigo 206 do Código de Processo Penal inclui apenas os parentes do acusado.
O depoimento seguiu, mas aconteceram outros embates entre o promotor e o perito, e a juíza precisou suspender a sessão por cinco minutos para conversar com a acusação e a defesa. A sessão foi retomada após esse tempo, mas as trocas de farpas seguiram até o final do depoimento.
Kátia Vargas está sendo acusada de provocar um acidente de trânsito ao arremeçar o carro que dirigia contra a motocicleta em que estavam os irmãos Emanuel e Eamnuelle Gomes, à época com 21 e 23 anos de idade, respectivamente. O acidente aconteceu em outubro de 2013 e resultou na morte dos dois.
Comentários
Depois que a sessão foi encerrada, a defesa e a acusação comentaram o caso. O advogado José Luis Oliveira Lima, que representa Kátia Vargas, negou que o depoimento de Alberi tenha gerado agitação no plenário. "Não foi o perito criminal que causou alvoroço", disse. Ele também disse que a sustentação foi bem feita.
"A prova pericial, os vídeos, as fotografias que nós juntamos, e os depoimentos detalhados, deixaram claro que as versões que foram apresentadas pelas testemunhas não ficam em pé", argumentou o advogado de defesa da médica.
Para o promotor Davi Gallo, o perito Alberi Espindula se contradisse, desqualificou o trabalho de uma equipe de peritos baianos e foi infeliz nas declarações. "O depoimento do perito foi altamente contraditório. Ele foi muito infeliz nas declarações dele, sobretudo em se tratando de um Departamento de Polícia Técnica como o nosso, que é um dos melhores do país, ou seja, esse processo deve ter um dos laudos mais bem elaborados do que eu já vi em toda a minha vida profissional. Foi muito chato e deselegante ele tratar e desqualificar o laudo dos colegas dele, na Bahia", considerou.
Já Daniel Keller disse que o depoimento de Alberi está contaminado. Ele acredita que o fato de o perito ter admitido que foi contratado pela defesa prova que o caso não foi analisado por ele de maneira imparcial. "Foi ouvido um assistente técnico, contratado por ela, pago por ela, que apresentou aqui algumas conclusões baseadas em um parecer feito por outro assistente técnico contratado por ela", comentou Keller.
"Qualquer pessoa leiga consegue entender que um assistente técnico contratado pela parte é uma pessoa extremamente parcial, até porque ele mesmo declarou em plenário que ela pagou os honorários dele", completou ele.
Ver vídeo abaixo:
Confira também parte do embate entre a promotoria e o perito contratado pela defesa:
Luciano Assis x Alberi Espindula
O representante do MP-BA questiona se o perito conhece os outros peritos que assinaram os laudos da ação.
Promotor: A que o senhor atribui tantos erros de tantos peritos? Foram seis.
Perito: Não vou entrar no mérito do porquê erraram. Mas que erraram, erraram. Infelizmente, se valeram de erros cometidos no exame do local para justificar demandas.
Sobre a marca de tinta de capacete encontrada no carro da ré.
Promotor: Qual cor do capacete de Emanuel?
Perito: Cor de capacete vermelha.
Promotor: Qual é a cor da marca em cima do vidro direito?
Perito: Vermelha.
Promotor: Tem como explicar a coincidência?
Perito: O capacete era vermelho e preto. Não tem marca azul do capacete de Emanuelle.
Promotor: Tecnicamente, tem como explicar como a mancha parou aqui?
Perito: Não tem como atestar que é do capacete.
(...)
Promotor: O senhor sabe dizer se lá no Ondina Apart Hotel, onde Kátia adentrou no hotel passando pela grade, tinha alguma coisa que fosse vermelho? Porque a do risco o senhor falou que era a grade [que separa o estacionamento do local do passeio onde o carro bateu e onde os corpos dos irmãos foram encontrados].
Perito: Pelo que os peritos falaram, não.
Promotor: Confiro novamente que o capacete é vermelho e a marca do carro também.
Perito: Não quer dizer nada.
Promotor: Para o senhor, não quer dizer nada.
Perito: A mancha poderia estar no carro anteriormente.
Burburinho no tribunal. A todo momento, familiares das vítimas balançavam a cabeça, em sinal negativo, enquanto o perito tentava desqualificar o laudo pericial.
***
A defesa afirmou que apenas uma testemunha viu a colisão. O promotor Davi Gallo interferiu e disse que, na verdade, foram cinco. O perito diz que, se a colisão entre o carro e a moto tivesse acontecido, eles iam cair antes, e a morte não iria acontecer.
Promotor Davi Gallo x Perito Alberi Espindula
Promotor: O senhor pode nos afirmar categoricamente que não houve choque?
Perito: Não houve.
Promotor: Tem material suficiente pra isso ser dito?
Perito: Não teve.
Promotor: A pergunta foi se é suficiente.
Perito: Eu estou comentando o caso.
Promotor: O senhor atribui isso a uma alucinação coletiva naquele dia?
Perito: Óbvio que não foi uma alucinação coletiva. [A defesa afirma que uma testemunha viu a colisão. O promotor diz que foram cinco].
Promotor: A perícia é falsa?
Perito: Esse colega, infelizmente, errou [são seis peritos]. Todos nós estamos sujeitos a errar. Posso afirmar em todas as letras que eles [seis] erraram aqui [na conclusão da perícia].
Promotor: O senhor é contratado pela Kátia. Ela disse o que fazia nesse dia?
Perito: Não conheço. Sou contratado pela defesa.
Promotor: O senhor sabe que uma das vítimas teve a cabeça decepada?
Perito: Sim, isso ocorreu contra o poste.
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