Jogar videogame é um dos passatempos preferidos de crianças e adolescentes, mas o hábito pode provocar danos ao cérebro. Essa é a conclusão de um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Montreal, publicado nesta terça-feira na revista “Molecular Psychiatry”, que aponta que jogadores habituais de títulos de ação têm menos massa cinzenta no hipocampo. E quanto maior for a depleção dessa região cerebral, maiores os riscos para o desenvolvimento de doenças, como depressão esquizofrenia e Alzheimer.
— Os videogames têm demonstrado benefícios para determinados sistemas cognitivos no cérebro, principalmente relacionados com a atenção visual e a memória de curto prazo. Mas também existem evidências comportamentais de que pode haver um custo para isso, em termos de impacto ao hipocampo — explica Greg West, professor de psicologia na Universidade Montreal e autor do estudo, ao lado de Véronique Bohbot, da Universidade McGill. — É por isso que decidimos fazer um escaneamento completo do cérebro de jogadores habituais de jogos de ação, e o que vimos foi menos massa cinzenta no hipocampo. Nós acompanhamos dois estudos longitudinais para estabelecer a causalidade, e encontramos que foram realmente os videogames que provocaram mudanças no cérebro.
O hipocampo é uma região no cérebro que atua na orientação espacial das pessoas e na conversão de memória de curto prazo em memória de longo prazo. Motoristas de táxi, por exemplo, normalmente possuem o hipocampo mais desenvolvido. E quanto mais massa cinzenta, melhor a saúde do cérebro. Mas existe uma outra estrutura, o corpo estriado, que contrabalanceia o hipocampo. Ele possui uma área conhecida como núcleo caudado, que age como um “piloto automático” e no “sistema de recompensas”, que nos ajuda a formar hábitos, como ir de casa para o trabalho, e a decidir quando precisamos nos alimentar.
Estudos anteriores demonstraram que jogar videogames estimula o desenvolvimento do núcleo caudado, e cerca de 85% dos jogadores confiam nesta parte do cérebro para navegar dentro dos jogos. O problema é que, quanto maior for o uso do núcleo caudado, menor o uso do hipocampo, que resulta numa atrofia desta importante estrutura cerebral.
“Se os jogos de ação levam a um decréscimo da massa cinzenta no hipocampo, deve-se ter cuidado ao estimular seu uso por crianças, jovens adultos e idosos para promover habilidades cognitivas, como memória visual de curto prazo e atenção visual”, diz o estudo.
Uso de jogos no tratamento de doenças
Os pesquisadores chamam atenção para o crescente uso dos jogos eletrônicos no tratamento de desordens, como a indicação para a prevenção da demência. Mas isso não significa que os videogames devam ser banidos, apenas que tipos específicos devem ser balanceados e não recomendados para os pacientes. Especificamente, pessoa com Parkinson, Alzheimer, esquizofrenia, depressão ou estresse pós-traumático devem evitar jogos de ação, já que eles possuem menos massa cinzenta no hipocampo.
Para realizar a pesquisa, os cientistas recrutaram 97 voluntários, sendo 51 homens e 46 mulheres, para jogar títulos populares de tiro em primeira pessoa, como “Call of Duty“, “Killzone” e “Borderlands”, assim como jogos 3D, da série “Super Mario”. Os participantes jogaram por um período de 90 horas. Antes disso, os jogadores foram classificados em dois grupo: os que usam o aprendizado espacial, e favorecem o hipocampo; e os aprendizes por resposta, que navegam pelo sistema de recompensa e favorecem o núcleo caudado.
Num jogo de labirinto criado especificamente para o experimento, as pessoas que usam a navegação espacial se orientam por marcos no ambiente, como rochas, montanhas e árvores. Os que usam o sistema de recompensa ignoram esses marcos e se concentram em lembrar o caminho percorrido num sequência desde o ponto de partida.
— Os jogadores de títulos de ação são duas vezes mais propensos a serem categorizados como aprendizes por resposta em relação a pessoas que não jogam videogames — afirma Véronique. — Isso é muito importante quando você sabe quão importante é o hipocampo para a cognição saudável.
Após determinada a estratégia de aprendizado de cada participante, eles começaram a jogar. Após 90 horas de jogos de ação, os participantes que usam o sistema de recompensa tiveram uma atrofia no hipocampo, enquanto 90 horas de jogos 3D levaram a um aumento na massa cinzenta do hipocampo em todos os participantes. De acordo com o estudo, as necessidade de estratégias espaciais está associada com aumento da matéria cinzenta no hipocampo.
— O mesmo tempo de jogo num game de tiro em primeira pessoa leva à atrofia no hipocampo. Isso sugere que jogos de plataforma tridimensional são mais seguros para o consumo e podem oferecer benefício para o cérebro de todos os jogadores — sugere West.
Andrew Przybylski, professor da Universidade de Oxford, alerta que o estudo não deve ser interpretado como uma evidência de que jogar videogames de ação provoca danos ao cérebro, e critica a metodologia adotada pelos colegas.
— O estudo não tem poder estatístico necessário para demonstrar um efeito confiável — critica Przybylski. — Isso significa que resultados reais são improváveis de serem encontrados. Extrapolar de estudos de pequena escala como esse é extremamente problemático.
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Redação iBahia
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