A Bahia registrou, entre janeiro e o início de junho de 2024, dez mortes e 65 casos de leptospirose, doença transmitida através do contato com água ou lama contaminadas em locais com a presença de ratos. Com recordes de chuvas e alagamentos em decorrência do tempo chuvoso, a população está cada vez mais exposta à doença.
Diante da chegada do inverno, um dos períodos mais chuvosos do ano, o alerta para os perigos da leptospirose se intensificam. Segundo Gabriela de Toledo, engenheira sanitarista e ambiental e mestre em meio ambiente e saneamento pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), os casos da doença, o acesso ao saneamento básico e a estrutura de escoamento das cidades são fatores relacionados.
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"Todo território que passa a ter maior a densidade urbana, com uso e ocupação dos solos totalmente alterados e impermeabilizados, com a combinação: ocupação urbana que remove funções ecológicas dos territórios, desigualdade social, déficit de acesso a serviços públicos de saneamento básico e emergências climáticas, afeta completamente a saúde da população", explica a especialista
O saneamento básico é um direito assegurado na Constituição Federal e envolve cinco fatores: abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta de resíduos sólidos e drenagem. Conforme dados do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase metade da população da Bahia (47,8%) não tem acesso à rede de esgoto. Ainda segundo órgão, 32% da população do estado possui fossas rudimentares ou buracos como formas de esgotamento sanitário.
Ambos os dados elucidam as dificuldades estruturais que o estado ainda enfrenta e que podem ser um ambiente propício para a transmissão da leptospirose. Pelo menos 12 municípios da Bahia registraram mortes pela doença, são eles:
- Salvador;
- Canavieiras;
- Coaraci;
- Cotegipe;
- Feira de Santana;
- Ilhéus;
- Itabuna;
- Itajuípe;
- Jequié;
- Santo Antônio de Jesus;
- Simões Filho;
- Valença.
Salvador, enquanto a maior cidade da Bahia, registrou mais de 40 casos da doença. Se comparados a 2023, o número de casos de leptospirose diminuíram, mas as novas configurações climáticas podem ser um agravante.
Em fevereiro, a cidade registrou índices históricos de chuva ultrapassando três vezes a média esperada para o mês. Já em abril, a capital baiana bateu o recorde pluviométrico para o mês nos últimos 30 anos.
Com as mudanças climáticas, os fenômenos meteorológicos têm se tornado mais intensos, como foi o caso das recentes enchentes no estado do Rio Grande do Sul (RS). Nesse contexto, as desigualdades históricas que agravam os problemas voltados ao saneamento aumentam e a população fica ainda mais vulnerável.
Zonas periféricas enfrentam problemas para evitar proliferação dos vetores da leptospirose
Ainda segundo Gabriela de Toledo, as zonas periféricas e periurbanas, onde há uma menor cobertura do saneamento básico, enfrentam dificuldades para evitar a proliferação de vetores de doenças como a leptospirose (como ratos, baratas, mosquitos, entre outros).
"[Na] periferia de Salvador, a combinação de impermeabilização do solo da bacia de escoamento das águas, a ocupação de Áreas de Preservação Permanente (APP), e a falta de saneamento básico, nesse caso prioritariamente a coleta de resíduos sólidos e o tratamento dos esgotos, levam a um resultado extremamente danoso a saúde, pois a falta de esgoto e coleta de resíduos colaboram na proliferação de vetores", explica a engenheira.
"Quando somados a enchente ou alagamento, [esses fatores] se tornam um caldeirão de doenças, pois tudo se mistura da água e quem passar por ela poderá ser acometido por alguma doença", afirma Gabriela.
As soluções diante deste cenário, historicamente construído e cristalizado pela desigualdade, são poucas a curto prazo. Encontrar alternativas para as pessoas que moram nas regiões de periferia e focar em soluções ecológicas e ligadas a povos tradicionais podem ser alternativas.
"Precisamos repensar nossa maneira de produzir soluções e tecnologias, elas precisam incorporar a biodiversidade e as funções ecológicas. Necessitamos apostar nas soluções baseadas na natureza, nas infraestruturas verdes, na valorização dos modos de viver dos povos agarrados à terra e ainda avançar na diminuição da desigualdade", pontua a especialista.
Sintomas e como prevenir a leptospirose
Segundo o Ministério da Saúde, a leptospirose é uma doença infecciosa febril transmitida através do contato com água contaminada ou por meio de mucosas. A pessoa pode começar a sentir sintomas da doença em um período de 1 a 30 dias.
Com um alto índice de letalidade, manifestando casos graves em 40% dos casos, a pessoa infectada pode ter febre, falta de apetite, dor muscular, dor de cabeça, náuseas e vômitos. Além disso, o paciente pode ter diarreia, dor nas articulações, vermelhidão ou hemorragia conjuntival, fotofobia, dor ocular e tosse.
Como está ligada às condições de infraestrutura do ambiente, as formas de prevenção da leptospirose incluem não ter contato com a água contaminada. Logo, para evitar a doença as pessoas devem:
- Evitar o contato com água ou lama de enchentes e impedir que crianças nadem ou brinquem nessas águas;
- Cuidados com a água para consumo e buscar garantir que a água é potável, filtrada, fervida ou clorada;
- Para controle dos ratos, que são vetores da doença, a recomendação é o descarte adequado do lixo, armazenamento adequado dos alimentos, desinfecção e vedação de caixas d'água;
- Usar botas e luvas de proteção no caso de pessoas que trabalham na limpeza de lama, entulhos e desentupimento de esgoto.
Iamany Santos
Iamany Santos
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