As mudanças no clima na Bahia tem afetado diretamente a vida de baianos que moram na 1ª região árida do Brasil. Localizada no norte do estado e com quase 6 quilômetros quadrados, a área foi identificada pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em novembro de 2023. Ela é resultado dos impactos das mudanças climáticas.
A cidade de Chorrochó é uma das localizadas nessa área e a vida do produtor rural Maciel Ferreira, de 28 anos, mudou completamente. Em 2023, ele conta que o clima ficou mais quente, com menos chuvas e as produções de milho, feijao e melancia quase não deram frutos. Além disso, a alimentação dos animais também ficou prejudicada.
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"Ano passado, esquentou bastante e, praticamente, não choveu. A produção não deu para nada e os preços de muitas coisas aumentaram. O saco de milho, por exemplo, era R$ 40 e agora é vendido por R$ 110. Por isso, usamos a palma para alimentar os animais.", relata Maciel, em entrevista ao g1.
O produtor rural também cria cerca de 80 bodes e 40 ovelhas em sua propriedade, que fica no distrito de Cajaíbas. As dificuldades não se limitam a produção dos alimentos, uma vez que o desabastecimento de água é também uma dificuldade enfrentada por Maciel e os vizinhos.
Ainda conforme o relato do produtor, ele paga cerca de R$ 200 para receber água em casa através de carros-pipa. A água é colocada em uma cisterna, que fica no quintal do imóvel, e chega a durar três meses.
Em nota, a prefeitura de Chorrochó afirma que abastece a zona rural usando caminhões-pipa. Entretanto, a medida não é suficiente e muitos produtores rurais precisam pagar por abastecimentos extras.
Essas dificuldades podem ser sentidas em outras cidades da região, como é o caso de Macururé, cidade a 39 quilômetros de Chorrochó. Além do clima árido, as duas cidades integram a lista de locais em situação de emergência devido à estiagem. São mais de 160 municípios foram incluídos no compilado em dezembro de 2023.
Ao g1, a agricultora e pecuarista Maria Fátima Silva, de 54 anos, relatou que as dificuldades na zona rural de Macuraré se intensificaram e 2022, quando o clima ficou ainda mais quente.
No local onde Maria vive, há um poço que bombeia água par dentro de casa. Porém, muitos vizinhos vivem uma outra realidade e não possuem água encanada nos imóveis. Por isso, a alternativa para muitos deles são os carros-pipa, como acontece em Chorrochó.
A situação fica ainda mais difícil devido a criação de animais, cuja alimentação também ficou mais cara.
“É muito difícil arranjar alimento para os animais e gastamos muito mais, porque temos que comprar rações. O ideal seria ter um reservatório, algum tipo de preparação para épocas de estiagem”, diz.
Ainda neste mês, o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, afirmou durante a Lavagem do Bonfim que fará uma caravana de apoio aos municípios em situação de emergência. O Governo do Estado ainda não ofereceu detalhes de como e quando essa ação irá acontecer.
Clima árido
O estudo, feito por pesquisadores do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), revela também que regiões semiáridas têm crescido, em média, 75 mil km² a cada década. Os especiaistas afirmam que isso é resultado da elevação das temperaturas, potencializada pelas mudanças climáticas.
A aridez é calculada através da razão entre a precipitação (chuva) e a demanda de evaporação da atmosfera (evapotranspiração). Caso o índice seja menor do que 1, isso significa que chove menos do que é demandado pela atmosfera.
Dependendo da taxa de estiagem, a área pode ser classificada como árida (inferior a 0,2), semiárida (inferior a 0,5) e sub úmida seca (menos de 0,65). O estudo da Cemaden e Inpe usou dados diários de precipitação, temperatura máxima e mínima, radiação solar, velocidade do vento e umidade de 1961 até 2020.
Para levantar as informações, foram utilizados bancos de dados da Nacional de Águas (ANA) e do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Além disso, para evitar distorções por mudanças em anos pontuais, o estudo comparou os dados em blocos de 30 anos para a pesquisa (1960 a 1990, 1970 a 2000, 1980 a 2010 e 1990 a 2020).
Segundo a nota técnica, onde os resultados foram revelados, o indicador de aridez ajuda a identificar "regiões com variável déficit de água disponível, condição que pode afetar severamente o uso efetivo da terra para atividades como agricultura ou pecuária e que no longo prazo podem levar a desertificação”.
A pesquisa observou apenas variáveis climáticas, por isso, só é possível afirmar que o avanço da aridez torna essas regiões mais suscetíveis à desertificação, mas não necessariamente que sejam um produto dela.
“O principal fator que tem influenciado isso (expansão da aridez) é o aumento da temperatura. É o processo de aquecimento global”, diz Javier Tomasella, pesquisador do Inpe e um dos nomes que assinam a nota técnica, ao Estadão.
Iamany Santos
Iamany Santos
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