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Entre o costume e a opressão: Nome e Sobrenome

Jogadores de futebol também possuem seu espaço. Personagens de telenovelas e de músicas quando inseridos nas graças do povo são imediatamente multiplicados

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01/12/2013 às 19:46 • Atualizada em 28/08/2022 às 19:31 - há XX semanas
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Há lugares que é comum encontrar muitos xarás. Houve uma época que Maria José era a escolha preferida de várias mães. Parece que a era dos nomes de santos está findando. Há tempos que os santos têm sido substituídos por artistas midiáticos, principalmente estrangeiros, preferencial em inglês. Jogadores de futebol também possuem seu espaço. Personagens de telenovelas e de músicas quando inseridos nas graças do povo são imediatamente multiplicados. Lembro-me de um rock cantado pela banda “Nenhum de Nós” com o refrão “Camila, Camila”. Recordo-me de algumas conhecidas com este nome: uma prima (meio irmã, meio sobrinha), uma ex-aluna do curso de Letras e outra da época do ensino básico em Vera Cruz. Tomei o cuidado de escolher nome de mulher para evitar acusações de uma provável exclusão. O problema é que também ainda corro o risco de ter sido excessivamente libidinoso citando só mulheres. Em relação à Camila de minha família isso certamente não entrou nas cabeças dos leitores, afinal ela costumeiramente pede-me a bênção. As moças citadas são desconhecidas umas das outras, até hoje, a não ser que por algum milagre das redes sociais elas já tenha se comunicado. Mas se elas morassem todas em uma mesma localidade, desacostumada a exigir os sobrenomes das pessoas? Convenhamos, é muito chato perguntar ao vizinho “qual o seu sobrenome?”. Isso acontece com maior frequência em apresentações formais ou até semiformais como é o caso de uma sala de aula com alunos xarás, mas exigir que conhecidos desde a infância ou amigos se cumprimentem com os sobrenomes, acho desnecessário. Por isso reinventamos as possibilidades de identificações a partir dos nomes dos pais, mães, maridos, esposas e até de atividades desenvolvidas ou de localizações geográficas, dentre outros. Voltando às Camilas, suponhamos que todas convivessem o mesmo cotidiano. Como enviar um recado para Camila sem confundir o pombo correio, sem confundi-las ou ainda sem confundir as anotações na agenda eletrônica sem sobrenomes? Por onde convivi e convivo não existiria constrangimentos em adicionar aos seus nomes os nomes de seus companheiros, como, por exemplo, Camila de Miquilino. Na possibilidade de haver mais de um Miquilino naquela localidade procurar-se-ia outra referencia. O mesmo acontece com os homens. Em Jiribatuba, ilha de Itaparica, os Amaros eram identificados por suas esposas, portanto após o nome do homem vinha o da esposa para identifica-lo com o seu pertencimento. Cada Amaro com sua esposa e a ela pertencendo. Como também poderia ser o inverso, cada Maria com seu Amaro. Com tantas coincidências seriam acrescentados outros identificadores, podendo ser um feito digno de admiração, rejeição, espanto. Vale lembrar a multiplicidade dos sentidos de pertencimento: desde o carinho mútuo até a opressão. Contudo, o que percebo é que há um equivoco ao tentarem atribuir, sempre, intenções de diminuição da mulher quando estas são identificadas pelos nomes de seus esposos. Devem-se observar essas variantes que citei para não confundir as pessoas com mesmo nome. É preciso também não esquecer que em algumas comunidades tradicionais a pronuncia do nome completo é sempre um grau de formalidade dispensado entre conhecidos e até gerador de desconfianças. Lembremos que mulheres com notabilidade identificam os maridos: a exemplo de presidentas, professoras, artistas, cozinheiras e parteiras. Então teríamos Miquilino de Camila Parteira. Em algumas situações informar o nome completo seria como expor o CPF em uma rede social ou um pedido de afastamento e fim das relações de amizade. A exposição do sobrenome às vezes pode conotar uma expressão de distinção ou de poder, necessária ou desnecessária. O bom é medir tudo com a balança da diversidade e do cuidado sem deixar de ser feliz com amarras de si mesmo. Por conta de um cuidado não podemos nos transformar em geladeiras de carne e de osso, isso seria um descuido. Eu me chamo Gildeci, às vezes de Filismina; de Gilson e Araci, sempre de Xangô com Ogum. *Gildeci de Oliveira Leite é professor de Literatura da UNEB, Doutorando em Difusão do Conhecimento pela UFBA e Mestre em Literatura pela mesma instituição. Escritor com publicações de crítica literária além de Crônicas e outras narrativas. Dentre os principais aspectos de sua pesquisa destaca-se o estudo da obra de Jorge Amado.

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