Além de nascer na Bahia, um destaque especial por trás do samba é a figura feminina. Mulheres que resistiram às opressões culturais no período pós-abolição, que saíram do interior baiano levando as raízes afro culturais para o Rio de Janeiro. O ritmo, a melodia e o canto do samba surgiram em festas nas casas dessas mulheres, conhecidas na história como tias baianas.
A que se tem mais registro, entre elas, é Hilária Batista de Almeida, conhecida como Tia Ciata. Nascida em Santo Amaro, no Recôncavo, ela chegou no Rio com 22 anos e manteve os costumes de mãe de santo, ficando conhecida pelas festas que realizava aos Orixás, como São Cosme e Damião e Nossa Senhora da Conceição, onde destacava as habilidades do samba "miudinho" e de partideira, nas rodas de partido-alto.
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A fama e respeito de Tia Ciata foram conquistados após curar uma ferida do então presitende Venceslau Brás, que resistia a todos os tratamentos indicados pelos médicos. O compositor e conterrâneo de Ciata, Roberto Mendes, destaca a importância deste feito para que o samba se concretizasse.
"Tinha tudo na casa dela, era o choro na frente, o batuque no fundo, uma festa danada. Ela foi muito importante nessa história do samba, porque depois de curar o presidente, ninguém mexia com ela. Era a mãe de santo que curou o presidente".
Como ela tinha maior liberdade para as festas, Tia Ciata foi uma peça central na formação do samba, recebendo em sua casa nomes que se tornariam famosos com as primeiras gravações na categoria do gênero musical, como Donga e João da Baiana.
Mulheres ocultadas na história do samba
"Se pensar no histórico, Tia Ciata e várias outras, recebiam as festas em casa, inclusive levaram o samba para o Rio de Janeiro, e essas mulheres nem sequer eram citadas nesse samba como compositoras e elas eram compositoras de muitos", afirma a cantora e compositora Ju Moraes.
A primeira canção registrada na categoria samba foi "Pelo Telefone" (1916), assinada apenas por Donga, um dos frequentadores da casa de Tia Ciata. Porém, os sambas da época eram criados de forma coletiva ao longo das festas, com melodias e cantos improvisados, por isso pesquisadores e historiadores do gênero acreditam que as tias baianas foram autoras indiretas de músicas que não foram creditadas a elas.
Além de Tia Ciata, diversas outras mulheres se reuniam com festejos para manter a herança cultural viva. Entre os nomes que se destacaram na história estão também:
Amélia da Costa Cardoso (Tia Amélia)
Tia Perciliana Maria da Silva
Mônica Baptista dos Santos (Tia Mônica)
Maria Bebiana do Espírito Santo (Tia Bebiana)
Elas resistiram às repressões culturais e preservaram o samba como manifestação cultural em suas casas, fortalecendo para que se tornasse um símbolo da identidade afro-brasileira.
Ala das Baianas
"Ora se o samba é carioca, porque que as escolas de samba ainda hoje no terceiro milênio conservam a participação da ala das baianas no grande desfile do Rio de Janeiro das escolas de samba e no sambas enredo?", provoca o historiador e radialista Perfilino Neto.
As escolas de samba são destaque no Rio de Janeiro e no mundo quando se fala no gênero musical e ainda hoje existe uma regra no desfile para a "Ala das Baianas". Toda escola desfila com mulheres, que geralmente fazem parte da velha guarda do grupo, vestidas com saias rodadas que podem variar de acordo com o tema da fantasia.
Apesar de não contar pontos individuais para a escola, essa ala é importante no quesito fantasia e é obrigatório conter no mínimo 70 componentes, segundo o regulamento da Liga das Escolas de Samba.
Na história do samba, isso é uma forma de reconhecimento à origem baiana, valorizando as tias baianas, que foram fundamentais na preservação das tradições afro-brasileiras e para a criação do gênero musical, através de manifestações culturais em suas casas.