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Nininho, garoto apaixonado por futebol. Bacuri mimado fanático pelo Sport Club Tororó, clube presidido por seu pai, o famoso Ninho. Não importa quantas vezes o time precise jogar a seletiva do intermunicipal, o clã diminuto jamais arreda o pé e promete fazer a turma do Tororó vibrar um dia. "Nosso time vai ser grande", promete o presida. Assim como seu coroa, Nininho também sempre se ligou nas artimanhas da gestão peladeira. Nunca foram bons de bola, razão que explica porque o interesse pela redonda surgiu de outra forma. Tal pai, tal filho, como deve ser. Enquanto Ninho tomava conta das coisas sérias e se preocupava com os novos uniformes da sua equipe para o próximo duelo interbairros, Nininho treinava a gestão esportiva em casa, jogando o famoso Championship Manager, CM para os íntimos. No computador, ele simulava treinar clubes, mas tinha obrigações administrativas, como contratar e manter os cofres equilibrados. Nininho era fera. No game, criou o homônimo Sport Club Tororó, desbravou o certame baiano à frente do computador, todas as séries do Campeonato Brasileiro e um dia chegou ao título mundial, batendo o Bayern de Munique na final. Que emoção! Nininho nunca havia sentido tal alegria. Só o CM seria capaz de proporcionar algo assim. Elifoot e Brasfoot, jogos que oferecem perspectiva semelhante, jamais o deixaram tão êxtasiado. Nininho sentia-se cada vez mais preparado para, um dia, assumir o posto de papai. Sonhava contratar "Fisgada", "Migué" e "Contusão", trio de sucesso no seu Tororó do game de computador, para o verdadeiro clube. O tempo passou e os sonhos de Nininho, garoto sortudo, tinham tudo para se realizar. Ao completar 15 anos de idade, ganhou de painho o Tororó. Ninho já não aguentava mais gerir o falido clube e chegara a hora de Nininho tomar as rédeas da situação. Sua experiência nos games da vida o credenciavam ao trabalho. O Tororó, finalmente, teria chance de chegar onde merecia. Mas a vida é dura, pelo menos para quem é mole. Joguinhos não servem de parâmetro para vida real e Nininho descobriria isso da pior maneira possível. O começo parecia promissor. "Fisgada", "Migué" e "Contusão" chegaram com status de estrelas no clube e foram apresentados a fervorosa torcida tororoense, que era pequena, mas fanática pelo time amarelo grená. Nininho conseguia repetir o início da gestão do Tororó no CM. Seria um dia campeão do mundo? Difícil dizer. Com o tempo, os resultados não vieram. Nada mudara desde a mudança de comando e a pressão só aumentava. Todos queriam Nininho fora. A hashtag #ForaNininho entrou para os Trending Topics do Twitter no bairro do Tororó. O povo sabia o que queria e Nininho pegava ar a cada menção nas redes sociais. Fora de controle, passou a ofender todo mundo, causando desconforto em demasia. Chegou o dia em que Nininho, com sua maturidade adolescente, decidiu mudar o rumo das coisas e, como num lance de genialidade, vendeu a torcida. Feito esse sequer permitido em games para computador, que ele mesmo inventou. O orgulho do painho Ninho. Acabaram as pressões, as cobranças, menos as derrotas. Nininho, apaixonado pelo futebol, esquecera o que era torcer. Não amava mais, só odiava. Nininho esqueceu tudo o que um dia sonhou. Esqueceu a bola, o esporte, a fé das pessoas. Nesse tempo de tantas mudanças em sua vida, só não esqueceu de passar gel no cabelo.
*Hailton Andrade é jornalista, repórter de esporte do iBahia, poeta amador e futuro músico. Escreve contos e crônicas para o portal a cada 15 dias.