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Fafá continua jogando, mas não profissionalmente |
Quem acompanhou os estaduais da Bahia dos anos 90 até o início dos anos 2000 deve se lembrar de José Mário Borges Cruz. Ou melhor, Fafá. O atacante grandalhão chamava a atenção pela forma física "avantajada", mas também pelos gols. Goleador nato, passou por diversas equipes do interior baiano, além de ter atuado em outros estados. Em 16 anos de carreira, se destacou no Poções, no Cruzeiro de Cruz das Almas e no Camaçari. Longe de casa, defendeu o Mogi Mirim e também o Asa de Arapiraca, entre outros clubes. Natural de Belmonte, extremo sul da Bahia. Fafá hoje está com 43 anos e mora com a família na sua cidade natal. Ostentando 1,91m de altura e pesando 122kg atualmente, o artilheiro do Baianão 2002 garante: "ainda faço meus gols". Em uma conversa descontraída com o
iBahia Esportes, Fafá falou sobre a carreira, deu pitacos sobre Bahia e Vitória e elogiou o "gordinho" Walter, um dos destaques do Campeonato Brasileiro. "Está colocando todo mundo no bolso", elogia, admitindo a identificação com o atacante do Goiás.
O que você faz atualmente? Fui secretário de esporte na gestão passada de Belmonte, do prefeito Iêdo Elias. Agora este ano já é um colega meu que está sendo secretário. Tenho uma boate lá, Amendoeira Show. A boate tem shows ao vivo. Hoje a moda é arrocha. Lá toca de tudo. Agora mesmo estou levando Polentinha, que é o sucesso aí da Bahia. Levamos alguns músicos da região. É arrocha, seresta. Axezinho de vez em quando, mas rola menos para não dar confusão. A casa é a Amendoeira Show. Até coloquei na placa lá: 'De cara com Fafá' (risos). Na cidade todo mundo já conhece. E trabalho com minha mãe em um restaurante. Na verdade, bar, restaurante e açougue.
Você ainda joga futebol? Não paro, não. Nos campeonatozinhos eu ainda brinco. Não corro muito, mas faço uns gols (risos). Faz pouco tempo fui artilheiro em um campeonato de Barrolândia, marquei 17 gols. Parei em 2011. Além disso, o time da cidade foi campeão da Copa do Descobrimento, a Seleção de Belmonte, eu era o treinador. Tive até uma proposta de Eunápolis, mas preferi não sair de casa, porque não dava para coincidir com as coisas que eu estava fazendo. Preferi ficar, mas sempre estou nos campeonatos amadores, veteranos, no campeonato municipal.
Você sempre teve o porte físico avantajado? Foi no decorrer da carreira. Fui ganhando peso, ficando mais fortinho, mais gordinho. Cheguei no Ipanema, um dos últimos times que joguei em Alagoas, chegando lá os caras falavam: 'vixe, esse cara é carregador de saco'. Na estreia eu fiz dois gols contra o Murici e aí o pessoal disse: 'ih, o homem faz gol mesmo'. Graças a Deus foram sempre assim minhas passagens. As pessoas às vezes criticavam por causa do peso, mas a gente compensava fazendo gols e dando alegria aos torcedor. Graças a Deus, em todo lugar que eu fui fiz muitas amizades, sempre fui um cara correto, nunca fui de faltar treino, sempre a gente saía. Todo jogador vai para noitada, às vezes no outro dia tem treino, mas eu sempre fui, nunca faltei.
O peso mais te ajudou ou atrapalhou? Às vezes ajudava, às vezes atrapalhava. Quando pegava um time mais rápido, tinha um pouco de dificuldade. Mas superava, porque ao longo da carreira você vai aprendendo a conviver com isso. Chega uma época que você não consegue mais perder peso, mas fica bem de perna. Eu nunca tive contusão.
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Carreira profissional de Fafá começou no Poções: "daí para frente foi só alegria". Foto: Acervo Pessoal |
Onde começou a carreira? Comecei em Belmonte, joguei intermunicipal. Depois fui para Camacan. De lá, depois de um jogo em Buerarema, um treinador chamado Veríssimo me levou para Coaraci. Fiz 17 gols no intermunicipal e um zagueiro chamado Duzinha, de uma cidade perto de Coaraci, ele jogava em Ubaitaba, ele foi para Poções e me indicou para Poções. Estreei contra a Catuense, fiz dois gols e assinei contrato. Daí para frente foi só alegria.
Se inspirava em alguém? Em dois caras que vi jogar. Beijoca, vi no final da carreira, mas ainda vi, e eu gostava muito de Nunes. São dois caras que faziam gols. Nunes mesmo atropelava a bola e fazia gol. Quando comecei a torcer para o Flamengo foi por causa daquele time que tinha Nunes, Zico, Andrade... quando o Fla foi campeão mundial. Admirava Nunes.
Você acha que se você conseguisse contornar a situação do peso, teria chegado mais longe na carreira? Não, não porque eu não tinha o peso no começo. Quando eu cheguei no Poções mesmo, em 91kg, 92kg, eu tinha 86kg. No Mogi Mirim fiquei com 85kg e tive que ganhar peso para ficar com 90kg e às vezes ficava debilitado por ser magro e alto. Fiquei com 93kg e 94kg um tempo, aí depois ganhei mais e cheguei a jogar com 98kg em alguns times. Eu joguei em várias equipes. Se é hoje, acho que pela facilidade que é, hoje se você faz gols tem vários empresários para levar o cara. Visto o Hernane, do Flamengo, um jogador que era desconhecido, que hoje está no cenário brasileiro. Hoje você filma qualquer jogador, manda o vídeo e o cara já leva para algum lugar. Antigamente para passar um jogo televisionado iam aqueles caminhões baú. Hoje com duas câmeras se consegue transmitir um jogo. Às vezes a gente dá azar, não pega um empresário bom, sério. Mas graças a Deus eu convivi com grandes pessoas, como os treinadores Aroldo, Sapatão, Bira Veiga, que me ajudaram bastante.
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No Mogi Mirim, Fafá conheceu feras do Carrossel Caipira |
Você conseguiria escolher o melhor momento da sua carreira? Começou em Poções, que eu fui artilheiro duas vezes. Subimos de divisão. Foi uma segunda casa. Coaraci do mesmo jeito e no Cruzeiro de Cruz das Almas, tornei a ser artilheiro, fiz um campeonato brilhante, e no Camaçari, foi uma das grandes passagens minhas. Foi um dos momentos mais felizes da sua carreira.
Você também jogou no Mogi Mirim no início dos anos 1990, não é? Tive o prazer de jogar no Mogi Mirim na época do Carrossel, com Rivaldo, Leto, Válber, Capone, Mabília. Joguei, fiquei quase quatro anos no Mogi Mirim. Já em 1995, fomos para o quadrangular semifinal do Campeonato Paulista contra o Palmeiras. Aquele time era um timaço. Tomamos 5 a 1. Era complicado jogar contra eles. Como dizia o professor da época, mexemos na casa do marimbondo. Foi um jogo bom. Saímos satisfeitos pelo desempenho. Até o Vanderlei Luxemburgo falou na época que não merecíamos tomar cinco. Coisas do futebol.
Qual a história mais curiosa da sua carreira, aquela que você costuma contar sempre? Cheguei em 1999 no Cruzeiro de Cruz das Almas para tirar o time do rebaixamento, tinha vindo de Camaçari. Chegando lá a torcida gostava muito de Joãozinho e perdi uns dois gols, o time já estava mal. Torcedores amassaram o capô do meu carro, me xingavam, eu nem podia sair de casa direito. Achava que iam me bater, mas só não batiam por causa do meu tamanho. Dois caras, um dia na praça, me fecharam e eu falei: 'vocês vão me bater aqui? Aí já é demais'. Me xingaram até, me esculhambaram, mas não me bateram. Fui embora para o ASA, joguei nove partidas e fiz 14 gols. Fui destaque nacional e souberam lá em Cruz: 'ah, aqui esse sacana não fez gol'. Me ligaram e falaram isso (risos). Em 2002 eu voltei, fiz um contrato de risco. O torcedor não queria. O treinador que queria, nem o presidente me queria. Aí eu comecei a jogar. Na primeira partida eu fiz um gol contra o Colo Colo. Na segunda partida nós perdemos fora de casa. Eu sei que na terceira nós empatamos em casa e a torcida começou a chiar. Na quarta nós pegamos o Barreiras e demos 5 a 2 e fiz quatro gols. Aí começou a mudar a história. Os caras diziam: 'rapaz, o cara está diferente'. O próprio torcedor que deu murro no meu carro me deu dinheiro, me deu camisa. Me parou no meio da rua um dia e me deu uma camisa azul. Aí eu disse: 'bonita é essa que você está usando, quero uma camisa branca dessa'. Ele tirou na hora e me deu. O mesmo cara. Me pediu desculpas, disse que era coisa de torcedor. Falei com ele que era tranquilo, que isso é da vida, que a vida dá muitas voltas. Aí foi o contrário. Eu não podia sair na rua, tinha a galera pedindo autógrafo. Mudou toda a história. Foi uma passagem boa da vida que eu aprendi muito. Eu nem queria ir, mas Aroldo Moreira insistiu que eu fosse para lá. Ele pegou em meu pé, que eu consegui dar a volta por cima. Fizemos um bom campeonato e, graças a Deus, chego hoje em Cruz das Almas e sou bem recebido, esse torcedor me liga, manda presente final do ano. Fiz uma grande amizade com o Amilton, taxista. Aí eu brinco com ele que se eu não jogar nada ele nem me bate, vai ficar a meu favor. Essas histórias assim que é gostoso.
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Walter, do Goiás, é um dos destaques do Brasileirão 2013 |
Tem acompanhado o futebol brasileiro? O que acha do Walter? Demais e fico feliz pelo gordinho Walter. Hoje, se não fosse o peso... Ele está melhor do que Pato, Fred, Leandro Damião. Está colocando todo mundo no bolso e com certeza teria vaga na Seleção, mas o peso... Hoje jogador de futebol se não for fininho as pessoas já falam. Walter hoje está mostrando que não é isso. Atrapalha, eu não vou negar que o peso atrapalha. No campeonato brasileiro, ele já deu uma sentida na musculatura, porque está correndo muito, se dedicando. O professor (Enderson Moreira, técnico do Goiás) mesmo disse que ele chega primeiro no treino. Os gordinhos têm seu valor.
Você pediria a Felipão para chamar Walter? Com certeza. Está faltando um tempinho para Copa do Mundo e se deixasse ele confinado uns 20 dias, ele chegava na Copa voando. Tem que ver o momento. Se ele está vivendo um bom e outros ruim, não importa o peso. Pega ele, faz um trabalho. Hoje eu estou querendo que ele não jogue contra o meu Flamengo.
Acha que o Bahia cai este ano? Acho que o Bahia não cai, não. O Bahia tem um time bom, está tendo falta de sorte. Os caras estão se dedicando. Outro dia fiquei até retado com a torcida pegando no pé de Fernandão. Um cara com um time mais ou menos como é o Bahia e fazer os gols que ele está fazendo, tem que ter o respeito da torcida. Ele se dedica, ele corre, se ruma. Não é aquele craque, mas dá sangue. Outro dia ele fez gol e chorou, aquilo me deixou... fico feliz.
E o Vitória, vai pra Libertadores? Acho que vai. Estou torcendo, porque está merecendo. Está jogando um bom futebol. Contra o Fluminense, com um a menos, o time parecia que estava jogando no Barradão. É um time compacto e acredito que o Vitória chega no G4.
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Fafá foi o artilheiro do Campeonato Baiano de 2002 |
Você torce mesmo pelo futebol baiano... O futebol baiano é maravilhoso. As equipes baianos estão dando a volta por cima. Bahia e Vitória indo bem, o Campeonato Baiano tem tudo para melhorar. Tem gente hoje que prefere jogar intermunicipal do que campeonato baiano. Tem alguns clubes pagando menos que time de intermunicipal. Tem meninos que estão começando que prefere jogar intermunicipal. Tem um moleque que mandei para Itapetinga, o cara queria dar mil reais para o menino que está ganhando R$ 1.300 em time de intermunicipal. Faço o papel de olheiro às vezes, indico os meninos. Tem um moleque no Ituano, o meia Guilherme no Ituano. Eu que indiquei.
Qual o gol mais importante da sua carreira? Tenho uns três. Dois foram marcados quando subi com o Poções no Campeonato Baiano, lá em Santo Antônio de Jesus, contra o Atlético de Alagoinhas, quando demos 4 a 2. Na Fonte Nova, Bahia e Poções, eu fiz gol em cima de Rodolfo Rodriguez. A gente botou 2 a 0 e deixamos empatar no final. A gente estava tirando o Bahia, que fez um gol com Advaldo NBA aos 49 minutos do segundo tempo. O juiz penando para desgraça. No final ele deu uma cabeçada fraca, a bola entrou e empatou o jogo. A gente chegou na Fonte Nova e a torcida peguntava quem era esse Poções, se era poções de batata frita, de frango. Fui um dos melhores em campo. Até o gol de Advaldo eu era o melhor em campo, mas depois ele fez o gol e foi o melhor em campo. Fonte Nova lotada. Até hoje falo. Time do Bahia que tinha Uéslei, Paulo Rodrigues, NBA, Missinho, Arturzinho... Time para se respeitar. Fizemos 2 a 0, a Bamor xingando, a Fonte Nova calada. Passagem que marcou muito na minha carreira.
Você já pendurou as chuteiras profissionalmente, mas pensa em parar de jogar futebol? Parar não pode, se não enferruja. Domingo mesmo fui jogar em Cabrália com uns veteranos. Chegamos lá e demos 2 a 0. Chegou no segundo tempo e eu disse: 'já chega, o sol está muito quente'. Era 9h da manhã. Os caras pediam para ficar, mas eu dizia: 'não, tem tanta gente para jogar'. Nessa hora a experiência ajuda. Tinha que sair bem (risos).
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