Explorar formas geométricas e abstratas em carvão e acrílica foi o caminho encontrado pelo artista plástico gaúcho Guilherme Dable, em resposta ao excesso de imagens do mundo contemporâneo.
As obras do artista estão expostas na Roberto Alban Galeria e podem ser vistas até o dia 10 de novembro. Reconhecido pela crítica especializada, o trabalho do artista está presente em coleções conceituadas como a de Gilberto Chateaubriand, a do Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul e Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Com o sugestivo título 'Desse lugar entre meio-dia e duas horas da tarde', a mostra é integrada por telas de grande dimensão, em uma perspectiva que coloca em evidência o trânsito de seu criador entre cor e forma, na compreensão e registro do cotidiano. Segundo o próprio artista, suas pinturas representam para ele “um reorganizar interno do mundo”. Os registros começam quase sempre com caminhadas pelas cidades, quando anota o que vê em cadernos, fotografa coisas e constrói repertório para alimentar o seu ateliê de criações. Nascido em 1976, Guilherme Dable é de Porto Alegre. Bacharel em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, possui mestrado em Poéticas Visuais. Já participou de coletivas internacionais, em Londres e Nova York, e também realizou seis individuais no país, em cidades como Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro e Recife (PE).
A seguir, acompanhe uma entrevista com Guilherme Dable, na qual ele comenta um pouco mais sobre seu processo de criação:Como você define a sua pintura sob o ponto de vista conceitual? Eu penso o meu trabalho como um reorganizar interno do mundo. Apesar de eu ter uma rotina diária de ateliê, de embate com a imagem, no desenho e na pintura, é de um habitar o lado de fora do ateliê que as coisas surgem - de caminhadas pela cidade, fazendo anotações nos cadernos, fotografando coisas, de uma espécie de deriva, que eu junto repertório para alimentar o ateliê. O trabalho não tem uma figuração explícita, ele alude à cidade, mas na verdade essas anotações sobre a arquitetura, as observações sobre como a luz incide nas coisas pela rua ou a refração delas altera a percepção, por exemplo, do que tenho dentro do ateliê em determinada hora do dia, servem como uma espécie de desculpa pra trabalhar, pra mexer com os materiais, pra achar alguma maneira de dialogar com essa experiência quando vou pra frente do suporte. E o fato dessa alusão à figuração se dar de uma forma muito insinuada é também uma maneira de acalmar as coisas internamente - são imagens demais no mundo, tem muita figura o tempo todo, é um tsunami. Eu acho que a abstração, hoje, tem um caráter de pausa, de respiro.
De que maneira o seu modo de pintar (técnica) evoluiu ao longo do tempo para dar vazão à sua proposta conceitual? O tempo de ateliê me é muito precioso. Eu venho pelo menos cinco dias por semana, gosto de ter horário, de bater ponto, passar o dia aqui dentro, tanto no embate direto com o trabalho quanto lendo, olhando imagens, estudando outros artistas, tentando desmontar o processo e a fatura deles. Isso, por um lado, pode te jogar em uma autocrítica meio cruel às vezes, mas também fez uma diferença muito grande no meu repertório, no sentido de possibilidades com os materiais. E isso se soma na construção da pintura - eu diria que a pintura vem ganhando outro corpo, outra qualidade de fatura. É algo que se soma ao trabalho e, ao mesmo tempo, abre novas possibilidades, se passa a pensar novas questões relativas ao que acontece dentro desses trabalhos; isso traz mais coisas pra se falar a respeito.
De que forma a sua fase atual dialoga com o seu momento atual como artista pensante e crítico da realidade?Eu penso em mais de um trabalho ao mesmo tempo, tem o trabalho de ateliê, mas tem também trabalhos mais específicos, pensados para situações particulares. Há trabalhos que podem ser pensados como um comentário de conotação mais política, em um sentido crítico, mas sempre de forma muito aberta. “Shelterruin (Ruínaabrigo)”, que eu apresentei esse ano em Londres, onde eu sobrepunha elementos de estampa vitoriana com padrões de cobogó, tem um caráter de comentário político, assim como outros projetos específicos.
Qual a importância da cor no contexto de sua obra? E da forma? A cor tem crescido de importância de uns tempos pra cá. Os trabalhos tem se estruturado mais a partir da cor, de uma busca por luminosidade. A minha formação é fundada no desenho, que é uma prática constante minha, então a construção toda se baseava muito mais na forma, em um equilíbrio precário que eu tentava orquestrar, do que na cor em si. O desenho segue presente, mas a sensação da cor tem tomado muito da minha atenção.
Esta é sua primeira exposição na Bahia?Sim.
Como vê a conquista do seu último prêmio (Marco Antonio Villaça)?Ser contemplado junto de artistas que eu admiro, como Luiza Baldan, Jimson Vilela, Fabio Baroli, Ernesto Neto, é uma honra enorme, assim como fazer parte de um acervo como o do MAM.
Como a sua formação em poética visual interfere na sua criação? Ou não interfere?O mestrado foi uma oportunidade de criar bagagem; de aprender uma metodologia e entender a atividade artística como fundamentada na pesquisa, sempre próxima da prática do ateliê. Foram dois anos, li intensamente, escrevi muito sobre meu trabalho e, a partir disso, pude entender onde balizava diversos aspectos do meu pensamento como artista. Isso me ajuda a projetar e a lançar novos problemas para resolver.
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