Fios brancos, pretos, loiros, castanhos, ruivos e mãos enrugadas e novas dançavam na plateia, quando vista de cima, no show Trinca de Ases, que reuniu Gal Costa, Gilberto Gil e Nando Reis, no palco da Concha Acústica na noite de domingo (15). A mistura de gerações que acontecia lá, em frente ao palco, parecia ser transformada em metáfora no repertório das apresentações, que uniram inéditas e antigas canções dos três artistas. O show, que já passou em cidades como São Paulo, é uma versão revista e ampliada do espetáculo idealizado pelo jornalista Jorge Bastos Moreno (1954 – 2017) e apresentado uma única vez em Brasília, em 2016, para celebrar o legado e o centenário de nascimento do político Ulysses Guimarães (1916 – 1992).
A turnê, que ganha direção musical assinada por Gil com Nando, reúne três músicas inéditas. Entre elas, estão Tocarte, música de Nando com Gil, e Dupla de Ás, de Nando sozinho. A composição-título Trinca de Ases, também é novidade. A música é um rock pop tropicalista criado por Gil. Não por acaso alocada na abertura do roteiro, a música remete ao clima do grupo Doces Bárbaros – formado em 1976 pelo próprio Gil com Gal, Caetano Veloso e Maria Bethânia.
O casal Mário de Almeida, 72 e Ângela Guimarães, 62, foram para celebrar Gal e Gil, apesar de vibrarem também ao ouvir Nando Reis. “Vamos lembrar do tropicalismo e refletir com eles hoje”, ponderaram juntos. Já os irmãos Regina Santos, 37, e Elmo, 50, acompanham Nando desde os Titãs, e estavam no aguardo de músicas da época.
As primas Juliana Veiga, 26, e Lara Veiga, 17, escutam mais as músicas de Nando, assim como Victória Andrade, 20, e Lais Becker, 19, que não negaram, ainda, o encanto por Gil. Mas as aproximações musicais não eram determinantes pelas faixas etárias. O casal Roberto Alonso, 52 e Amanda Lavine, 40, tem uma história embalada pela trilha sonora de Nando, e estavam na expectativa da música Só Posso Dizer. Enquanto isso, Erica Santos, 55, e a filha Ludimilla, 25, esperavam por Drão, de Gil.
Os desejos não foram atendidos, mas as surpresas podem ter suprido as vontades. O show, que começou com Gil aparecendo no palco e recebendo os gritos da multidão, que reuniu em torno de 5 mil pessoas, logo apresentou Nando e Gal, formando a trinca, que deu as cartas principais a partir do início de Palco, música de Gil, que fez todas as gerações gritarem em harmonia.
O coro mais forte, porém, veio em All Star, de Nando Reis. Ao olhar para os lados, não era possível visualizar uma boca que não estivesse fazendo parte da cantoria. Carecas, pintados e trançados, todos pulavam lembrando que nada externo define algo além de estereótipos.
Com Nando trocando de instrumentos, indo do violão à guitarra, e brincando na interação com Gil e seu baixo, Gal dava voz para a música Baby, que representa época da ditadura. Mas para quem achava que cada um dos artistas daria interpretação somente para as próprias canções, o bom susto veio à tona em Espatódea, música que Nando compôs para a filha Zoé. Quem deu força para a mensagem da obra foi a voz da própria Gal, que iniciou a onda no palco, em que um cantava músicas do outro.
Mas os bons espantos não pararam por aí. Os artistas ainda interpretaram músicas de outros nomes da MPB, como foi o caso de Dois Rios, canção da banda Skank. Ainda teve som internacional, com Lately, de Stevie Wonder, na voz de Gil, que ainda brincou com partes em português.
Em meio às surpresas, uma declaração para a Bahia. Nando Reis exclamou ao tom da luz azul: “É sempre emocionante estar aqui, nessa terra de arte bonita. Foi com esses dois baianos que encontrei, de fato, a música, e estar na terra deles é uma honra”, manifestou o compositor.
Na sequência, pedidos foram atendidos por Nando, mesmo que sem saber, com uma das músicas mais animadas do cancioneiro solo do ex-Titãs, Por Onde Andei. Mas se em All Star os coros eram altos, foi em O Segundo Sol, ainda de Nando, que o som foi ainda mais belo e ensurdecedor. Após, Gil cantou Nos Barracos da Cidade, música de efeito catártico no atual momento político do Brasil. Parceria de Gil com Liminha, Nos Barracos da Cidade foi o fecho inesperado de show que, no bis, esboçou clima de festa com A gente Precisa Ver o Luar, de Gil e Barato Total, além de repetir O Segundo Sol, com os três artistas unindo vozes e gestos.
Relicário e Refavela são somente alguns dos outros títulos não esquecidos. Com o repertório, Trinca de Ases ganha o jogo, sobretudo, por ser mais do que MPB misturada. Em época de pop firme e outros gêneros ganhando espaço, as três figuras, entre estarem de pé e sentados, comprovaram que a MPB continua com dedos firmes, unindo idades e trazendo o lembrete de que a mesa da vida faz ganhos quando é sobre perder: o preconceito.
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Redação iBahia
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