Quinze segundos. Foi o tempo que durou a ação dos bandidos que pôs fim à vida da jornalista Selma Barbosa Alves, 53 anos, na noite de domingo, no Costa Azul. Ao parar o carro para deixar uma amiga em casa, na rua Arthur de Azevedo Machado, Selma teve o veículo fechado por um Celta preto, de onde desceu um homem armado, que atirou em sua cabeça, retirou o corpo do carro, um Punto, e fugiu com o comparsa. Selma, que coordenava o Laboratório de Vídeo da Faculdade de Comunicação da Ufba (Facom), onde trabalhava há mais de 20 anos, costumava frequentar o centro espírita aos domingos. Mas, dessa vez, havia passado a noite em casa, nas imediações do Centro de Convenções, estudando com uma colega do curso de Pós Graduação em Gestão de Processos Universitários, da Ufba. “Como demorou muito e ficou tarde, ela veio me trazer em casa. Acho que ela me esperou entrar no prédio”, contou a colega Conceição Leão, 43, técnica administrativa da Ufba. Segundo Conceição, Selma parou o carro — um Punto prata, placa NZY-4231 — em frente ao prédio onde ela mora, o Condomínio Edifício Vila do Mar. As imagens das câmeras de segurança do prédio registraram a ação da dupla de bandidos. Ao descer do veículo, Conceição disse ter notado que um Celta preto (placa NYT-5784) se aproximava. “Eu percebi que eles não seguiram a pista e apontaram em direção a ela. Peguei a chave, mas não consegui abrir o portão. O porteiro abriu e, quando me virei, eles já estavam em cima dela, atirando. Foi muito rápido”, relatou. Ela não acredita que Selma tenha notado a chegada da dupla. “Eu vi porque estava fora do carro”, disse. Assustada, Conceição subiu pelo elevador do prédio gritando por socorro. Ela chamou a polícia, que iniciou uma perseguição aos bandidos. Mas, para Selma, era tarde. Quando o Samu chegou, Selma já estava morta.
Roubos seguidos Após o disparo, a dupla de bandidos retirou o corpo de Selma do carro e o abandonou no asfalto. Em seguida, fugiram com o carro da vítima, na contramão, deixando o Celta que haviam usado para chegar até o local do crime. Segundo o delegado Marcos César, da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos (DRFRV), o Celta era roubado. A delegada titular da 9ª DT (Boca do Rio), Rogéria Araújo, informou que a dupla havia atacado um cliente do Bradesco de Itapuã duas horas antes do latrocínio (roubo seguido de morte) de Selma. Dele, roubaram o Celta. Ontem, o cliente do banco forneceu informações para o retrato falado dos assaltantes. O material está sendo elaborado pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT). A delegada já solicitou as imagens do circuito de câmeras ao Bradesco e também já dispõe do vídeo registrado pelas câmeras do prédio de Conceição. “Uma equipe da 9ª DT está refazendo o trajeto feito pela vítima e, provavelmente, pelos criminosos, no Costa Azul, buscando identificar testemunhas e câmeras de outros prédios da região, que possam contribuir com as investigações”, disse. Fuga Logo após sair com o carro de Selma, a dupla foi perseguida por viaturas da Operação Gêmeos, da Apolo e da Rondesp Atlântico até as imediações do Aeroclube. Depois de baterem contra o meio-fio em frente a um posto de gasolina no Jardim Armação, eles abandonaram o veículo e fugiram a pé. “Um dos bandidos correu em direção a uma vala, em um matagal, atrás de um campo de futebol que tem por ali”, contou o tenente Marcelo Tonete, da Operação Gêmeos, que participou da diligência. Segundo o tenente, o bandido entrou no esgoto que tem uma saída subterrânea que dá acesso ao mar. O outro seguiu por uma rua das imediações e também não foi encontrado. Tonete afirmou que os policiais também entraram no esgoto, mas tiveram que recuar por conta da quantidade de água, que já passava dos joelhos. O estudante de publicidade Eric Braga, de 19 anos, testemunhou a perseguição: “Eu vi muitas viaturas saindo da delegacia do Aeroclube e ouvi muitos tiros durante cerca de dez minutos, ou mais. Moro em um prédio e mesmo assim deitei no chão com medo das balas. Foi aterrorizante”, contou. “Depois, teve um intervalo de uns cinco minutos e mais três tiros. Foram cerca de 25 tiros”, completou. As buscas ainda duraram cerca de três horas, mas os dois bandidos não foram encontrados. Segundo Tonete, a Operação Gêmeos aguarda diretrizes do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) para dar continuidade aos trabalhos. O titular da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos (DRFRV), delegado Marcos César da Silva, disse que investiga o crime paralelamente. “O roubo de veículo mudou muito. Hoje, é um crime-meio para praticar outros crimes, como roubos, tráfico. Não existe mais aquele modelo de carro mais visado, o pessoal tem elegido a facilidade em render a vítima”, declarou.
Cerimônia será celebrada hoje no Jardim da SaudadeNo início da tarde de hoje, haverá uma celebração no Cemitério Jardim da Saudade, em Brotas. Só então o corpo seguirá para Natal, onde Selma nasceu e será sepultada. Até o fechamento desta edição, às 22h, o corpo ainda não havia sido liberado do IML. Até as 16h30, o corpo permanecia como “não-identificado”, já que não havia documentos e as impressões digitais foram enviadas ao Rio Grande do Norte. Para a liberação do corpo, é preciso que um familiar se apresente com o documento da vítima. Na Facom, onde Selma trabalhava, o clima ontem era de tristeza. As aulas foram suspensas e, segundo a professora Suzana Barbosa, diretora da Facom, a própria universidade estava cuidando da liberação do corpo, já que a família de Selma, com exceção de uma irmã, não mora na Bahia. “Estamos todos aqui na Facom chocados. Estamos de luto e indignados com mais um caso de violência”, disse Suzana. Em nota, a Ufba lamentou a perda. “Selma atuava no Laboratório de Vídeo da Faculdade de Comunicação e, em manifestação de luto, as aulas da unidade foram suspensas nesta segunda-feira. Pela perda de uma funcionária tão estimada, a Ufba estende as mais profundas condolências à comunidade acadêmica da Faculdade de Comunicação, aos familiares e amigos da servidora”, dizia a nota. No Laboratório de Vídeo, Selma trabalhava com outros três colegas: um operador, um editor e uma auxiliar de laboratório. A auxiliar de laboratório Cristiane Nogueira disse que vai ser difícil se acostumar à ausência de Selma. “Ela ia se aposentar em 2015, mas dizia que não ia parar. Estava cheia de planos de continuar trabalhando e estudando”, contou. O editor de vídeo Davide Júnior Sousa de Araújo disse que recebeu a notícia com absoluto susto. Segundo ele, a colega era uma profissional exemplar e mantinha um relacionamento de profissionalismo com os alunos da Facom. A jornalista e cineasta Ceci Alves também lamentou a morte. “Selma Barbosa era minha grande amiga. Foi por causa dela que eu escolhi estudar edição: foi ela que me passou a paixão pela arte de cortar, colar e armar o quebra-cabeça audiovisual. Ela era uma pessoa linda, do bem, que me ensinou muito do seu ofício e também de vida e amizade”, declarou. Selma tinha medo da violência no Costa AzulSelma temia a violência no Costa Azul. Amigo da vítima e repórter do CORREIO, o jornalista Jorge Gauthier contou que Selma havia reclamado, há cerca de um mês, da insegurança do bairro. “Ela relatou que carros haviam sido roubados na sua rua e também apartamentos arrombados no seu prédio. Ir para Natal, segundo ela, era seu maior sonho. Ela tinha muito medo da violência”, escreveu em seu perfil no Facebook. A área costuma ser movimentada, já que serve de acesso à Avenida Paralela e a shoppings da cidade. Segundo o delegado Marcos César, há roubos de carro no bairro, mas não há um número significativo. Durante todo o dia de ontem, a insegurança foi questionada nas redes sociais, principalmente por alunos e funcionários da Faculdade de Comunicação da Ufba. O professor e cineasta baiano André Setaro protestou no Facebook: “A insegurança em Salvador passou mesmo dos limites. Literalmente, não se pode mais sair de casa sob pena de receber um balaço na cabeça [...] A vida é trágica e Salvador mais trágica ainda”, comentou. “Estamos literalmente abandonados aos bandidos... moro no Corredor da Vitória e tenho medo de ir a pé ao TCA e ao Hotel da Bahia... como viver assim?”, questionou a professora da Ufba Deolinda Vilhena. Matéria original do Correio Servidora da Ufba tinha medo da violência no Costa Azul
Veja também:
Leia também:
AUTOR
AUTOR
Participe do canal
no Whatsapp e receba notícias em primeira mão!
Acesse a comunidade