A possibilidade de regulamentação da atuação dos motoristas por aplicativo tem dividido opiniões entre os trabalhadores. Na segunda-feira (4), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou a proposta de projeto de lei que institui a categoria, bem como uma série de regras para a atuação desses profissionais.
Salário mínimo, benefícios e carga horária de trabalho estão entre as definições do projeto de lei, mas as medidas têm causado ansiedade nos motoristas por aplicativo. Apesar da regulamentação ser considerada positiva, os trabalhadores temem que a mudança encareça o preço das corridas e modifique a forma com que o aplicativo as remunera.
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"Hoje em dia, o motorista por aplicativo faz em média R$ 35 por hora durante a semana e em torno de R$ 40 a R$ 50 por hora, nos fins de semana. Acho que R$ 32,90 é uma boa média [...] e os R$ 29,70 para gastos também é muito bom, porém essa conta vai chegar para alguém e será o usuário. Logo, o preço das corridas vai aumentar e muitas pessoas vão deixar de usar o aplicativo. Isso vai dificultar o nosso trabalho", se preocupa Josué Souza, de 29 anos, em entrevista ao iBahia.
Ele trabalha na função há 6 anos e não é o único deste grupo de trabalhadores a se preocupar. A motorista por aplicativo Valdivane da Silva, de 48 anos, trabalha no ramo há 5 anos e pontua que a forma como as plataformas irão aplicar a proposta do projeto de lei é a maior dúvida no momento, uma vez que o estabelecimento de um salário mínimo poderia diminuir a renda dos trabalhadores.
"Temos que saber como [isso irá funcionar]. É com o passageiro dentro do carro? Com o aplicativo ligado?", questiona a trabalhadora.
Segundo Amanda Medrado, advogada especialista em Direito do Trabalho, a medida não estabelece um salário fixo e, sim, uma remuneração mínima. "O motorista por aplicativo poderá fazer diversas corridas e, dentro dessa uma hora em que ele está logado, o mínimo que ele deverá receber na plataforma é R$ 32,90. Por isso que foi inserido na medida que o piso salarial será de R$ 1.412, ou seja, se o trabalhador fizer 2 corridas dentro de uma hora e o valor mínimo não atingir R$ 32,90, a plataforma deverá apurar e realizar o repasse complementar da diferença", explica a especialista.
Ainda de acordo com a advogada, a forma de controlar o tempo em que o trabalhador está na plataforma e se ele, de fato, está realizando corridas ou só está logado, será definida através de uma negociação coletiva entre a empresa e os sindicatos que irão representar os trabalhadores.
"Isso tudo será decido de maneira coletiva. A regulamentação pelo projeto de lei não discriminou dessa forma e os sindicatos, juntamente com as empresas, irão definir isso. É algo ainda a ser debatido", pontua.
Opiniões dos motoristas por app diverge
Ainda que a regulamentação tenha sido um clamor dos motoristas por aplicativo no Brasil, nem todos os trabalhadores ficaram satisfeitos com o texto do projeto. A proposta aponta que os trabalhadores receberão, a cada hora trabalhada, R$ 24,07 para pagamento de custos com celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, impostos e outras despesas. Esse valor não irá compor a remuneração, tem caráter indenizatório.
Entretanto, alguns trabalhadores apontam que os altos custos com esses aspectos não serão cobertos pela quantia proposta.
"[O benefício] não condiz com a realidade do motorista por aplicativo, é pouco. O custo do combustível e de um plano [telefônico] para celular, [por exemplo], são muito altos e [esse valor] é insuficiente", pontua Hebert Pimenta, de 43 anos, que trabalha na função há 3 anos.
A falta de um texto claro sobre a segurança do trabalho também preocupou os trabalhadores, que tem sofrido com a violência urbana.
Projeto de lei abre caminho para garantia de direitos
Apesar de não definir detalhes sobre a segurança do trabalho, o projeto de lei indica a possibilidade que o trabalhador receba auxílio da empresa em casos de violência.
"O art 6° do projeto menciona que 'os serviços das empresas operadoras de aplicativos e o trabalho intermediado por suas plataformas devem pautar-se pelos princípios de :III - eliminação de todas as formas de discriminação, violência e assédio no trabalho'. Porém, nao especifica acerca dos beneficios de forma expressa", diz a especialista em Direito do Trabalho, Amanda Medrado.
No entendimento da advogada, este é mais um ponto que ainda deve ser discutido na legislação e que também pode ser construído coletivamente, entre sindicatos e empresas.
Diante disso, a regulamentação, ainda que em construção, funciona como uma ponte para a garantia de direitos dos trabalhadores da categoria, que estão expostos a uma série de violências.
O que está no texto da lei
O texto assinado pelo presidente ainda não foi oficialmente aprovado e precisará passar por uma votação no Congresso Nacional. Caso aprovado, as regras estabelecidas no documento passam a valer em 90 dias.
O projeto é fruto de um grupo de trabalho, criado em maio de 2023. A criação do texto contou com a participação de representantes do governo federal, trabalhadores e empresas, além do acompanhamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Ministério Público do Trabalho (MPT). O projeto de lei prevê:
- Criação da categoria “trabalhador autônomo por plataforma”.
- Os motoristas e as empresas vão contribuir para o INSS. Os trabalhadores pagarão 7,5% sobre a remuneração. O percentual a ser recolhido pelos empregadores será de 20%.
- Mulheres motoristas de aplicativo terão direito a auxílio-maternidade. Além disso, todos os trabalhadores terão acesso aos "benefícios previdenciários"
- A jornada de trabalho será de 8 horas diárias, podendo chegar ao máximo de 12h
- Não haverá acordo de exclusividade. O motorista poderá trabalhar para quantas plataformas desejar.
- Para cada hora trabalhada, o profissional vai receber R$ 24,07 para pagamento de custos com celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, impostos e outras despesas. Esse valor não irá compor a remuneração, tem caráter indenizatório.
- Os motoristas serão representados por sindicato nas negociações coletivas, assinatura de acordos e convenção coletiva, em demandas judiciais e extrajudiciais.
Iamany Santos
Iamany Santos
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