Com o final da grande maioria dos campeonatos estaduais, alguns riem gloriosamente e outros choram de tristeza e revolta neste exato momento. Isso porque o resultado definitivo de uma competição dá início a um outro “esporte” muito conhecido entre nós e que os torcedores adoram: eleger culpados pela derrota, sejam eles técnicos, jogadores, árbitros, VAR, dirigentes, integrantes da torcida, jornalistas, narradores e até regulamento. Essa resenha, tanto pelo lado de quem perde como pelo de quem ganha, pode durar semanas, meses, anos e até mesmo entrar para a história como uma ferida nunca cicatrizada, a depender da dramaticidade do resultado.
E neste momento em que os resultados em campo das finais dos estaduais serão debatidos à exaustão, uma outra polêmica deve voltar à tona e ganhar protagonismo se John Textor, acionista majoritário do Botafogo, continuar procurando, para além de General Severiano, os culpados pelo desfecho de seu time no Campeonato Brasileiro de 2023. O dirigente vem insistindo na tese que manipulações de resultados, erros de arbitragem e conluios entre clubes teriam prejudicado o Botafogo na reta final da competição. Até então, as diversas acusações têm sido feitas pela imprensa, mas já chegaram à Justiça, e devem movimentar o início do Campeonato Brasileiro que começa neste final de semana.
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Uma decepção difícil de superar
Se a apaixonada torcida do Botafogo, acostumada com os reveses da vida e com aquelas coisas que só acontecem com o seu time, já parece ter amenizado o drama do ano passado e o colocado na prateleira de decepções, parece que o mesmo não vem acontecendo com John Textor. Proprietário da Eagle Football Holdings, seu conglomerado de clubes a nível mundial, o executivo adquiriu 90% das participações do Botafogo, ao final de 2021, mas ainda não conseguiu superar uma das mais impressionantes reviravoltas de um clube no Campeonato Brasileiro de pontos corridos.
Para recordar o drama, o Glorioso fez o melhor primeiro turno da história (15 vitórias em 19 jogos), liderou o torneio por 31 rodadas consecutivas e abriu uma vantagem de inacreditáveis 13 pontos sobre o segundo colocado. Mas ficou 11 jogos sem vencer na reta final, assistiu passivamente ao Palmeiras ultrapassá-lo na classificação quando faltavam apenas cinco partidas, chegou à rodada final sem chances de título, foi superado por outros clubes e terminou apenas na quinta colocação, perdendo até mesmo a vaga direta na Libertadores da América. Algo impossível de acreditar até mesmo em se tratando do Botafogo.
Sem admitir que havia algo muito estranho acontecendo com o time e traçando um enredo de ópera bufa e de comédia mal escrita, John Textor, para justificar suas suspeitas e passar um ar mais verossímil às teorias de conspiração, contratou uma empresa de auditoria especializada em análise de jogos e arbitragens. Mais que isso, vem denunciando que possui provas que árbitros não receberam propinas acordadas e que houve conluio entre Palmeiras, São Paulo e Fortaleza para prejudicar o Botafogo. O dirigente diz que vai até as últimas consequências e que o seu clube é o único com coragem para acionar o Poder Judiciário.
Por ter feito acusações públicas sem apresentar provas, o empresário foi denunciado pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) por litigância de má-fé e falsa acusação de crime. Seu julgamento está marcado para o dia 15 de abril, por não atender ao prazo dado pelos magistrados. Alegando que o tribunal desportivo não tem competência para investigar este processo, apresentou-se à Cidade da Polícia, no Rio de Janeiro, na semana passada, com uma série de documentos.
A revolta entre os acusados pelo CEO do Botafogo é tão grande que os clubes citados emitiram notas oficiais criticando a atuação e o desequilíbrio do dirigente e já sinalizaram com ações judiciais. A Associação Nacional dos Árbitros de Futebol (ANAF) repudiou a acusação de John Textor e vem pedindo medidas legais, como a suspensão e o banimento do empresário do futebol brasileiro.
O dono da SAF do Botafogo também foi processado pelo crime de calúnia por Ednaldo Rodrigues, presidente de CBF, logo após a histórica derrota para o Palmeiras de virada (4 a 3, depois de estar vencendo por 3 a 0). “Isso precisa mudar. Ednaldo, você precisa renunciar pelo bem do jogo. Isso precisa acabar. Isso é roubo, me multa. Você não pode me expulsar, é meu estádio, eu vou continuar aqui”, disse John Textor, em entrevista, ainda no gramado do Estádio Nilton Santos. Pelas acusações, na época, o americano foi suspenso preventivamente por 30 dias por decisão do STJD. Toda essa confusão fez com que senadores integrantes da CPI da Manipulação de Resultados, ocorrida em 2023, pedissem à Polícia Federal para que ele fosse interrogado e apresentasse tais provas.
As supostas manipulações que John Textor denuncia para a imprensa:
- Para John Textor, o Palmeiras há muito tempo é beneficiado por forças externas e pela compaixão tendenciosa dos árbitros. Segundo ele, o time alviverde se beneficiou por jogar com um atleta a mais em 11 oportunidades no Campeonato Brasileiro, enquanto a média dos outros times foi de três vezes.
- O empresário disse que jogadores do São Paulo manipularam a partida que terminou em goleada para o Palmeiras por 5 a 0, em 25 de outubro. De acordo com ele, "segundo experts e inteligência artificial", sete jogadores chegaram a exibir desvios anormais em situações-chave de gol, mas cinco deles excederam os limites que poderiam estabelecer clara e convincente evidência de manipulação. John Textor ainda disse que o relatório sobre esse assunto foi apresentado ao STJD no final de 2023, mas o órgão decidiu não investigar.
- John Textor disse que o jogo entre Palmeiras e Fortaleza, pelo torneio de 2022, teve o resultado de 4 a 0 manipulado por quatro jogadores do time cearense, sem apresentar provas, quando o clube paulista já tinha sido campeão da temporada. Coincidentemente, para quem gosta de teorias de conspiração, o Palmeiras passou a depender somente dele próprio para ganhar o título no ano passado ao empatar uma partida dramática contra o Fortaleza (26 de novembro) nos minutos finais.
Ao que tudo indica, John Textor não assimilou tudo o que ocorreu internamente nos bastidores do clube e prefere não buscar os culpados em si próprio, na gestão do futebol e na performance do time. Pior que isso, busca vilões externos para justificar o resultado final do torneio do ano passado. Engraçado e irônico será se o dirigente provar que está certo. Seria pitoresco até mesmo para ele, que ficou conhecido por sua competência na indústria de entretenimento, especialmente em tecnologias de efeitos visuais e animação na Digital Domain, que se notabilizou em filmes como "O Curioso Caso de Benjamin Button" (ganhador do Oscar de efeitos visuais) e "Transformers: A Vingança dos Derrotados".
Silvio Tudela
Silvio Tudela
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