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Conheça Dayse Porto, baiana que encontrou seu lugar no cinema

'Busco a inspiração, a arte, mas a maior parte do tempo é labor, disciplina, respeito pelo trabalho de todo mundo, colaboração”, revela cineasta

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Vanessa Aragão

05/04/2023 às 11:43 - há XX semanas
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					Conheça Dayse Porto, baiana que encontrou seu lugar no cinema
Foto: Caio Lírio

Eu conheci a Movida antes de conhecer Dayse, e admirava todas as produções que eram feitas por essa produtora. Quando soube que era liderada por uma mulher, só serviu ainda mais de inspiração e admiração. Dayse Porto, de Cachoeira, veio estudar em Salvador, passou por São Paulo, Cuba, até fincar os pés na capital baiana.

Ela já dirigiu diversos documentários, DVDs, fez vídeos para a publicidade e mais recentemente lançou o “Beleza da Noite”, que passou na TV aberta da Globo e está disponível no Globoplay, também para não assinantes. Conheça mais sobre a trajetória e produções dessa baiana arretada que faz acontecer muita coisa por Salvador e que inspira muita gente por aqui.

1. Como foi sua trajetória até chegar no cinema e audiovisual em Salvador?

- Nasci em Cachoeira, Bahia, vim aos 17 anos para Salvador para seguir com os estudos, minha família inteira segue vivendo lá. Fiz comunicação/jornalismo na UFBA, e desde a graduação comecei a estudar roteiro, a fazer matérias eletivas de audiovisual. Inclusive fiz um intercâmbio pela UFBA na Espanha e lá, em Santiago de Compostela, o curso de audiovisual era meio que junto com o de jornalismo, então fiz várias matérias. Eu queria escrever, roteirizar, mas o senso de realização me levou a dirigir e até a produzir, embora eu sempre diga que não sou produtora, mas sou realizadora. Na falta de quem acreditasse que eu poderia fazer, eu ia lá, buscava parcerias e fazia acontecer no risco. Depois de muitas tentativas fracassadas, algumas deram certo.

Logo que me graduei, trabalhei na TVE Bahia, que foi uma grande escola e lá dirigi o meu primeiro longa documentário “Caminhão da Alegria – 60 anos de Trio Elétrico”, que tinha tudo a ver com o universo que sempre me envolveu desde criança: a música baiana, a cultura, a rua e manifestações como o carnaval. Ali, com vinte e poucos anos, conversei com todo mundo que eu admirava no universo da música, como Caetano Veloso, Moraes Moreira, Gilberto Gil… tenho muito carinho por esse filme, que segue sendo exibido, apesar das limitações técnicas que a gente tinha na época.

Aí fui para Cuba fazer uma especialização em roteiro, na EICTV, que é uma imersão que muda a vida da gente. Depois fiz alguns trabalhos de documentário em parceria com produtoras independentes aqui da Bahia, mas migrei para São Paulo, onde morei 6 anos. Lá trabalhei principalmente com televisão – no SBT, num programa cultural de uma TV fechada do Grupo Mix – e seguia fazendo trabalhos como roteirista e assistente de direção de algumas produtoras independentes tanto de lá quanto daqui. E estudava. Fiz mestrado em Comunicação e Semiótica na PUC São Paulo como bolsista CAPES e publiquei um livro que foi resultado dessa pesquisa, que era uma análise da série Ó Pai Ó, de direção de Monique Gardenberg: “Série Ó Pai Ó - Ritmo e Cultura da Bahia na TV”.


				
					Conheça Dayse Porto, baiana que encontrou seu lugar no cinema
Foto: Walter Guedes

Eu fui para São Paulo pensando no profissional, mas a verdade é que o amor pela Bahia me pegava de jeito, eu sentia uma saudade, que eu não sei explicar. E não era assim, no primeiro ano, sabe? Eu nunca consegui entender São Paulo como um lugar em que me sentisse à vontade; a cultura das pessoas, a musicalidade, até o tipo de humor, o jeito de falar, de andar, eu não me reconhecia ali. E foi pensando em construir as coisas aqui na Bahia, a partir do meu lugar, contribuindo com o nosso setor aqui, que eu criei a Movida Produtora de Conteúdo e voltei para Salvador.

E eu fui fazendo After Movie, institucionais, mas sempre pensando em oferecer algo a mais a esses conteúdos, sempre com um pensamento de roteiro, com uma organização inovadora na produção, na narrativa, na estética. E me envolvi também em projetos de multilinguagem, que estão além do audiovisual e de que me orgulho muito como é o caso do “Mulher com a Palavra”, ao lado de Fernanda Bezerra e Paula Janay e da Secretaria de Políticas para as Mulheres. Depois, o projeto “Mulher com a Palavra” virou programa de TV, que eu dirigi e roteirizei e está lá no Globoplay, com apresentação de Rita Batista. Entre realização de webséries, DVDs musicais como o das Ganhadeiras de Itapuã, Festival de Cinema e vários outros trabalhos, eu ia criando projetos mais autorais, entrando em edital, aquelas coisas. E aí vieram realizações como o filme “As Indígenas da Terra”, que dirigi e roteirizei com Joana Brandão (estreia prevista para este ano) e o “Beleza da Noite”, ficção que dirigí junto com Cecília Amado, com roteiro de Gildon Oliveira. Sem dúvida o Beleza é uma conquista de uma grande caminhada, um projeto de quatro anos e eu fico muito feliz que ele exista, pela importância que ele tem.


				
					Conheça Dayse Porto, baiana que encontrou seu lugar no cinema
Foto: Divulgação

2. Hoje em dia, como está sua relação com o cinema/audiovisual? O que você tem mais produzido no ramo?

Eu estou me preparando para dirigir um documentário que se chama “Catadoras”, com produção da Maré Produções Culturais só com personagens mulheres, e revisando o roteiro de um longa de ficção que escrevi com o mestre Orlando Senna há alguns anos. Eu gosto de coisas que tenham valor artístico e estético e que comuniquem, que atinjam um público mais amplo, e não apenas um público especializado, de nicho. Sempre, de algum modo, também estou envolvida em temáticas de gênero. É importante comunicar.

Paralelamente, faço publicidade e alguns docs para projetos culturais de empresas parceiras. A gente – eu e muitas que conheço na área – sempre está trabalhando no que já foi (entregas, prestações, distribuição, divulgação), no que é e no que será, tudo agora ao mesmo tempo. Porque a urgência da sobrevivência pede que a gente acumule muita coisa. E eu sou antes de tudo uma trabalhadora do audiovisual. Busco a inspiração, a arte, mas a maior parte do tempo é labor, compromisso, disciplina, respeito pelo trabalho de todo mundo, colaboração, sabe? Acho que esse senso é importantíssimo.

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3. Como você tem visto o cinema e o audiovisual feito por mulheres na Bahia ultimamente? Em que momento estamos?

Acho que estamos talvez no melhor momento do ponto de vista artístico e político, embora muito longe do bom em termos de reconhecimento, acesso a recursos. Fazer cinema fora do Eixo Rio-São Paulo já é um desafio enorme, e quando vamos para outros recortes como gênero e raça, a coisa ficar bem pior. Mas acho que nos últimos anos as consciências das próprias profissionais têm mudado muito e isso é a base de tudo. Além do poder sobre a narrativa, eu acho que é importante a gente discutir o técnico, que é uma barreira machista ainda muito grande. Elementos mais técnicos, como a fotografia, a maquinaria e outras funções, são especialmente associadas ao universo masculino. E eu vejo desde sempre homens, parceiros do mercado de audiovisual menosprezarem mulheres como se, primeiro, elas/nós não fossem capazes de dominar as ferramentas técnicas, e, segundo, como se esse domínio fosse o único caminho, fosse superior, sendo que a linguagem audiovisual é vasta, e há muitas formas de olhares, de contar as histórias, o que, aliás, é urgente. Tudo isso nos impacta psicologicamente. Há muitas revoluções a serem feitas e as revoluções internas, das tomadas de consciência de nosso potencial precisam ser perenes. O caminho sem dúvida é a formação do coletivo, a discussão de políticas públicas e o cenário é mais animador que nos últimos anos, apesar de tantos e tantos desafios.


				
					Conheça Dayse Porto, baiana que encontrou seu lugar no cinema
Foto: Walter Guedes

4. Cite outros trabalhos/filmes/mulheres da Bahia que te inspiram desse ramo.

Ixe, aí a lista é grande! São muitas, de formas diferentes. Eu amo o olhar de Juh Almeida, me tocam e transformam as narrativas imagéticas dela especialmente em “Irun Orí” e “ Eu, Negra” e é muita lindo, inclusive como amiga, ver o crescimento dela, desde quando começou a fotografar e a forma de se lançar no mercado sabendo o quão importante e representativo é ela estar lá, estando agora como diretora da novela “Vai Na Fé”. Cecília Amado, amiga e parceira muito generosa, que fez a beleza de “Capitães de Areia”, entre tantos outros filmes, e que está agora mesmo com uma série no Globoplay, “Da Manga Rosa”. Camila de Moraes, que não é baiana de nascimento mas é de coração, e o seu “O Caso do Homem Errado” que move estruturas. Ah, e eu adoro um curta que se chama “À Beira do Planeta, Mainha Soprou a Gente” de Bruna Barros e Bruna Castro, acho que todo mundo precisava ver porque é de uma poesia… Me inspira também trajetórias aguerridas como a de Jana Leite, que atua principalmente na publicidade, com excelência, e sempre está reivindicando e abrindo portas para outras mulheres, prezando pela qualificação, pela equidade salarial. Jamile Fortunato, Ceci Alves, Lara Belov, Clarissa Rebouças, Larissa Fulana de Tal, Solange Lima, Fabiola Aquino, Ana Júlia Ribas, Everlane Moraes. São muitas as que me inspiram com seus olhares, suas trajetórias, suas obras.


				
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