Sair ileso emocionalmente do espetáculo “Partiste” talvez seja tarefa difícil até mesmo para os corações mais frios e racionais. Se o espectador tem raízes interioranas, então, nem se fala... é aí mesmo que a arapuca está pronta e à espreita, numa de suas bem elaboradas curvas dramáticas, carregadas de empatia e humanidade.
“Partiste” nem de longe será nome em vão nesse espetáculo. É drama de ausências, saudades e partidas, mas, também, de humor, amor, romantismo e compaixão. São narrativas cruzadas num seio de reviravoltas familiares, que provoca, conforta e fisga o espectador pelo naturalismo e pela verossimilhança.
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Ambientada na década de 1970, na cidade baiana Livramento de Nossa Senhora, a peça nos brinda com a história de uma mãe, Ester, personagem interpretada por Márcia Limma, de sua irmã Ruzinha (Luzia Barbosa), e de seus filhos Brás (Ruan Passos), Ceci (Carol Alves) e Dolores (Daniele Souza).
E aqui vale destacar o equilíbrio no desempenho das atuações. Elenco afiado e afinado em cena, com um jogo cênico muito inteligente em extrair os sotaques e nuances dessa natureza cultural tão genuína e tão impregnada de brasilidade. A direção de Ícaro Bittencourt modula com destreza essas temperaturas e ambiências de cena, compondo uma encenação que muitas vezes apenas sugere os acontecimentos, recurso tanto da encenação quanto da dramaturgia.
Protagonizada por Márcia Limma, atriz indicada ao Prêmio Braskem (2018) e ao Prêmio Cenym Nacional de Teatro (2019), essa é uma trama transversal que possui um efeito de um presente que nos projeta ao passado, incorporando referências de afeto, de família e infância, que nos toca no âmago da saudade.
Uma atmosfera de nostalgia representada pelo gosto de Ceci por clássicos da literatura brasileira - escritos por Jorge Amado e José de Alencar; pela criança interior de Brás; pela paixão pelo cinema drive-in de Dolores; e pela lealdade da relação entre irmãs e entre mães e filhos, que estabelecem laços de uma época que não volta mais.
Todo esse imaginário analógico e poético é transposto para a dramaturgia de Paulo Henrique Alcântara com a propriedade de quem viveu esses sabores, memórias, saberes e imagens. O artista bebe na fonte direta de suas origens interioranas, incorporando uma identidade e um estilo muito próprios. Tudo isso é matéria-prima para a sua obra ficcional.
Autor, diretor de teatro e professor da Escola de Teatro da UFBA, o dramaturgo mergulha na tradição, com um olhar universal para as suas histórias, enredos e personagens. Ao abordar temas e discussões atemporais e atuais, tece sua narrativa no diálogo com os dramas do mundo contemporâneo.
Em sua atuação como diretor, já dirigiu grandes nomes das artes cênicas, como Nilda Spencer, Wilson Mello, Wagner Moura, Laila Garin, Vladimir Brichta, entre outros artistas. “Partiste” foi publicada em 2015 pelo Selo Literário João Ubaldo Ribeiro (Fundação Gregório de Mattos). É autor de outras peças como “Lábios que Beijei” (1998), “Bolero” (2001) e “Maldita Seja” (2023), está última também indicada ao Prêmio Braskem de Teatro deste ano.
SERVIÇO:
O quê: Espetáculo “Partiste”
Quando: dias 05, 06, 12 e 13 de outubro, quintas e sextas.
Horário: 19h
Local: Teatro Gamboa Nova - Rua Gamboa de Cima, Largo dos Aflitos, 3, Salvador - BA
Valor: R$ 40,00 (inteira) e R$ 20,00 (meia)
Informações: 71 98631-3925
Ingressos podem ser adquiridos pelo Sympla ou na bilheteria do teatro
FICHA TÉCNICA
Texto: Paulo Henrique Alcântara
Direção e produção: Ícaro Bittencourt
Elenco: Marcia Limma, Carol Alves, Daniele Souza, Luzia Barbosa e Ruan Passos
Figurino: Zuarte Júnior
Cenário: Zuarte Júnior e Ícaro Bittencourt
Iluminação: Milena Pitombo
Direção musical: Ícaro Bittencourt
Intérprete de libras: Cíntia Santos
Audiodescritor roteirista: Ícaro Bittencourt
Audiodescritor narrador: Gésner Braga
Consultor em audiodescrição: Marcos Lavor
Arlon Souza
Arlon Souza
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