Decolamos de Salvador, o cinegrafista Márcio Rosário e eu, com destino a Portugal, nossa primeira conexão rumo ao Reino de Marrocos. Oito horas depois estávamos em Lisboa, de onde partimos noutro voo, agora para Marrakech, a “Cidade Vermelha”.
Do alto, pela janelinha do avião, é possível entender o porquê daquele apelido: às portas do deserto do Saara, Marrakech ergueu um extraordinário conjunto arquitetônico em tons terrosos, e isso faz com que uma das mais conhecidas cidades marroquinas assuma um curioso aspecto avermelhado. Num calor de 40 graus, quando nem mesmo o ar condicionado do aeroporto de Menara dava vencimento, embarcamos numa van para o nosso destino final: Essaouiria.
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Antes, porém, uma ida ao Serviço de Imigração marroquino para o registro de um perrengue: uma das malas da equipe do Ilê havia sido danificada. Lavrada a ocorrência, retornamos ao nosso roteiro. De Marrakech a Essaouira são duas horas de viagem no sentido da costa atlântica. Cruzamos fazendas de laranjas e plantações de menta até nos depararmos com as seculares muralhas da cidade, cujo nome em árabe significa “lugar fortificado”.
Essaouiria, no passado conhecida como Mogador, fica encravada numa baía com belas praias, longas faixas de areia e dunas. Bem fornecida de ventos alísios, é destino certo das gaivotas do bico azul e dos praticantes de windsurf. Belezas naturais aliadas à riqueza histórica e arquitetônica deram à cidade o título de Patrimônio Mundial conferido pela Unesco em 2009.
Há 25 anos Essaouiria também é palco do Gnaoua Festival, o maior encontro de artistas e grupos musicais de África e outras partes do mundo. Gnaoua (pronuncia-se “guinuá”) é o nome que se dá às tradições antiquíssimas do povo muçulmano que envolvem cânticos, danças e rituais religiosos. Nesse contexto, o evento Gnaoua foi escolhido para abrir a turnê internacional dos 50 anos do Ilê Aiyê no Norte da África.
Turnê histórica do Ilê Aiyê
Durante quase 40 dias, doze músicos e dançarinas do Mais Belo dos Belos percorrerão dez das mais importantes cidades do mundo numa celebração às cinco décadas de existência do primeiro e maior importante bloco afro brasileiro, o responsável por abrir as portas para diversos outros grupos que viriam a surgir logo depois, e por recontar a história de África e da Diáspora sobre uma perspectiva afrocentrada, decolonial e humanizada.
A turnê internacional do Ilê é parte de um grande projeto de documentário que o departamento de Jornalismo da Rede Bahia está realizando desde o Carnaval, e que será exibido na TV durante o Novembro Negro. A missão da nossa equipe é acompanhar cada passo da banda, seus deslocamentos, suas interações e trocas culturais.
Os primeiros registros desta turnê histórica se deram durante a passagem de som na Scène Moulay Hassan, o principal palco do festival em Essaouira. Ali estiveram reunidos, ao mesmo tempo, os representantes dos povos Gnaoua, o bailarino de dança flamenca Nino de Los Reyes e o grupo costa-marfinense Compagnie Dumanlé, além do Ilê Aiyê.
No Marrocos, país que ensina ao mundo como é possível viver em paz a partir do exemplo da convivência harmoniosa entre judeus e muçulmanos, a Pérola Negra do Curuzu sobe ao palco reverenciado o seu passado, mas de olhos voltados firmemente para o futuro.
Ricardo Ishmael
Ricardo Ishmael
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