"Carlinhos Brown abre terreiro eletrônico". No dia 15 de novembro de 1996, o jornal Folha de S. Paulo saía com uma matéria em seu periódico para anunciar a inauguração do Candyall Guetho Square, espaço que se tornou CEP da Timbalada e centro cultural de uma das comunidades mais antigas de Salvador.
O bairro que abriga o Candyall tem história para contar, assim como o espaço fundado por Brown. A comunidade matriarcal, com forte herança africana foi criada após a união de Manuel Mendes e Josefa de Santana e tem seu nome originário da planta candeia, que era abundante na região.
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De acordo com a história, Josefa foi uma negra liberta da Costa do Marfim, que chegou ao Brasil em 1769, em busca dos parentes que vieram escravizados.
Segundo o site Salvador da Bahia, da prefeitura de Salvador, na época, a família formada por Josefa e Manuel comprou a 'Roça Candeal Pequeno', transformando a região em um "quilombo urbano", onde a costa-marfinense comprava e libertava negros, além de acolher fugitivos. Ao longo dos anos, o Candeal passou por transformações, mas nunca perdeu sua essência, a estreita relação com a cultura africana.
A história do Cacique com o bairro não começa a partir do Guetho. Nascido e criado no Candeal, a família do artista já contribuía para a identidade da comunidade através de Dona Madalena, mãe do cantor, que possui um restaurante há anos no local conhecido pela moqueca.
Porém, é neste contexto de manter acesa a relação com as matrizes africanas, que nasce não só o Candyall Guetho Square, como todos os outros projetos lançados por Brown dentro da comunidade, berço da Timbalada.
Com o propósito de mobilizar a comunidade a fim de superar as diversas dificuldades que atingiam o Candeal, como falta de atenção básica, baixa renda, alto índice de desemprego, em 1996, o filho do Candeal propõe a criação do espaço cultural.
O Candyall chamou atenção ainda na construção. O prédio de três andares com restaurantes, bares, camarotes, banheiros, salas para cursos e oficinas e um estúdio de som movimentou a região para além dos ensaios da Timbalada.
Para a decoração, Brown não poupou em ousadia e trouxe cores, o verde e amarelo, figuras geométricas, estátuas de leões e referências as deusas greco-romanas e a mitologia egípcia, transformando o espaço em um verdadeiro oásis.
A proposta de Carlinhos era uma só, transformar o Guetho em um dos espaços culturais mais concorridos da cidade, atraindo a população local e turistas para a famosa volta no Gueto. Para isso, os ingressos eram vendidos a R$ 10 e estudante tinha direito a meia. A ideia era converter o dinheiro da bilheteria para investir na própria comunidade, com reformas para as casas das famílias que ali viviam.
"Os Ensaios da Timbalada já foram palco de surgimento de novos artistas, gravação de disco ao vivo, inúmeros romances, lançamentos de hit se danças populares, lugar de forte convício social e de impacto sócio–econômico na comunidade do Candeal, quilombo de forte vertente empreendedora e artística de Salvador".
Site da Timbalada
O trabalho feito por Carlinhos Brown desde a fundação da Timbalada a criação do Candyall é reconhecido como uma das maiores promoções do Candeal, responsável pela geolocalização do bairro, além de reforçar a identidade da região e da capital baiana.
Pracatum
Antes mesmo da criação do Candyall, Brown já era referência de revolução no bairro com a Associação Pracatum Ação Social (APAS) surgiu em 1994, como uma organização social sem fins lucrativos.
O projeto foi fundado por Brown com a missão de contribuir para que o bairro se tornasse um lugar de vidas com qualidade, por meio de iniciativas culturais e educacionais que valorizem os saberes e demandas da comunidade.
Desde a formação da escola de música da associação Pracatum, foram mais de 2 mil músicos formados pelo projeto idealizado por Brown. O artista faz questão de reforçar que a associação vai além da música. Entre os eixos de atuação estão a educação, com cursos como instrumentos musicais, áudio, ritmos, processos fonográficos, produção cultural, audiovisual e mídias sociais.
E também desenvolvimento comunitário através do Tá Rebocado, projeto integrado de intervenção urbana.
"A gente erradicou o analfabetismo no Candeal, com cursos. Trabalhamos saneamento, habitação, encosta. Aqui é um lugar que chove e não cai, graças a Deus”, celebrou Brown em uma entrevista de 2019 quando comemorava 40 anos de carreira.
Candyall e Tal
O festival de arte urbana é conhecido por trazer uma forte programação cultural para o bairro, que reúne música, gastronomia e artesanato. Através do Candyall e Tal a comunidade pôde conferir apresentações de BaianaSystem, Saulo, Bnegão Trio, Ministereo Público, Patubatê e mais.
A programação movimenta as ruas do Candeal, e leva apresentações musicais para "pontos turísticos" do bairro, como a Escadaria do Zé Botinha, Bica e Praça das Artes.
LALATA – Festival Internacional de Percussão
O projeto idealizado por Carlinhos Brown, é considerado como a celebração da história do bairro do Candeal, e de sua população visceralmente ligada às suas matrizes africanas. Em suas duas edições, o festival trouxe para a capital baiana ícones da música instrumental nacional e internacional, colocando em evidência o Candeal e tudo que é produzido pelo local.
Em 2022 o projeto voltou a ser realizado e reuniu grandes nomes como Massamba Diop (Senegal), Bira Lourenço e Catatau (Rondônia), Trietá (Salvador), Lobo Nuñes (Uruguai), Pandeiro Repique Duo (Rio de janeiro), Marcos Suzano (Rio de Janeiro), e grupos locais como Território Sonoro e Roda de Timbau do Candeal.
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Bianca Andrade
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