O Superior Tribunal Militar ( STM ) mandou soltar os nove militares acusados de matar em abril o músico Evaldo Rosa e o catador de papel Luciano de Barros Goes . O carro onde estavam Evaldo e mais quatro familiares, entre eles uma criança, foi cravejado por 83 tiros em Guadalupe, na cidade do Rio de Janeiro. Luciano tentou ajudar a família e também foi atingido pelos disparos. Depois, os militares divulgaram a versão de que houve uma troca de tiros, que foi desmentida posteriormente Predominou o entendimento de que eles não podem ser presos agora porque ainda não houve condenação. Segundo o tribunal, o alvará de soltura pode ser expedido a qualquer momento.
Foram dez votos pela liberdade de todos e dois pela imposição de algum tipo de medida cautelar. Houve também um voto para manter apenas a prisão do tenente Ítalo da Silva Nunes Romualdo, único oficial envolvido na ação, soltando os outros. Dos 14 ministros, apenas Maria Elizabeth Rocha votou para manter a prisão de todos. O STM tem 15 ministros, mas o presidente, Marcus Vinicius Oliveira dos Santos, vota apenas em caso de empate.
Dos 15 ministros do STF, quatro são do Exército, três da Marinha (sendo um deles o atual presidente), três da Aeronáutica, e cinco civis. Dos nove militares que participaram do julgamento, oito foram favoráveis à liberdade total e um pela imposição de medidas cautelares. Dos cinco civis, dois votaram pela liberdade total, um por medidas cautelares, um pela prisão apenas do tenente, e uma pela prisão de todos.
Após o julgamento, o advogado Paulo Henrique Pinto de Mello, que defende os militares, comemorou.
— É o resultado que a defesa esperava. É a correta aplicação da lei penal. A defesa pacientemente esperou por 50 dias — afirmou o advogado.
Militares presos
Além do tenente, foram detidos pelo crime logo após prestarem depoimentos no começo de abril o sargento Fábio Henrique Souza Braz da Silva e os soldados Gabriel Christian Honorato, Matheus Santanna Claudino, Marlon Conceição da Silva, João Lucas da Costa Gonçalo, Leonardo Oliveira de Souza, Gabriel da Silva de Barros Lins e Vítor Borges de Oliveira. Em 12 de maio, a magistrada Mariana Queiroz Aquino Campos, da Justiça Militar no Rio de Janeiro, aceitou denúncia do Ministério Público Militar (MPM) contra os nove e outros três que não chegaram a ser presos, totalizando 12 réus.
O julgamento começou em 8 de maio, quando quatro ministros foram a favor da liberdade de todos os nove militares: o relator, Lúcio de Barros Góes (general do Exército), mais Francisco Joseli Parente Camelo (brigadeiro da Aeronáutica), Artur Vidigal de Oliveira (civil) e Marco Antônio Farias (general). Nesta quinta-feira, também votaram assim os ministros Luis Carlos Gomes Mattos (general), Péricles Aurélio Lima de Queiroz (civil), Carlos Vuyk de Aquino (brigadeiro), Alvaro Luiz Pinto (almirante da Marinha), William de Oliveira Barros (brigadeiro) e Carlos Augusto de Sousa (almirante).
— Só a ação penal vai dizer o que aconteceu. Estamos julgando criminosos que saíram do quartel para dar tiros? Tenho certeza absoluta de que não foi assim — disse Mattos.
Em 8 de maio, apenas a ministra Maria Elizabeth Rocha, que é civil, foi contra. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro José Barroso Filho, também civil, que foi o primeiro a votar nesta quinta-feira. Ele adotou um meio-termo, votando para manter a prisão apenas do único oficial envolvido: o tenente Ítalo da Silva Nunes Romualdo.
Em relação aos outros oito militares, todos praças, o ministro entendeu que a prisão pode ser substituída por: recolhimento domiciliar noturno das 20h às 5h até o fim da instrução, ou seja, até o fim dos interrogatórios dos réus; vedação de portarem armas durante o trabalho; e proibição de exercerem qualquer atividade externa nas ruas. Segundo ele, o tenente pode coagir os outros réus e também as testemunhas.
— Esse oficial disparou dezenas de tiros em direção ao automóvel. Recarregou e mais tiros. Recarregou e mais tiros — disse José Barroso Filho, acrescentando: — Ele pode coagir as testemunhas. Termina por aí? Não. Temos vários réus, entre eles o tenente. O tenente pode também, por usa proeminência, coagir os demais corréus.
Quanto aos demais presos, afirmou:— Eles poderiam conspurcar a prova? Que prova? A prova já foi produzida pelo órgão de acusação. A prova agora é da defesa. A partir de agora é defesa. Esses jovens, de 19, 20, 21 anos, pela sua própria condição, qual é a capacidade desses jovens, os soldados, de impactarem essa prova, impactarem negativamente, violando essa prova?
O ministro Odilson Sampaio Benzi, oriundo do Exército, votou a favor pela liberdade de todos, mas, diferentemente dos votos da sessão anterior, impôs duas medidas cautelares: proibição de participar de atividades operacionais e de portar armas.
José Côelho Ferreira, civil, foi na mesma linha, mas votou por aplicar outras medidas cautelares, além dessas. Ele propôs o recolhimento domiciliar noturno e nos períodos de folga, mas com a possibilidade de sair para frequentar cursos. Também sugeriu a proibição de manter contato com moradores da região onde houve os tiros e, no caso do tenente, a vedação de falar com os demais réus. Afirmou ainda que, em caso de descumprimento da decisão ou o surgimento de outros motivos, a prisão preventiva pode ser decretada.
— Se há um descontrole, ele não pode ter elementos para o descontrole novamente — afirmou ao justificar a proibição de usarem armas.
Nesta quinta-feira, alguns dos que já tinham votado ratificaram seus pontos de vista.
— Sabemos que são pessoas não ligadas a organizações criminosas, sem passagem pelo crime. São cidadãos comuns, mas com uma diferença. Juraram o sacrifício da própria vida para a defesa da pátria. Cumpriam missão de natureza militar e, como humanos que são, em situação adversa, estão sujeitos a cometer equívocos e até excessos. Não podemos tirar conclusões precipitadas, se condenamos ou absolvemos os envolvidos. No transcorrer da ação penal, com a garantia da ampla defesa do contraditório aos réus, é que será possível dar contorno ao caso, para ao final chegar a um juízo de valor quanto a sua culpabilidade — afirmou Francisco Joseli Parente, concluindo: — Nada leva a crer que a liberdade provisória possa trazer algum risco ao seio da sociedade.
— Não há apontamento de excesso deste ou outro militar isolado — argumentou a ministra Maria Elizabeth para manter a prisão de todos, acrescentando: — Com todo o respeito, desonraram a farda.
Segundo a denúncia do Ministério Público, os militares deram 257 tiros ao todo, incluindo aqueles disparados contra os assaltantes com os quais a família foi confundida por estarem em carros parecidos. Para o MPM, houve excessos nas duas ações, tanto contra os autores do roubo, como contra o carro da família. A ministra lembrou que o músico morto era negro, criticando a postura dos militares.
— Quando um negro pobre no subúrbio no Rio de Janeiro é confundido com um assaltante, tenho dúvidas se o mesmo ocorreria com um loiro em Ipanema vestindo camisa Hugo Boss — disse Maria Elizabeth.
— Eu jamais vou entender que uma patrulha verde-oliva atinja uma família pela cor — rebateu o ministro Odilson Sampaio Benzi.
A primeira sessão de julgamento do habeas corpus dos militares, em 8 de maio, foi marcada por críticas à imprensa e minimização do episódio. Até mesmo o subprocurador-geral do Ministério Público Militar, Roberto Coutinho, pediu a revogação da prisão preventiva. Num enfático discurso de defesa dos supostos matadores, ele afirmou que não existe ainda nem mesmo indício de que tenham cometido crime.
Para Coutinho, os relatos sobre as circunstâncias do ataque que resultou na morte do músico e do catador de papel ainda eram nebulosos.Segundo ele, aparentemente os militares estavam no exercício "da função da autoridade". Coutinho até criticou a decretação da prisão dos investigados. O subprocurador argumentou que não há risco à ordem público e que os investigados são militares, não criminosos contumazes. O subprocurador fez ainda um apelo para que a Justiça Militar não ceda a pressão pública pela punição dos supostos matadores.
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Redação iBahia
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