“Sempre leio vocês da Tribuna”, brinca o capitão Érico de Carvalho, 31 anos, ao receber um exemplar do CORREIO como cortesia do repórter que visita a sede da Companhia de Operações Especiais (COE) da Polícia Militar, em Lauro de Freitas. Era galhofa, mas com uma pontinha de ressentimento com nossa equipe, que já atribuiu ações da COE da PM ao Comando de Operações Especiais (COE) da Polícia Civil. “Pois é, às vezes o povo confunde por causa da sigla”, desculpa-se o repórter, jogando a bomba no colo de um colega.
Mas no Grupo Antibombas, uma divisão da COE (da PM, claro!), não tem essa de colocar o colega no barril – de pólvora. Na verdade, durante muito tempo, não existia nem colega no esquadrão, como explica o soldado Rubem Martins, 41, o único agente explosivista da PM entre 2004 e 2009. Toda e qualquer ocorrência que envolvesse bombas, ou suspeita de, era ele quem era destacado para resolver o problema. “Tinha, em média, dois chamados por mês. No período vago, eu cumpria as atividades rotineiras da COE, estudava, fazia exercícios físicos”, lembra o veterano, com cursos de manuseio de explosivos em São Paulo, Paraná e até no Peru. Colegas Mas a maré mansa acabou, paradoxalmente, quando começaram a chegar outros “caveiras” (policiais de operações de alto risco) para dividir as tarefas na neutralização de artefatos explosivos. Só para se ter uma ideia, no comparativo entre os primeiros 11 meses de 2013 com o mesmo período de 2014, as ocorrências que necessitaram da ação do grupo triplicaram.
Enquanto no ano retrasado foram apenas 11, em 2014 foram 33. Não há dados anteriores sobre ocorrências, afinal, o Grupo Antibombas só se organizou plenamente no final de 2012. A explicação para o aumento dos chamados? O crescimento dos ataques com explosivos a agências bancárias. O número saltou de 104, em todo o ano de 2013, para 177 – um acréscimo de 70% – no ano passado. Para o presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, Augusto Vasconcelos, tanto o poder público quanto as entidades privadas têm parcela importante de culpa no aumento dos índices. “Falta investimento das empresas e do governo para melhorar a segurança nas agências. É preciso, também, atuar de maneira convergente, o que não ocorre”, comenta. Ainda segundo o sindicalista, do montante investido pelos bancos em segurança (5% do orçamento), 90% ficam só para cuidar de internet banking. “É preciso investir mais em câmeras de segurança, colocar cabines blindadas”, exemplifica. Em ação Segundo o capitão Érico, “cerca de noventa por cento dos ataques com bomba na Bahia, hoje, são contra bancos e caixas eletrônicos”. E olha que a turma só é convocada, normalmente, quando alguma coisa dá errado na ação criminosa, como ocorreu em Terra Nova, no Recôncavo, em outubro. Na ocasião, um bando explodiu terminais em uma agência do Banco do Brasil, porém, um dos cartuchos de emulsão em gel (similar a uma dinamite) ficou para trás, sem ser deflagrado. Mal amanheceu (ficam sempre dois agentes de plantão), e o coronel Paulo Faustino da Silva, chefe do Comando de Policiamento Especializado (CPE), soube da situação e enviou a turma ao local. Lá chegando, após uma análise da situação, foi iniciada a operação para neutralizar o artefato. Uma residência foi transformada em base operacional, onde o raio-X de tempo real, o canhão disruptor e o braço mecânico foram montados. O traje antifragmentação (similar a uma armadura) foi vestido pelo capitão Érico, que pôs em prática mais uma vez os conhecimentos adquiridos principalmente na graduação técnica da Colômbia, uma das três melhores do mundo. “Isolamos a área, fizemos a aproximação e neutralizamos com o canhão disruptor”.
RefémEm Terra Nova, o caso envolveu risco, ainda que muito baixo, apenas ao explosivista. Mas e quando a situação envolve refém e, pior, os recursos não são tão sofisticados assim? Em 2011, munido apenas de colete à prova de balas, escudo e capacete, Rubem Martins foi chamado para desarmar uma bomba presa ao corpo do gerente de um banco, em Caetité, no Sudoeste. A primeira medida do assaltante: explodir artefato semelhante na frente do refém, usando um celular, para mostrar que o negócio era sério. A primeira atitude de Martins, ao tomar ciência do cenário, foi levar a vítima a um local onde não havia sinal de celular. Lá, em distância regulamentar, uma plateia observava a ação de desarme, incluindo a mulher e dois filhos do bancário. A situação colocava dois homens de família em iguais condições diante do perigo - Martins também é casado e pai de duas crianças. Mas deu tudo certo no final: o “caveira” neutralizou o artefato, ao cortar a fonte de alimentação, e garantiu o leite das crianças. “Ele perguntou se eu já tinha feito aquilo e eu disse que sim. Tive que mentir, para acalmá-lo. Se acontecesse algo errado, morreriam ele e eu”, relembrou. Há também histórias que parecem mentira, mas não são, como aquela em que no lugar de uma bomba havia um bozó. “Foi no ano passado, no Itaigara. Fechamos a avenida por mais de uma hora, passamos o raio-X na caixa e descobrimos que não passava de uma macumba”, recordou Martins, aos risos. Segundo ele, nunca ocorreu qualquer incidente grave com a equipe ou com reféns. “E nunca vai acontecer. Vou me aposentar e ir pescar em Coité”, afirma. Oxalá seja verdade! Só não pode é inventar de pescar com bomba, né? Grupo também orienta a tropa sobre procedimentosO capitão Érico de Carvalho explica que antes da consolidação do Grupo Antibombas, a política de prevenção de acidentes, especialmente com policiais da linha de frente, era quase inexistente. “O pessoal pegava o explosivo com a mão mesmo, levava pra casa, sem ter a noção do perigo que corriam”, conta. Agora, atuando de forma preventiva, o esquadrão realiza instruções, palestras e orientações técnicas tanto para o público interno da PM quanto externo. Recentemente, o grupo capacitou 109 policiais de unidades especializadas da Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal, Casa Militar e Departamento de Polícia Técnica, no curso de Primeiras Respostas em Ocorrências com Bombas e Explosivos. O objetivo da instrução foi difundir procedimentos que evitem Acidentes, com orientação sobre o reconhecimento e devido encaminhamento dos artefatos de forma segura. Segundo o capitão, uma cartilha foi elaborada pelo Grupo Antibombas e já está sendo distribuída. “Agora, quando há ocorrências com bombas, em que o artefato ainda não foi deflagrado, nós somos chamados para resolver o problema”, conta. Carvalho lembra que durante a graduação técnica, na Colômbia (país que é referência em lidar com ataques e atentados com explosivos), os exemplos que ele levava do Brasil eram vistos como surreais. “Levava fotos de apreensões da polícia em que bombas eram colocadas próximas do detonador e a turma não acreditava”, exemplifica.
Quatro dos nove ‘caveiras’ do Grupo Antibombas da PM. Da esquerda para a direita: o capitão Érico de Carvalho; subcomandante Jandir de Jesus; soldados Rubem Martins e Ronaldo Carvalho |
O veterano Rubem Martins usa joystick para guiar um robô equipado com câmera. Ferramenta pode levar material suspeito para local mais afastado e detonar o dispositivo |
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