Três homens foram presos por envolvimento na morte da líder quilombola e ialorixá Mãe Bernadete. A informação foi confirmada durante coletiva de imprensa da Polícia Civil, nesta segunda-feira (4), para apresentar os avanços na investigação. No dia 31 de agosto, a polícia já tinha informado que os suspeitos de cometer o crime tinham sido identificados.
Durante a coletiva, o Secretário de Segurança Pública do estado, Marcelo Werner, afirmou que os presos tem diferentes participações no crime: (1)Preso suspeito de ser um dos executores do crime; (2) preso por guardar as armas do crime e preso por porte ilegal de arma de fogo; e (3) preso pela receptação dos celulares da líder quilombola e de familiares, roubados durante o homicídio.
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Um dos envolvidos no crime teve o mandado de prisão cumprido na sexta-feira (1°) por equipes do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), na cidade de Araçás, a 105 km de Salvador.
“Ele relata que foi um dos executores e todas as provas o colocam na cena do homicídio. O seu depoimento é indispensável para esclarecer a dinâmica do fato e o modus operandi dos autores”, delegada-geral da Polícia Civil, Heloísa Brito.
Outros dois suspeitos foram presos em Simões Filho, município onde aconteceu o crime. Um dos homens presos foi um mecânico, que guardava as possíveis armas do crime. Durante uma operação, ainda na sexta, foram encontrados com ele duas pistolas com munições e três carregadores, dois deles estendidos. O armamento estava em uma oficina na comunidade de Pitanga de Palmares, na zona rural de Simões Filho, a mesma região onde fica o quilombo onde Mãe Bernadete foi assassinada.
O mecânico que guardava as armas foi autuado em flagrante por porte ilegal de arma de fogo. Ainda segundo a SSP, as duas armas apreendidas são compatíveis com os projéteis recolhidos no local do crime.
Um terceiro envolvido no crime foi preso no dia 25 de agosto. De acordo com a SSP-BA, ele é suspeito pela receptação dos celulares da líder quilombola e dos familiares que foram feitos de reféns, roubados no dia do crime.
Ainda segundo as investigações, foi identificado que os envolvidos são integrantes de um grupo criminoso responsável pelo tráfico de drogas e também homicídios naquela região.
A Secretaria de Segurança da Bahia informou que foram coletados mais de 60 depoimentos de familiares, testemunhas e outras pessoas. Ações em campo, alinhadas com atividades de inteligência policial, e uso de recursos tecnológicos também foram utilizados na investigação. Todo o material encontrado na cena do crime é periciado pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT).
Sobre a motivação do crime, o secretário Marcelo Werner afirmou que a polícia segue com algumas linhas de investigação e afirmou que outros envolvidos ainda estão sendo procurados.
"Em relação a motivação, nós temos ainda algumas linhas de investigação em andamento. Se a gente antecipar qualquer uma dessas linhas, vai ser prejudicial a investigação. A gente segue a investigação porque ainda existem outras medidas cautelares", disse Marcelo Werner.
As investigações contaram com uma força-tarefa das polícias Federal e Civil. Em nota divulgada à imprensa, a Polícia Civil destacou que o Ministério Público, por meio do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO), e o Poder Judiciário da Bahia também tiveram atuação determinante no caso.
Relembre crime
Mãe Bernadete foi assassinada no dia 17de agosto. A ialorixá e líder do Quilombo Pitanga dos Palmares foi atacada a tiros onde morava na comunidade, em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador.
Na noite em que os homens invadiram o loca, Mãe Bernadete estava acompanhada de Wellington Gabriel de Jesus dos Santos, de 22 anos, que estava com ela na noite do crime. Além dele, estavam com a ialorixá dois adolescentes de 13 e 12 anos.
Depois de cometerem o crime, o suspeitos levaram os celulares da líder quilombola e dos reféns. Wellington entrou em contato com outras pessoas que vivem no quilombo por meio de um aplicativo de mensagens que estava aberto no computador.
Depois disso, ele deixou os familiares com um vizinho e foi até o terreiro de candomblé, que fica dentro do Quilombo Pitanga dos Palmares. Lá, ele ligou para a polícia.
A Polícia Civil informou, em coletiva no dia 18 do mesmo mês, que as armas utilizadas no crime foram de uso restrito. Investigações preliminares indicam que Mãe Bernadete foi morta com tiros de calibre 9mm.
"A perícia localizou vários vestígios de calibre 9mm. Por essa ser uma arma de uso restrito, ela é usada por indivíduo de índole mais violenta, que tem coragem para cometer o crime, o que requer uma atenção maior da investigação", disse a delegada Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Depoimentos
Wellington Gabriel de Jesus dos Santos contou que a ialorixá pensou que estava sendo assaltada quando os criminosos que a mataram invadiram a casa onde ela morava com a família.
"É assalto?", perguntou Mãe Bernadete quando os dois homens armados, usando capacetes de motociclista, a renderam.
Ainda segundo Wellington, os homens pegaram o celular da avó e a mandaram desbloquear o aparelho. Eles também roubaram os celulares dos dois adolescentes e exigiram que eles fossem para um dos quartos da casa.
Depois disso, um dos homens foi até o quarto onde Wellington estava e o mandou deitar no chão, usando uma expressão homofóbica. "Deite no chão, seu viado", exigiu. Ao sair do cômodo, o homem fechou a porta.
Em seguida, o jovem ouviu diversos disparos. Quando ele saiu do quarto, encontrou a avó morta no chão da sala, já morta.
O conteúdo do depoimento foi obtido com exclusividade pelo Jornal Hoje. Ainda segundo o relato do neto da ialorixá, os criminosos tinham entre 20 e 25 anos, eram negros e usavam roupas pretas, capas de chuva e capacetes. Eles entraram e saíram do quilombo usando uma motocicleta.
Wellington disse também que não existe conflito agrário envolvendo o quilombo e que não se recorda de inimizades ou ameaças recebidas pela avó. No entanto, ele mencionou que Mãe Bernadete tinha muitos medos. Especialmente após o assassinato do filho dela, que também é pai de Wellington, o "Binho do Quilombo".
O jovem ainda relatou à polícia que Mãe Bernadete "pegava no pé" de um policial militar da reserva que mora perto do quilombo. Os dois teriam muitos desentendimentos.
Pedidos de proteção
No dia 30 de agosto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informou que o assassinato da líder quilombola Mãe Bernadete, e do filho dela "Binho do Quilombo", morto em 2017, serão acompanhados pelo Observatório das Causas de Grande Repercussão. O colegiado é formado pela entidade e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Ainda na quarta-feira, o advogado David Mendez, que representa a família de Mãe Bernadete, pediu para ser beneficiados no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), do governo federal. Ele afirma ter sido perseguido quando voltava da sede do quilombo onde Mãe Bernadete foi morta.
Mãe Bernadete também fazia parte de programa de proteção da polícia, segundo informações da família dela. A família da ialorixá deixou a comunidade quilombola após o crime, por medo, e está sob proteção da Polícia Militar.
Redação iBahia
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