A idosa que viralizou nas redes sociais após relatar o racismo que sofreu por vários anos em situação análoga à escravidão compartilhou com a TV Bahia, nesta sexta-feira (29), uma carta dos ex-patrões dela. No documento, o casal acusa a filha de praticar golpes contra a própria mãe e contra a quem eles chamam de "mãe preta", fazendo referência a funcionária.
A empregada doméstica Madalena Santiago da Silva tem 62 anos e viveu 54 deles na casa dessa família, na cidade de Lauro de Freitas, na região metropolitana de Salvador. Ela foi resgatada em março do ano passado, em uma ação do Ministério Público do Trabalho (MPT).
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Ao longo do tempo que vivia com os antigos patrões, ela conta que não recebia salário, era maltratada, sofria racismo e ainda foi vítima de um golpe da filha dos donos do imóvel, que fez empréstimos no nome dela e ficou com R$ 20 mil da aposentadoria da doméstica.
O crime é relatado logo o início da carta, que parece ter a intenção de sensibilizar a filha dos ex-patrões de Madalena. O documento foi assinado pelos pais da mulher e pela idosa em 2018 e traz mais detalhes da situação.
"Sem qualquer sentimento de sensibilidade, ao contrário com o objetivo de atingir a Todos você subtraiu todas as cadernetas de poupança de sua mãe e de Madalena. Esta, foi como os meus antepassados diziam, era e sempre foi a chamada 'mãe preta' que lhe embalou no colo assim como vem fazendo com a sua filha. Serviu até hoje como uma 'escrava' fazendo todas as suas vontades", diz um trecho do documento.
Em seguida, a carta continua: "Queria bem como se fosse a sua própria mãe. Então qual o agradecimento e gratidão: retirou toda a sua pequena poupança, produto de uma aposentadoria de 35 anos de trabalho. Não satisfeita no seu instinto perverso, ainda teve a crueldade de consignar empréstimos na aposentadoria que variam de 48,60 e 70 meses. Doloroso!. O choro de dor e desespero da inocente Madalena ao tomar conhecimento do fato, por certo está entregue à misericórdia Divina. O preço dessa covardia será resgatado, ainda nesta vida".
Segundo apuração da TV Bahia, o ex-patrão de Madalena morreu em 2020. Atualmente, os únicos vivos são a esposa dele e a filha do casal.
Para ressarcir a idosa, o MPT divulgou que a Justiça do Trabalho bloqueou bens da família no valor de R$ 1 milhão. O dinheiro deve ser usado no pagamento de verbas rescisórias e dos danos morais.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), o pedido, acatado pela juíza Vivianne Tanure Mateus, titular da 2ª vara do Trabalho de Salvador foi feito pela procuradora Lys Sobral, coordenadora nacional de combate ao trabalho escravo do órgão.
A juíza também determinou o pagamento de um salário mínimo até o julgamento da ação principal e o bloqueio dos bens.
A equipe de reportagem entrou em contato com o advogado da ex-patroa de Madalena, que disse ela só vai se pronunciar no processo administrativo e em caso de um possível processo judicial, porque é idosa e nunca respondeu a nenhum processo criminal.
Já a filha dela, identificada como Cristiane Seixas Leal, não atendeu às ligações.
Agressões
Em uma das agressões, Madalena conta que a mulher chegou a ameaçar jogar água no rosto dela e a tratou como “negra desgraçada”.
“Eu estava sentada na sala, ela passou assim com uma bacia com água e disse que ia jogar na minha cara. Aí eu disse: ‘Você pode jogar, mas não vai ficar por isso’. Aí ela disse: ‘Sua negra desgraçada, vai embora agora’, contou. “Era um sábado, 21h, chovendo e eu não sabia para onde ir”, completou.
Atualmente, Madalena da Silva vive com familiares e recebe seguro desemprego e um salário mínimo de ação cautelar movida pelo MPT contra os antigos patrões. Mas, apesar da reparação financeira, a idosa convive com os traumas.
Repercussão
A história de Madalena sensibilizou internautas de todo o país, na quinta-feira (28), depois que uma reportagem feita pela TV Bahia viralizou na internet.
Durante a entrevista, a idosa chorou ao segurar a mão da repórter Adriana Oliveira, que é branca, e disse que tinha receio de tocá-la por causa do que a cor da jornalista a remetia. “Fico com receio de pegar na sua mão branca”, contou. Assista ao vídeo abaixo
A repórter questionou a frase forte dita pela doméstica e estendeu as mãos para ela, questionando: “Mas por quê? Tem medo de quê?”.
Madalena, então, falou: “Porque ver a sua mão branca. Eu pego e boto a minha em cima da sua e acho feio isso”.
O trecho da reportagem foi compartilhado pela repórter e outros jornalistas e por páginas nas redes sociais. Emocionados e chocados com a situação, internautas comentaram a história.
“Quantos traumas esta mulher sofreu e sofre. Que tristeza”, escreveu um internauta. “E tem quem diga que racismo não existe, que já passou…”, comentou outra. “Que dor ver isso”, completou uma outra mulher.
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Redação iBahia
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