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Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'

Michele Bezerra Pinheiro descobriu a deficiência na fase inicial, após alerta de colegas de trabalho. Com o tempo, o nível aumentou e os aparelhos auditivos se tornaram indispensáveis

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Alan Oliveira

26/09/2022 às 6:00 • Atualizada em 26/09/2022 às 9:49 - há XX semanas
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					Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'
Foto: Arquivo Pessoal

Michele Bezerra Pinheiro tinha apenas 23 anos quando alguns colegas passaram a observar que ela não ouvia bem no ambiente de trabalho. Na época, a baiana atuava com atendimento de telemarketing e não suspeitava que poderia um dia ter a vida mudada pela deficiência.

"Eles ficaram durante uma semana fazendo esse tipo de teste e sem me avisar. E aí, quando completou uma semana, eles me chamaram e falaram que tinham momentos que eles me chamavam e realmente eu não ouvia. Foi difícil aceitar. De início, é um baque".

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Foi em uma consulta e após alguns testes que Michele soube que só tinha cerca de 15% da audição no ouvido direito. Para ela foi um susto, e foi aí que o medo do preconceito começou a mexer com sua autoestima. "No início foi difícil. Chorei. Fiquei um pouco apreensiva para usar o aparelho. Tinha medo, de fato, do preconceito", conta.

Passados alguns meses, Michele teve mais uma surpresa: o ouvido esquerdo também passou a ter restrições. Esse, no entanto, tinha cerca de 75% da audição. Foi aí que a baiana passou a usar dois aparelhos auditivos e um alerta se acendeu para o risco da perda de audição aumentar.

"Eu comecei a sentir uma dificuldade também no ouvido esquerdo. Eu falei: 'Não é possível'. E aí voltei para médica, repetimos os exames e ela falou: 'Você está perdendo audição no ouvido esquerdo'".

Da descoberta até esta segunda-feira (27), Dia Nacional do Surdo, já se passaram cerca de 7 anos, e, até então, Michele ainda não sabe o que provocou a perda da audição.

"Fizemos vários exames para a gente saber de onde é essa perda auditiva, de onde está vindo, porque minha perda é gradativa. E aí a gente não conseguiu descobrir o real motivo", lembra.


				
					Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'
Foto: Arquivo Pessoal

A baiana conta que chegou a reunir familiares para questionar se havia algum histórico, mas ela era a primeira de que se tinha conhecimento a ser diagnosticada precocemente na família.

"Pedi por favor para saber se alguém teve algum problema, se eu tive algum problema quando eu era criança, e foi dito que não. O problema que tinha foi do meu bisavô, mas pela idade".

E dessa união familiar saiu também o apoio que a baiana precisou para superar o preconceito e lidar com as travas que a impediam de usar os aparelhos auditivos corretamente.

"Foi um momento bem difícil, mas minha família, meus amigos, sempre me incentivando", conto e seguiu destacando. "Depois que eu comecei a usar aparelho, começou a parecer um imã. Comecei a ver pessoas na rua também usando aparelho. Aí eu vou me aceitando mais. O preconceito acabo deixando um pouquinho de lado, porque realmente a gente tem que se sentir bem".

Atualmente, Michele consegue lidar melhor com a deficiência e já criou seus hábitos de segurança, mas ainda passa por situações complicadas no dia a dia. Uma das mais marcantes para ela foi quando quase se acidentou no metrô, por não ouvir o alerta de fechamento da porta do vagão. Quem a salvou foi uma amiga.

"Ela passou na frente para sair do metrô e eu passei atrás. No que eu passei atrás, a luzinha piscou, dizendo que a porta do metrô estava fechando. Eu não vi e nem ouvi. Eu simplesmente fui. Ela me deu um empurrão (a amiga). Porque ela ia fechar e eu não vi. Eu faleu: 'Meu Deus, que susto".

A baiana também ressaltou as complicações em se comunicar durante a pandemia, principalmente no período mais crítico, quando o uso de máscaras se tornou obrigatório - impedindo a leitura labial que a ajuda a entender o que o outro fala.

"Me quebrou real, porque eu fazia muita leitura labial. Podia não estar ouvindo você, mas eu lia muito. Eu fazia muita leitura quando eu estava conversando com os colegas, amigos e familiares. Eu não olhava para os olhos, eu olhava para boca, então a gente conversava fazendo muita leitura labial. Foi muito difícil eu me adaptar".


				
					Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'
Foto: Arquivo Pessoal

A adaptação foi feita também no trabalho. De uma função em que o fluxo de comunicação era muito grande, a baiana passou a atuar em uma atividade administrativa. A mudança aconteceu depois que Michele entendeu que tinha algumas limitações e direitos. Nos últimos anos, ela tem desempenhado a função de auxiliar administrativa no laboratório Sabin.

"Na empresa anterior que eu trabalhava, eles informaram que não era considerado PCD (pessoa com deficiência). Continuei lá e aí quando foi em 2021 eu fui demitida. E aí continuei colocando meu currículo como vaga normal. E aí a médica conversou comigo e falou que era para eu começar a colocar para vagas de PCD", explicou.

Para além das dificuldades pela pouca audição, Michele conta que já passou também por muitas situação desagradáveis provocadas pelo preconceito.

"Algumas pessoas acham que é brincadeira, mas não estou ouvindo. E aí dizem: 'Você é surda?'. Aí eu respondo: 'Eu sou. Realmente eu sou'.

A maioria delas pelo equívoco de que todas as pessoas surdas também são mudas ou possuem algum tipo de dificuldade na fala.

"Já aconteceu de ficarem me olhando estranho. 'É o que que essa menina quer com esse negócio aí?". Porque me vê conversando normal, acha que eu não tenho problema auditivo. E eu tenho".

Aos 30 anos, Michele se divide entre os cuidados com o filho de 5 anos, o trabalho e um curso de Recursos Humanos que tem se empenhado para concluir.

"Não é para a gente não se sentir cota ou deficiente, e sim que a gente é eficiente naquilo que a gente faz. Eficiente naquilo que é proposto para gente e que a gente entrega. Porque eu me considero uma pessoa normal. Entrego, sou dedicada e focada naquilo que é solicitado para mim. E é se entregar e ser forte e não ouvir mesmo as piadinhas e preconceitos que existe por aí. A gente tem que focar na gente e procurar nossa melhora. Eu estou fazendo minha faculdade. Eu estou me empenhando no trabalho, porque é crescer, olhar para frente e não olhar para trás".

Surdez


				
					Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'
Foto: Divulgação/Widex

De acordo com especialistas, os termos surdez ou deficiência auditiva podem ser usados tanto para classificar a perda completa quanto a diminuição de audição.

Como são vários os níveis da deficiência, ela pode impedir ou somente dificultar a percepção dos sons pelas pessoas diagnosticadas.

Além disso, uma pessoa pode nascer surda ou se tornar ao longo da vida, a depender do que acontecer, como é o caso de Michele.

Entre os fatores que podem provocar a perda da audição ao longo da vida estão:

  • Infecções bacterianas
  • Infecções por vírus
  • Exposição a barulhos intensos
  • Uso de medicamentos tóxicos ao ouvido
  • Presbiacusia - envelhecimento da audição em idosos

Em caso de dificuldades, o recomendado é procurar atendimento com um médico fonoaudiólogo.

Atendimento na Bahia


				
					Baiana recorda susto e adaptação após perder quase toda audição aos 23 anos: 'Tinha medo do preconceito'
Foto: Reprodução/Instagram

De acordo com informações passadas ao iBahia pela Secretaria da Saúde da Bahia (Sesab), não há um levantamento da rede pública sobre o número de pessoas diagnosticadas com surdez no estado.

No entanto, segundo o último senso do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, somente em Salvador eram mais de 130 mil pessoas vivendo com algum grau de surdez.

E é na capital baiana que os pacientes podem encontrar atendimento pela rede estadual, no Centro de Prevenção e Reabilitação da Pessoa com Deficiência (Cepred), que fica localizado no Parque Bela Vista.

Segundo a Sesab, a unidade atende cerca de 400 pessoas por mês, oferecendo serviço especializado em reabilitação de pessoas com deficiência auditiva, diagnóstico audiológico, seleção, indicação e concessão de Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI), além de acompanhamento pós-protetização.

Foi no Cepred que Michele conseguiu os aparelhos auditivos que usa. Mas eles também podem ser adquiridos de forma própria, por preços que variam de acordo com o equipamento.

Os aparelhos usados pela baiana, assim como qualquer outro aparelho auditivo, foram desenvolvidos especialmente para as necessidades dela, após vários testes. Para garantir o bom funcionamento deles, são feitas manutenções regulares.

Os aparelhos auditivos são energizados com pilhas específicas, que também pode ser adquiridos tanto de forma particular quanto pelo Sistema Único de Saúde (SUS).


				
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Foto: Arquivo Pessoal

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