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ANIVERSÁRIO DE SALVADOR

Carta aberta a Salvador - 473 anos

Jornalista e ativista cultural Ricardo Duarte escreve sobre experiências e amor à cidade no especial de reportagens do iBahia em homenagem ao aniversário da capital baiana

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Redação iBahia

29/03/2022 às 8:30 • Atualizada em 27/08/2022 às 3:59 - há XX semanas
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Querida Salvador,

Deviam ser umas quatro da tarde, não consigo precisar, lembro-me que o sol já tinha feito parte do percurso descendente, antes de se aninhar por trás da linha do horizonte, e tu jogaste um dos teus maiores trunfos: a incrível Baía de Todos-os-Santos perfeitamente desenhada, azul, gigante, majestosa, estava ali, literalmente debaixo do nariz daquele avião que me tinha transportado até casa, sem eu ter dado conta.

Quem tinha razão era o Anthony Bourdain, quando disse que na Bahia estamos “no coração do coração do Brasil”. Tu és o sangue que pulsa, o batimento acelerado, qual tambor que ecoa em cada esquina, um calor constante, de paixão, cidade viva, de gente apaixonada e apaixonante, generosa.

Até saber que nesse dia de junho de 2014 viria até ti pela primeira vez, sabia muito pouco ou quase nada da tua História, Cultura ou Sociedade. Uma educação absolutamente “eurocentrada”, onde a história do Brasil é contada quase exclusivamente do ponto de vista do colonizador, nunca aguçou a curiosidade sobre a primeira capital do Brasil.

Acarajé, quilombo, dendê, umbu ou candomblé eram palavras que eu desconhecia, quanto mais o seu significado. E ainda há tanto que podem fazer por ti em relação a isso, minha querida...

Desde aquele dia em que te vi pela primeira vez que não mais parei de te revisitar, até que, há três anos, decidi que já chegava, eras casa, não hotel. E que boa decisão. Nesta nova vida já conheci algumas das pessoas mais incríveis destes quase 40 anos, já experimentei frutas, comidas e bebidas que nem sabia existirem, vi pores do sol que pareciam impossíveis.

Aprendi tanto sobre a história de Portugal ao descobrir a tua. Consegui compreender melhor o que foi o período da escravatura e todos os séculos que lhe seguiram, entender que és a cidade mais negra do Mundo fora de África, que pelo menos um milhão e meio de pessoas escravizadas pisaram esta terra e que isso tem consequências até hoje, permitiu-me conhecer melhor o país onde nasci. Não é possível entender Portugal sem conhecer a Bahia e Salvador em particular.

Sabes, o Bourdain disse ao Bel Borba, sentado na Feira de São Joaquim, que “Salvador é um lugar ao qual as pessoas deveriam vir, mesmo que tenham medo de viajar, é uma questão de viver a vida, não há muitos lugares no Mundo que consigam chegar perto do que é Salvador.”

É isso, querida Salvador, contigo trata-se de Viver, assim mesmo, com V maiúsculo, no sentido de experimentar, de sentir o inédito. É ir ao Porto da Barra, comer um queijo coalho e beber uma caipirinha de seriguela. É ver o por do sol no Museu de Arte Moderna (de preferência seguido de um Jazz no MAM), ou no Santo Antônio. É ir na terça-feira à Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. É fazer a Avenida Suburbana e ver aquele mar da cor do céu.

É ir à Casa do Rio Vermelho ler as cartas que o Jorge Amado trocava com os amigos e ver o sapo que Jorge roubou da casa de Carybé. É ir dar um mergulho no Buracão e sair à noite no Rio Vermelho, começando pela Fonte do Boi. É sair de saveiro da Feira de São Joaquim, velejar até a Ilha de Maré e voltar ao por do sol. É passar pelas inúmeras obras incríveis do Bel Borba e sorrir ao lembrar a gargalhada única dele.

É ir ao Santo Antônio ao “Bailinho de Quinta”. É comer acarajé seja na praça ou na praia. É no dia 2 de fevereiro ir ao Rio Vermelho e na segunda quinta-feira do ano ao Bonfim. É ir ao Gantois no Presente de Oxum. É ir à igreja de São Francisco, no Pelourinho. É ir à Casa do Carnaval e ao novo Museu Cidade da Música da Bahia. É... Viver.

No Viver que aqui te falo, neste meu viver, há muitos lugares, belezas naturais, monumentos, mas há ainda mais pessoas. Serão elas a tua maior riqueza. A bonomia, a simpatia, a alegria, o sorriso, a generosidade do teu povo não têm paralelo. Só quem nunca foi chamado de “meu amor” ou “meu querido” numa loja ou café, quem nunca virou confidente por minutos da senhora ao lado no metrô ou nunca experimentou um abraço de um soteropolitano não entenderá isto que escrevo.

Minha querida Salvador, todas as palavras que escrever serão sempre insuficientes para explicar o que significa viver-te. O melhor mesmo é experimentar.

Parabéns.

Ricardo Duarte, jornalista e ativista cultural

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